Ao inaugurar segundo mandato,
presidente chama Bolsonaro de fascista e diz que Venezuela está "no centro
de uma guerra mundial". Legitimidade do governo é questionada por Brasil,
EUA e UE, entre outros.
O presidente da Venezuela,
Nicolás Maduro, tomou posse nesta quinta-feira (10/01), em Caracas, para um
segundo período de seis anos na presidência depois de vencer as polêmicas
eleições de maio passado.
Maduro prestou juramento perante
o Supremo Tribunal de Justiça, e não perante a Assembleia Nacional, controlada
pela oposição e cuja legitimidade o presidente não reconhece e que acusa de
afrontar sentenças do tribunal.
O juramento, segundo o próprio
presidente, foi um compromisso com o qual procura "defender a
independência e a integridade absolutas da pátria, levar prosperidade social e
econômica ao nosso povo e construir o socialismo do século 21".
Em seu discurso, Maduro acusou os
Estados Unidos e seus "governos-satélites" de promover uma campanha
de manipulação há mais de 20 anos para "manchar a imagem da revolução
venezuelana" e afirmou que seu país se encontra "no centro de uma
guerra mundial do imperialismo".
"A oligarquia e o
imperialismo, que tantas ditaduras impôs no nosso continente durante todo o
século 20, trata de desfigurar a nossa história política e pessoal. É perita em
impor campanhas", ressaltou Maduro.
No discurso, o líder venezuelano
atacou também o presidente Jair Bolsonaro, a quem chamou de fascista e
representante do extremismo de direita.
"Não podemos economizar
adjetivos para o caso de uma direita como a venezuelana, que já infectou a
direita latino-americana e caribenha com seu fascismo, sua intolerância e seu
extremismo. Vejamos o caso do Brasil e a ascensão de um fascista como o
presidente Jair Bolsonaro", afirmou.
Maduro disse ainda que a
Venezuela é uma democracia com alto grau de participação popular.
"Poderíamos dizer que a democracia foi refundada há anos com a
Constituinte e a Constituição de 1999. Em 19 anos na Venezuela realizaram-se 25
eleições para todos os cargos, inclusive o primeiro referendo revogatório da
história política da humanidade", acrescentou.
Maduro afirmou também que os
manifestantes franceses conhecidos como "coletes amarelos" têm
simpatia por ele e disse que o grupo inclusive lhe enviou um colete de
presente. Entre aplausos de seus partidários, o presidente cogitou ainda a
possibilidade fundar uma seção dos "coletes amarelos" da Venezuela.
"Porque somos os rebeldes, somos os rebeldes do mundo."
A legitimidade do segundo mandato
de Maduro foi questionada pela oposição venezuelana e por vários governos
estrangeiros que não reconhecem os resultados das eleições de maio do ano
passado.
A maioria da oposição venezuelana
não participou do pleito, ou porque o considerava fraudulento ou porque seus
principais líderes estavam presos ou impossibilitados de concorrer. A presença
de observadores internacionais não foi permitida.
O presidente obteve 5.823.728
votos, com uma participação de 8,6 milhões de eleitores dos mais de 20 milhões
que estavam aptos a votar, o que representou a maior abstenção da história
venezuelana. As eleições de maio foram convocadas pela Assembleia Nacional
Constituinte, uma espécie de parlamento alternativo formado apenas por
apoiadores do governo e não reconhecida pela maioria dos países.
Nenhum representante da União
Europeia (UE) ou de seus países-membros esteve presente na cerimônia de posse.
A posição oficial do bloco é que as eleições não foram nem livres nem justas.
Também por não reconhecer a legitimidade do novo governo, a maioria dos países
da América Latina não enviou nenhum representante à posse, da mesma forma que
os Estados Unidos.
O governo brasileiro também não
estava representado. Já a presidente do maior partido da oposição, o PT, Gleisi
Hoffmann, viajou para Caracas para assistir à cerimônia e "levar o apoio
do PT ao povo venezuelano".
Entre os presentes na posse de
Maduro estavam, no entanto, os presidentes da Bolívia, Evo Morales; da
Nicarágua, Daniel Ortega; de Cuba, Miguel Díaz-Canel; e de El Salvador,
Salvador Sánchez Cerén. Além deles, Turquia, Rússia, Belarus, China, Líbano e
Moçambique enviaram representantes para a cerimônia, entre outros países.
Críticas internacionais
Após a posse de Maduro,
Washington reiterou que não reconhece a legitimidade do governo venezuelano.
"Os Estados Unidos não reconhecerão a posse ilegítima da ditadura de
Maduro. Continuaremos a aumentar a pressão sobre este regime corrupto,
apoiaremos a Assembleia Nacional e pediremos liberdade e democracia para a
Venezuela", escreveu o assessor de segurança nacional da Casa Branca, John
Bolton, no Twitter.
