quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

XAROPES DE REVOLTA, PRECISAM-SE!


Bom dia. O natal passou. Foi um feliz natal? Terá sido para os que ignoraram a fome, a miséria, as guerras, as desigualdades, as injustiças, a gula de uns quantos que se apoderam do que pertence a milhões de outros e etc. que grassa por este planeta a que chamam Terra e que primeiro era plano por ignorância e imposição da Igreja Católica Apostólica Romana Retrógrada Inquisitória e Assassina. Adiante, que recordar estas faldas de mentes criminosas causa maus odores e muita repulsa.

António Costa é logo aqui em baixo, no Curto, o bombo da festa. O desgaste deste PM a cheirar um pouquinho a esquerda já está em marcha há tempos lá pelo burgo do tio Balsemão, os paxás do dito tio cumprem a função em troca dos ordenadinhos e mais umas regaliasitas ao estilo de “broas” salazaristas que eram só para uns quantos que se “portavam bem” ou pertenciam à PIDE e ilhargas da sustentação do chamado Estado Novo que estava podre. Ou isso ou há gente que nem tem consciência disso. Distraem-se?

Costa falou ao país na sua conversa de natal. Claro que fez bem e disse umas quantas maravilhas encavalitadas numas quantas suas vontades e perspetivas de fazer melhor para que a dura sobrevivência dos portugueses de cinto apertado seja mais sorridente, mais justa, mais democrática. Oh, mas isso é o meeeedo de uns quantos; que Costa faça mais socialmente por um Portugal melhor, com melhorias (salários justos p.ex.) para milhões, não só para uns quantos e seus servidores. O homem até pode querer mas a pressão é demasiada por parte dos que são donos disto tudo e pagam até via offshores certas e incertas subserviências.

No dizer desses tais certos e incertos isto está mal, muito mal. Que Costa (o governo) é execrável - mas não o dizem abertamente, optam por irem espalhando venenos, desgastando, “fazendo cabeças”. Do passado nada referem. Nem é bom recordar esse passado triste que teve em Cavaco Silva o abafar de muito que eram conquistas de Abril e engordar uns quantos vigaristas, corruptos e ladrões "amiguinhos". Técnicas que depois ainda mais se aperfeiçoaram e acabaram por mostrar um ou outro dos daquelas pandilhas mafiosas. Prisão para esses e investigações credíveis e transparentes é que não vimos, nós, os plebeus, os que pagam e não bufam – ou se bufam são ignorados. E lá veio Barroso – o aldrabão alinhado com Bush e Aznar para ganhar lugar de destaque e de contas chorudas na UE, no mundo, principalmente na alta finança. E Passos/Portas? Ora… mas que belos tempos para uns quantos donos disto tudo! Qual quê! O bombo da festa é Costa e o atual governo. Agora é que tudo isto vai mesmo mal…

Evidentemente que se Costa ou outro governar mesmo à esquerda é linchado. Sabemos que sim. A comunicação social corporativa e domesticada não admite e nem dá tréguas. A pressão para que um governo mais à esquerda não seja efetivo tem sido permanente. Escarrapachado nos tais jornais e televisões corporativistas… E não existem outras TVs. A alienação e a futilidade imperam nas televisões. A manipulação até faz parte dos decores… Um pivete.

Em democracia todos têm direito a criticar, elogiar e opinar. É isso que aqui se faz quando nos dá nas ganas e consideramos ser nosso dever. Consideramos na realidade que nesta modernidade os “antigamentes” estão a regressar em força e sofisticados a certas e incertas mentes e práticas. Há milhões que perguntam: “mas então foi para isto que fizemos o 25 de Abril?”. Justificadamente. Porque existem novas tecnologias, novas mentalidades e o que se vislumbra é um país do antigamente, numa UE que também impõe esse regime, num mundo que está a fascizar-se. Antidemocrático e opressivo, já ditatorial em imensas vertentes, longitudes e latitudes.

Basta, porque há aqui pano para mangas. Leiam o Curto. Tem coisa boa. Bom novo ano 2019… Bom? É o que se deseja mas se nada fizermos por isso este novo ano não vai ser nada bom, antes pelo contrário. Xaropes de revolta, precisam-se. (MM | PG)

Bom dia este é o seu Expresso Curto

A monganga, o dia em que a morte parece doer mais e uma pergunta: onde está o senhor António?

