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João Lourenço e Marcelo Rebelo de
Sousa responderam a perguntas da imprensa a seguir ao encontro
Fotografia: Kindala Manuel | Edições Novembro | Lisboa
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O Presidente da República, João
Lourenço, afirmou ontem, em Lisboa, que, quan-do o Governo se propôs a combater
a corrupção, tinha a noção de que era preciso muita coragem.
O Chefe de Estado, que falava em
conferência de imprensa, no final do encontro com o homólogo português, Marcelo
Rebelo de Sousa, no Palácio de Belém, comparou o desafio a que se propôs o
Governo no combate à corrupção a um ninho de “marimbondo” (uma espécie de
vespas).
“Sabíamos que estávamos a mexer no ninho de ‘marimbondo’ (…) e que podíamos ser
picados. Já começámos a sentir as picadelas, mas isso não nos vai matar”,
afirmou o Presidente João Lourenço, em resposta a uma pergunta sobre se tinha
noção de que este desafio era só comparável a “brincar com o fogo”.
“Se estamos a brincar com o fogo, temos noção das consequências desta
brincadeira. O fogo queima. O importante é mantê-lo sob controlo e não permitir
que ele se alastre”, disse João Lourenço.
“Não é por isso que vamos recuar. É preciso destruir esse ninho do
‘marimbondo’. Quantos marimbondos existem neste ninho? Devo dizer que não são
muitos. Angola tem 28 milhões de habitantes, mas não tem 28 milhões de
corruptos. Portanto, o nú-mero é bastante reduzido”, afirmou o Presidente.
Acrescentou que “somos milhões e contra milhões ninguém combate”, ao referir-se
à cruzada contra a corrupção.
“Que ninguém pense que, por muitos recursos que tenha, de todo o tipo, consegue
en-frentar os milhões que somos. Portanto, não temos medo de brincar com o
fogo; vamos continuar a brincar com o fogo, com a noção de que vamos mantê-lo
sempre sob controlo”, disse.
Questionado se as declarações do ex-Presidente José Eduardo dos Santos sobre
quanto deixou nos cofres do Estado, quando deixou o poder, abrem uma crise
política profunda, João Lourenço foi peremptório: “reservo-me o direito de não
comentar questões de política interna, enquanto durar a minha visita aqui em
Portugal”.
O Presidente João Lourenço afirmou que está em Portugal para “falar do presente
e do futuro das relações de amizade e de cooperação” entre os dois países
e povos. “Viemos corrigir algo que nos parece anormal, o facto de termos
deixado passar um período bastante longo sem que tivesse havido a troca de visitas
de Chefes de Estado de um país para o outro”, afirmou, acrescentando que os
amigos se querem juntos e devem visitar-se mutuamente.
A última vez que um Chefe de Estado angolano visitou Portugal foi há cerca de
nove anos e, segundo João Lourenço, isso denota que “algu-ma coisa terá falhado
nesta busca permanente de alimentar uma amizade entre os dois países”.
Acordo de cooperação
Angola e Portugal assinam hoje, na cidade do Porto, 12 instrumentos jurídicos
de cooperação. Segundo o Presidente da República, estes documentos vão dar
continuidade ao trabalho de reforço do intercâmbio.
“Nessa cooperação queremos ver destacado, sobretudo, o papel dos empresários
portugueses para investir em Angola e o contrário também é verdadeiro”.
Vamos assinar apenas 12 acordos, porque não pretendemos esgotá-los enquan-to o
Presidente Marcelo Rebelo de Sousa não visitar Angola”, disse.
João Lourenço convidou o seu homólogo a visitar Luanda, no próximo ano. A data
deve ser encontrada pelas autoridades diplomáticas dos dois países. “Estamos a
dar oportunidade ao Presidente Marcelo Rebelo de Sousa para, durante a sua
visita a Angola, no próximo ano, podermos também assinar alguns instrumentos de
cooperação que venham consolidar os nossos laços de amizade e cooperação económica”, referiu.
O Presidente reafirmou que Angola está a viver uma nova fase, com importantes
reformas que vêm sendo feitas em diversos domínios e com o interesse de
diversificar a sua economia. João Lourenço quer a contribuição dos
empresários portugueses nestes esforços.
