Manuel Carvalho da Silva | Jornal
de Notícias | opinião
Foi definido, em 2010, no quadro
da Comissão Europeia, que os países membros da União Europeia (UE)
conseguissem, em 2020, ter empregada 75% da população com idade compreendida
entre os 20 e os 64 anos. Portugal estará agora, segundo várias fontes, próximo
de 73,5 %. Relembro também que Portugal já teve, em 2007 e 2008, uma população
ativa que ultrapassou os 5,5 milhões de cidadãos, o que era considerado um
fator positivo. Faço estes registos para colocar várias interrogações e, a
partir daí, enunciar algumas questões que me parecem pertinentes.
O país pode atingir aquela meta
estabelecida para 2020? Uma taxa de atividade elevada é sempre um sinal
consistente de desenvolvimento? Que relação se tem vindo a revelar entre a
evolução da população residente e da população ativa? E uma e outra estão a
renovar-se de forma equilibrada em termos de escalões etários, ou há fortes
desequilíbrios e quais os seus significados? Onde e como estão os escalões da
população mais jovem? Será que poderemos voltar a ter 5,5 milhões de ativos? O
aumento do emprego nos últimos anos de que forma influenciou o aumento da
população ativa e da taxa de atividade? Que influência têm as políticas
salariais e de condições de trabalho na evolução da população ativa, da
população residente e no comportamento nada uniforme da taxa de atividade
quando analisada por grupos etários?
Parece-me perfeitamente possível
o nosso país chegar à meta de taxa de atividade colocada pela UE para 2020, mas
podemos ter uma taxa de atividade elevada escondendo problemas complexos que
bloqueiam o nosso desenvolvimento, desde logo uma população mais envelhecida e
bem menor.
Observemos alguns factos com que
Portugal se depara. Primeiro, a taxa de atividade dos jovens (dos 20 aos 24
anos) é muito baixa e, apesar da retoma económica e recuperação de emprego
iniciadas a partir do final de 2013 e acentuadas a partir de 2015, aquela taxa
para o grupo etário em causa apenas se situava em 58,5% em 2017. Isto mostra
que é preciso criar muito mais emprego e desenvolver práticas de recrutamento
nos setores privado e público sem barreiras à entrada dos jovens.
Segundo, este panorama é ainda
pior para as mulheres, pois em todos os escalões etários as mulheres têm
menores taxas de atividade, em particular por terem sido muito penalizadas no
período mais negro das políticas austeritárias.
Terceiro, os escalões etários dos
25 aos 54 anos revelam, para ambos os sexos, valores muito positivos e o
escalão entre os 55 e 64 anos, ao contrário do que seria de esperar, tem vindo
a assumir valores progressivamente mais elevados, contudo exigem-se análises
mais finas sobre estes comportamentos.
Quarto, os valores e
considerações que apresento nos três tópicos anteriores estão muito longe de
contar a totalidade da "história" da taxa de atividade em Portugal. Há vários
problemas conexos e de difícil resolução com que temos de lidar e os números
referidos não os revelam, nem são sequer os indicadores mais adequados para
retratar o que se passa com o emprego e com a evolução demográfica: i) a
população residente perdida entre 2011 e 2017 é de dimensão apenas ligeiramente
superior à população ativa que desapareceu no mesmo período, sendo jovens uma
parte grande dessas diminuições, o que significa envelhecimento acelerado da
sociedade e que, provavelmente, já não recuperaremos os níveis elevados de
população ativa que já tivemos; ii) a dimensão da população ativa está a ser
negativamente influenciada pelos fluxos migratórios - emigração que diminuiu
nos três últimos anos mas não estancou, e reduzida entrada de imigrantes - e a
persistência de baixos salários e fracas condições de vida não inverterá nenhum
dos dois movimentos.
Um simples enunciado de
interrogações faz saltar à vista desarmada vários alçapões, mas estudos que se
debrucem seriamente na construção de explicações fundamentadas farão saltar
muitos mais. Trata-se de um exercício fundamental quando nos aproximamos de um
longo período eleitoral propício à discussão das políticas a seguir, quer a
nível europeu, quer nacional. É tempo de cortar raízes à demagogia.
* Investigador e professor
universitário
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