A União Europeia afirmou que
Maduro inicia um novo mandato sem base em eleições democráticas e lamentou que
a Venezuela ignore o pedido internacional para a realização de um pleito em
conformidade com as normas democráticas reconhecidas internacionalmente e com a
ordem constitucional do país.
Durante uma reunião
extraordinária, por 19 votos a favor, seis contra e oito abstenções, a
Organização de Estados Americanos (OEA) decidiu nesta quinta-feira "não
reconhecer a legitimidade" do segundo mandato de Maduro, e apelou para a
realização de novas eleições "numa data próxima", com observadores
internacionais.
O presidente do Paraguai, Mário
Abdo Benítez, rompeu as relações diplomáticas com a Venezuela e mandou fechar a
embaixada paraguaia em Caracas.
"O Paraguai reafirma a sua
condenação à ruptura da ordem constitucional e do Estado de Direito na
República Bolivariana da Venezuela, dando pleno apoio e reconhecimento à
Assembleia Nacional, eleita legitimamente em dezembro de 2015", afirmou,
em comunicado emitido nesta quinta-feira.
Benítez disse que dará um prazo
aceitável para a retirada do corpo diplomático venezuelano do Paraguai. O país
destacou que não reconhece o governo de Maduro e expressou solidariedade aos
venezuelanos.
Em reação à posse, o Peru chamou
para consultas em Lima a encarregada de negócios na embaixada peruana em
Caracas, Rosa Álvarez. Há anos, a diplomata era quem comandava a embaixada,
depois de o Peru ter retirado o embaixador do país devido a diferenças
políticas.
O Ministério do Exterior peruano
também confirmou a proibição da entrada de Maduro e centenas de integrantes de
seu governo no Peru.
Em comunicado, o Itamaraty
considerou o segundo mandato de Maduro ilegítimo e reafirmou seu apoio à
Assembleia Nacional. "O Brasil confirma seu compromisso de continuar
trabalhando para a restauração da democracia e do estado de direito na
Venezuela, e seguirá coordenando-se com todos os atores comprometidos com a
liberdade do povo venezuelano", conclui o texto.
Na semana passada, o Grupo de
Lima, formado por Argentina, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica,
Guatemala, Guiana, Honduras, México, Panamá, Paraguai, Peru e Santa Lúcia,
aprovou, com a exceção do México, uma declaração na qual anuncia que
esses países não reconhecem o novo governo de Maduro.
"Sequestro
institucional"
O Parlamento venezuelano, de
maioria opositora, pediu a todas as forças democráticas do país que unam
esforços para se opor ao "sequestro institucional" da Venezuela por
Maduro.
Numa teleconferência organizada
pelo think tank americano Atlantic Council, o presidente da
Assembleia Nacional, Juan Guaidó, afirmou que a nação passa por uma desmontagem
do Estado de Direito que é fruto da "usurpação de poder" conduzida por
Maduro.
Ele denunciou a repressão e
perseguição do regime a oposicionistas. "Há 300 presos políticos e 169
militares detidos, há deserções nas Forças Armadas", assegurou.
A Venezuela passa por uma
profunda crise social, política e econômica, com inflação de
quase 1.700.000% ao ano, falta de produtos e remédios e a fuga de 3 milhões
de habitantes, a maioria para a Colômbia e o Brasil. Maduro acusa os
Estados Unidos, países aliados dos americanos e empresários
venezuelanos de fazerem uma "guerra econômica" contra o seu
governo e a Venezuela.
Ele disse que não descarta
"ações radicais" contra o Parlamento e dirigentes opositores em seu
novo governo e que apoiaria a Assembleia Nacional Constituinte se ela decidisse
dissolver o Parlamento e convocar uma nova eleição para renová-lo.
"Se a ANC, para enfrentar o
golpe de Estado [que Maduro alega estar em andamento contra seu governo], a
rebelião e a ilegalidade, decidisse em algum momento antecipar as eleições,
amém, iríamos todos às eleições", disse o presidente venezuelano, que
disse preferir o diálogo para pôr fim à crise política e econômica na
Venezuela.
O líder venezuelano já afirmou
que os EUA pretendem matá-lo e "impor um governo ditatorial" na
Venezuela, com o apoio do Brasil e da Colômbia. Nesse contexto, ameaçou nesta
quarta-feira os países do Grupo de Lima com "as mais urgentes e duras
medidas diplomáticas" se não voltarem atrás, em até 48 horas, na
declaração em que instam o chavista a não tomar posse e a transferir o poder ao
Legislativo.
Segundo o Conselho Nacional
Eleitoral da Venezuela, Maduro foi reeleito para um novo mandato presidencial
nas eleições antecipadas de 20 de maio de 2018, com 67,84% dos votos.
Um dia depois das eleições, a
oposição venezuelana questionou o resultado, alegando irregularidades e o
desrespeito a tratados de direitos humanos e à Constituição.
AS/efe/lusa
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