“Ao falar de diversificação da nossa economia não podemos de forma alguma
deixar de contar com a intervenção de Portugal, dos seus empresários, que
gostaríamos de ver em força em Angola, investindo nos mais diferentes sectores
da nossa economia, e não apenas naquela que constitui a principal fonte de
receitas do país, o petróleo”, disse.
O Presidente da República negou o adjectivo “irritante” no mau momento nas
relações entre os dois países nos últimos anos.
“Nunca existiu um irritante nas nossas relações, pelo menos desde que sou
Presidente. O que se passou é que, da parte de Portugal, havia o incumprimento
de um acordo no domínio da Justiça, que existe, e o que Angola fez foi apenas recordar a um país amigo, com quem temos boas relações e
pretendemos continuar a ter - daí a razão da minha presença aqui - da necessidade de a outra parte signatária do acordo respeitá-lo. Só
havia duas saídas: ou denunciar o acordo ou cumprir. E foi cumprido. Angola só
exigiu isso”, esclareceu.
O Chefe de Estado insistiu que quem, em princípio, hesitou em respeitar o
acordo foi o mesmo que o respeitou posteriormente: a justiça portuguesa. “Não
ficaram rancores; o que é passado é passado”, disse o Chefe de Estado.
“As relações dependem da vontade dos povos dos dois países e essa vontade é
imutável. Os dois povos sempre quiseram o bem. O povo não muda, a classe
política sim, porque há eleições e, às vezes, não são sempre os mesmos no
poder. Mas a classe política tem a obrigação de saber interpretar correctamente
a vontade dos povos”, indicou o Chefe de Estado angolano na conferência de
imprensa.
Garantido apoio à
comunidade para a resolução de problemas
O Presidente João Lourenço
garantiu que vai abordar com o Primeiro-Ministro luso, António Costa, a possibilidade
de resolução de casos de cidadãos angolanos que vivem há dezenas de anos em
Portugal sem documentos.
Milhares de cidadãos nacionais enfrentam dificuldades para obter documentos
pessoais, facto que os deixa à margem das oportunidades de emprego. Na conferência
de imprensa conjunta entre João Lourenço e Marcelo Rebelo de Sousa, o Chefe de
Estado luso acrescentou que partilha da mesma preocupação do Presidente
angolano, sobre a situação dos migrantes angolanos.
“As leis portuguesas aplicáveis foram sendo alteradas no sentido de tornar mais
fácil o processo de legalização ou de formalização documental relativamente a
quantos vivem em Portugal há mais ou menos tempo. E isso está permanentemente a
ser acompanhado pelas autoridades dos dois países, não apenas na questão dos
vistos, mas da legalização em termos de residência e da possibilidade de
exercício da actividade laboral”, disse. Acrescentou que tem havido um esforço
para corresponder progressivamente às preocupações apresentadas.
“Admito que esses esforços têm de ser acompanhados também permanentemente no
plano da aplicação administrativa da legislação aprovada”, disse.
Distinção
O Chefe de Estado angolano foi distinguido pelo seu homólogo luso com o “Grande
colar da ordem do Infante D. Afonso Henrique”, em cerimónia realizada no
Palácio de Belém.
O gesto, segundo Marcelo Rebelo de Sousa, assinala “um novo tempo para os dois
Estados, uma nova esperança para os dois povos”.
A Primeira-Dama, Ana Dias Lourenço, recebeu também uma medalha do Presidente Marcelo
Rebelo de Sousa.
Chave de Lisboa
O Chefe de Estado, João Lourenço, recebeu ontem a mais alta distinção do
município de Lisboa. Do presidente da câmara municipal da capital portuguesa,
Fernando Medina, João Lourenço recebeu a Chave simbólica da cidade, momentos
depois de discursar na Assembleia da República.
Na praça do município de Lisboa, acompanhado da Primeira-Dama, Ana Dias
Lourenço, o Presidente da República agradeceu o gesto, na intervenção que fez
no salão nobre da Câmara Mu-nicipal, dizendo sentir “o carinho e amizade dos
portugueses, expresso através dos lisboetas”.
Santos Viola, Lisaboa | Jornal de
Angola