Para o jurista Elisio de Sousa,
pedido moçambicano para extradição não deverá ir adiante. Isso porque acordos
bilaterais devem prevalecer em relação aos plurilaterais, o que dá prioridade
aos Estados Unidos.
O principal advogado da defesa de
Manuel Chang, disse nesta quinta-feira (17.01) à agência Lusa que as autoridades
de Moçambique também pediram às autoridades sul-africanas a transferência do
ex-ministro das Finanças moçambicano. De acordo com Rudi Krause, o
pedido foi feito a 10 de janeiro. Igual pedido já tinha sido feito pela Justiça
dos Estados Unidos, que acusa Chang de crimes financeiros. Quais são as
possibilidades de o pedido moçambicano ser respondido satisfatoriamente? O
especialista em direito penal Elísio de Sousa lembra antes que um pedido nesse
sentido deixaria a Justiça sul-africana numa situação complicada.
"Moçambique tem acordos de
extradição com toda a SADC. Entretanto, existe um acordo especial de extradição
em relação aos Estados Unidos. Olhando juridicamente, de uma forma muito
técnica, o primeiro pedido a ser atendido seria o americano. Temos de ter em
conta que os EUA tem um acordo de extradição com a África do Sul. As normas
finais ditam que devem prevalecer os acordos bilaterais em relação aos acordos
plurilaterais", afirma.
O analista recorda também que os
EUA já tem uma ordem de prisão. "Isso significa que o processo já está
numa fase muito mais avançada que o processo que corre em Moçambique. A reação
da PGR foi só aquando da detenção de Chang na África do Sul, o que fica a
parecer reação do que propriamente ação", argumenta.
Tentativa de proteger Manuel
Chang
Para o advogado de Manuel Chang,
é evidente que o Governo de Moçambique instruiu o seu próprio processo
e que a Procuradoria-Geral
encontra-se em estágio avançado no processo que se desenvolveu no
termos da lei moçambicana. O sul-africano Rudi Krause entende ainda que o
pedido visa garantir que o processo judicial moçambicano possa ter a
oportunidade de decorrer. Mas o jurista Elísio de Sousa não tem o mesmo
entendimento.
"A PGR está a tentar
proteger o cidadão Manuel Chang e não necessariamente instruir o processo.
Olhando para o histórico e cronologicamente para os factos, dá a entender que
há uma coincidência suspeita em relação ao interesse súbito da PGR de ter
Manuel Chang na justiça moçambicana", afirma.
Já o advogado sul-africano
considera que Chang "não é uma pessoa que seja passível de extradição para
os Estados Unidos, acrescentando que se não for extraditado para aquele país,
terá o direito de voltar a sua terra-natal".
Sem interferência política
Quem esteve em Moçambique no
passado dia 14 de janeiro, depois da oficialização do pedido moçambicano de
extradição, foi o Presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa. Pouco
transpirou sobre a agenda do encontro que manteve com o seu homólogo Filipe Nyusi,
mas advinha-se que esse tenha sido um dos temas principais em debate. Haveria
possibilidade de alguma interferência política no processo? O jornalista
Fernando Lima responde negativamente.
"Não ficaria admirado se em
Moçambique existir essa interferência política. Já em relação à África do Sul
ficaria mais surpreendido. Em adição a isso, e exatamente por haver esta
suspeição de que poderá haver uma cooperação política, penso que foi
intencional que o comunicado final do encontro entre Cyril Ramaphosa e Filipe
Nyusi tenha salientado que a Justiça deve seguir o seu curso", diz.
Fernando Lima, jornalista e diretor do semanário Savana
Mas
é preciso lembrar os laços históricos fortes entre os dois países vizinhos. Eles
tomam-se como irmãos e partilham interessses comuns. Para o jornalista Fernando
Lima, nem estes elementos serão chamados ao barulho.
"É preciso enfatizar que
Ramaphosa subiu ao poder em alternativa a Jacob Zuma, que tem uma série de
processos de corrupção. Então, fica mais complicado que um Presidente que
interrompeu o próprio mandato de Jacob Zuma por causa de problemas de corrupção
se possa envolver grosseiramente num processo que tem a ver com o sistema
jurídico. E mais, por tradição, na África do Sul há bastante respeito por essa
separação de poderes, o que não acontece em Moçambique", recorda.
Deutsche Welle
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