Germano Oliveira | Expresso

Ilusão significa "o que se nos afigura ser o que não é" e também pode ser "quimera" ou "esperança irrealizável", e o mesmo dicionário que nos desenvolve essas definições tem como palavras relacionadas ilusivo, ilusionismo, delusão, ilusionar, ilusório, engano, monganga - este último, um brasileirismo, podia ser nome evolutivo dessa fruta exuberante que é a manga mas fique a saber que não comeremos esta palavra porque já é sinónimo do que António Costa diz não ter sobre as estatísticas do país e nós sobre os discursos políticos - precisamente ilusões. O primeiro-ministro dirigiu-se a Portugal no feriado de Natal e entre as previsibilidades de sempre - declarar que é preciso fazer isto e aquilo e aqueloutro mas sem especificar particularmente como - e as imprevisibilidades que ansiamos - factos, ideias e palavras genuinamente galvanizantes e iluminadas -, venceram as generalidades habituais e os recados mais ou menos ocultos para oposições e parceiros de coligação. "Eu não me iludo e não nos podemos iludir com os números", afirma um primeiro-ministro aparentemente cético aqui mas nem por isso já a seguir: "Pela primeira vez desde o início do século, a nossa economia cresceu mais do que a média europeia, reduzindo fortemente o desemprego, permitindo-nos ter finalmente contas certas e melhorar a vida da maioria das famílias". Está por identificar o que é exatamente "a maioria das famílias", mas António Costa saberá com certeza quantas são e onde estão e qual é o número da maioria e os sofrimentos da minoria. Houve ainda espaço para esse lugar-comum que pode ser dito em 2018, 1018 ou 3018: "Temos de continuar a melhorar os rendimentos e a dignidade no trabalho, aumentar o investimento na educação, na formação ao longo da vida, na criação cultural e científica, na inovação". O Vítor Matos, editor de política e um dos grandes prosadores do Expresso, explica ALI o que é preciso saber sobre o discurso de Natal do primeiro-ministro e nós lamentamos aqui que não tenha sido neste Natal como não foi noutros que um político a falar ao seu país nos tenha arrebatado com palavras - se eles não as têm, e ninguém se ofende se forem melhores a executar do que a falar, arranjem quem as escreva para eles, porque precisamos mesmo de acreditar mais no génio de quem nos lidera e o primeiro veículo de fé é a linguagem. E não, não precisamos de poesia, precisamos de motivação. E inspiração. Porque o mais bonito que nos foi pedido pelo primeiro-ministro é para termos filhos. Ok, pode ser que no Natal de 2068 um desses nossos descendentes diga coisas intelectualmente entusiasmantes e politicamente citáveis como esta: "Ponhamos as coisas neste pé: as minhas exigências estéticas e éticas não tornam muito fáceis as minhas relações com a classe política. São caminhos separados. Não vamos pelo mesmo trilho. Mas a classe política é necessária. Ela existe e tem defeitos. Terá também uma ou outra qualidade".

A MORTE DÓI MAIS NO NATAL?

Morrer há de doer aos que não morrem morra-se em que dia e idade for, parece confuso e porventura é, a morte é para confundir e magoar. Morre-se nas idades todas mas é suposto os velhos morrerem primeiro que os menos velhos e as crianças não morrerem de todo, mas às vezes a vida não acontece na sua ordem natural. Um rapaz nascido há oito anos na Guatemala morreu pouco depois das 00h de 25 de dezembro quando estava sob custódia das autoridades transfronteiriças dos EUA e sob opressão indireta das instruções anti-imigração daquele-cujo-nome-não-deve-ser-pronunciado em respeito pela família enlutada. A história está AQUI e há gente sem um filho que nunca mais haverá de celebrar devidamente um Natal. Porque há dias e idades em que a morte parece doer mais.

SUGESTÕES RÁPIDAS

» As reações ao discurso de Costa em quatro emojis e outros tantos links: 


» Público: "Procurador entregou errata de 15 páginas do caso Sócrates"

» Jornal de Notícias: "Animais nas estradas causaram mais de 700 acidentes em dois anos"

» Correio da Manhã: "Trabalho precário já atinge 950 mil"

» i: "Vamos ter um ano quentinho"

» Jornal de Negócios: "O que esperar de 2019"

» A Bola: "Gedson. 'O meu único desejo é celebrar no Marquês'"

» Record: "Nani. 'Nunca me senti tão bem numa equipa'"

» O Jogo: "Coates. 'Somos muito bons'"

O QUE EU ANDEI A VER: O SENHOR ANTÓNIO, QUE JÁ NÃO SEI ONDE E COMO ESTÁ

Ele caminhava com um calçado roto, tão sujo e indigno que dava vontade de chorar. Mexia-se como se tivesse bengala mas as mãos não a tinham, circulava de costas dobradas e doentes que faziam dele homem a meia haste. Sentou-se junto a mim, cheirava ao fedor da gente que tem nada. Eu sabia-me ao pé dele mas desconfiava se ele me percebia ali, homens destes desistiram de reparar quando os demais desistiram de os ver. Comovo-me com o chapéu dele de ciclista dos anos 80, pala quebrada pela porcaria da rua e a obstinação do sol. Permanecemos profundamente em silêncio, ambos virados de lado para o miradouro que os turistas fotografam no fascínio do pôr-do-sol, a Graça tem Lisboa inteira ao fundo e ele e eu tínhamos os nossos fundos para cuidar.

Agora que escrevo sobre o senhor António, porque ele trata-me por você e eu a ele por senhor (ainda que no bairro eu seja tu para quase todos e ele sem pronome, ninguém lhe fala), constato a hipocrisia - a Sophia, que dá nome à aquele miradouro, explica melhor que eu: "As pessoas sensíveis não são capazes de matar galinhas, porém são capazes de comer galinhas". As pessoas sensíveis não são capazes de ignorar um pobre, porém são capazes de escrever sobre o pobre. Porque o que se deve fazer é ajudar o pobre. E eu não sei onde está o senhor António para o ajudar.

