Já ninguém pode fingir que não vê
o que se passa na CGD
Rosália Amorim | Diário de Notícias
| opinião
Há muito que havia um elefante na
loja de loiça e que ninguém queria ver. Agora o elefante partiu a loiça toda e
não há como não ver ou ouvir o ruído ensurdecedor.
A Caixa Geral de Depósitos perdeu
1200 milhões em empréstimos de risco. Uma barbaridade. A auditoria da EY colocou o dedo na ferida ao revelar
que o banco deu dinheiro a quem não cumpria as regras de risco e que as várias
administrações da instituição pública fingiram ser surdas e mudas entre 2000 e
2015.
Foram 46 os grandes empréstimos
desastrosos, como o do La Seda
e os dos empresários Joe Berardo e Manuel Fino. As administrações da CGD
ignoraram pareceres de análise de risco e concederam créditos sem terem
garantias suficientes de que iriam recuperar o dinheiro.
Entre os créditos que geraram
imparidades (perdas assumidas com os empréstimos concedidos) no valor de 1,2 mil milhões de euros está o financiamento
da Artland (La Seda )
para a construção de uma fábrica de químicos em Sines - que causou o maior
buraco. Do total do crédito de 350,8 milhões de euros, perderam-se 211 milhões!
Além dos empréstimos mal
concedidos, a CGD também fez vários investimentos ruinosos
A loiça partida deixa muitos
cacos em todos os governos que passaram pela cadeira do poder durante uma
década e meia e afeta partidos de várias cores. Apesar do pior período de
gestão da CGD ter acontecido a partir de 2007, antes, também em executivos do PS
e do PSD, há muito a registar no "livro dos fiados".
Este caso de polícia indigna
todos os contribuintes, afinal trata-se de um banco público. Que exemplo dá o
Estado e o próprio banco quando permitem que alguns portugueses não paguem as
suas dívidas? Ou será que está a enfatizar que só as classes média e média
baixa têm de pagar os seus empréstimos, e se não cumprirem ficam sem casa e vão
viver para debaixo da ponte? O que se passa com a CGD é um tema de equidade e
justiça social grave.
Falando em justiça, porque não
são os administradores dos bancos, como este, responsabilizados, nem os
ministros das Finanças, nem os governadores do Banco de Portugal que por ali
passaram nestes 15 anos? E no caso dos devedores, se há alegada prática
continuada de crime ou alegado roubo, porque não são penalizados ou presos,
como aconteceu com Madoff nos Estados Unidos? Ou porque não pagam os
devedores as dívidas (ou pelo menos uma parte) usando o muito património que
ainda têm, desde coleções de arte até prédios, moradias e escritórios?
Os portugueses estão indignados e
têm todas as razões para estar. E os players que defendem o statu
quo instalado que não venham dizer que debater este tema é populismo. Não
é! Este é um assunto que diz respeito a todos os contribuintes. Até porque de
uma coisa podem ter a certeza: o dinheiro que a CGD vai deixar de receber é
dinheiro que vamos ter de pagar, de algum modo, mais cedo do que tarde.
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