Mas eu já soube onde estava o senhor António. Quando o sol se pôs naquele dia e os turistas e o astro desapareceram, eu continuei focado no meu cigarro e na minha cerveja e ele começou a murmurar sons impercetíveis enquanto olhava fixamente o que só ele sabia diante dele, e eu então

- Como é que se chama?

e ele anuncia-me baixinho e sem emoção

- António. E você?

Respondo-lhe e ele estende-me a mão, a minha macia de quem vive à secretária e a dele com as crateras de histórias duras que desconheço mas imagino.

- Um prazer - diz-me ele, que afinal ainda sabe o que é um prazer.

O senhor António está sentado como caminha, costas arqueadas em derrota, mãos pequenas entre as pernas ainda mais pequenas, pergunto-lhe a idade mas já a esqueci, penso que 53, a altura não a inquiri mas vi-lhe 1,60 metros, quis saber-lhe a vida, jornalista devia desistir das perguntas quando está fora de turno e mais ainda quando as faz a um homem que está a falar sozinho - se ele quisesse ou pudesse comunicar com o mundo já o tinha feito -, mas o senhor António havia de provar-me ser um cavalheiro e respondeu-me a vida dele.

- Estive preso duas vezes, não quero voltar. Não posso, não aguento.

Ele agarra um pacote que tinha escondido não sei onde, creio que fez como os mágicos que tiram flores do pulso mas isto era um pacote como os de leite só que de vinho. Vinho mau, vinho de desespero. Ele bebe e eu vejo que há cartões castanhos enormes em cima do banco de pedra junto ao miradouro e pergunto-lhe (ainda que já saiba a resposta)

- Que é isso, senhor António?

- É a minha cama.

Descubro-lhe uma casa ao ar livre de três metros quadrados: um colchão com suavidades imaginárias, sacos de compras que fingem ser prateleiras sofisticadas e um pano imundo delicadamente pendurado num arame e que se viria a revelar de uma dignidade insuportável. Ele vivia encostado ao miradouro, tinha das melhores janelas e piores vidas da cidade. Falamos, ele conta-me que tinha sido arrumador mas acabou expulso pelos camaradas mais musculados e que a Santa Casa já não ia à Graça e que por isso dependia da caridade da igreja.

- Quer comer, senhor António?

- Sim, se me fizer esse jeitinho.

- Mais alguma coisa?

- Um pacotinho de vinho é pedir muito?

O frango e as costeletinhas na Graça são refeição tão barata quanto boa e ele aprecia como eu o menu que lhe comprei: agradece a comida, diz um obrigado longo que tem lágrimas e guarda o vinho. E depois mostra o carácter de que é feito, a prisão pode destruir um homem mas não lhe arruína as boas maneiras: o senhor António pega naquele pano badalhoco, o termo é mesmo esse porque o pano era mesmo isso, dobra-o entre as pernas como se estivesse a cuidar de um guardanapo bonito num restaurante elegante e janta à minha frente sem dizer uma palavra ou beber uma gota daquele vinho que não era pedir muito. O pano do senhor António é facto que não se esquece: a dignidade tem de sobreviver às catástrofes da vida e ele fez ali um manifesto de honra.

- Precisa de mais alguma coisa, senhor António?

O jantar tinha terminado e ele está a beber o vinho como se fosse um digestivo.

- Pode arranjar-me uma roupinha?

- Claro.

Ele estava a dormir quando lhe regressei com um pijama e uma camisola quente: deitado de lado, a cabeça sobre uma das mãos, um cobertor sujo como o guardanapo, a Graça tem vento à noite e nem no verão aquele miradouro é quente. Acordo-o, ele veste a camisola do pijama por cima da roupa que vestia e guarda o resto nas prateleiras-sacos-de-compras dele.

- Então tenha uma noite boa, senhor António.

- Olhe, se algum dia precisar de alguma coisa, seja o que for, fale comigo. Fale comigo.

Há gente que tem nada mas que dispõe dessa bondade que falta a gente que possui tudo: disponibilizam-se para dar e o senhor António tinha a gratidão dele para entregar. Fui embora para o meu colchão real, para as minhas prateleiras bonitas e os meus guardanapos limpos e um dia avistei-o ao longe vestido a mim, aquela camisola que lhe dei, e não tive coragem de lhe falar nessa ocasião porque temi estar a ir ter com o meu futuro, é um disparate do tamanho do receio que senti. Mas estivemos juntos mais vezes, houve outros jantares em silêncio, levei a Joana e o Pedro a conhecerem-no num fim de tarde com o vento de sempre e na última vez em que nos falámos ele pediu-me cobertores, o sol tinha subido e a temperatura descido.

Nunca mais o vi e estou-lhe em falta, aqui me penitencio e o homenageio. Por isso, se você que me lê encontrar um senhor António, seja melhor que eu: dê-lhe cobertores em vez de escrever sobre ele. É mais quente e está frio.

Obrigado.

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