quinta-feira, 28 de março de 2019

Brexit | Agora que nada foi aprovado, o que se segue?


As histórias que nos contam os números das votações nas oito moções do Brexit

Oito caminhos alternativos oferecidos, oito caminhos negados. Os deputados britânicos votaram contra a revogação do Artigo 50, que anularia o Brexit, mas também votaram contra todos as opções que confirmariam o Brexit. Como se resolve isto? Os números das votações desta quarta-feira não oferecem consensos claros mas há cenários bem mais populares que outros. As moções poderão voltar a ser votadas mas quem manda no agendamento já disse que um terceiro voto ao acordo de Theresa May só acontecerá se o texto for claramente diferente daqueles que já foram rejeitados pelos Comuns.

lguns números contam histórias tão bem quanto palavras. Esta quarta-feira, a Câmara dos Comuns britânica votou oito alternativas ao acordo de Theresa May - e não houve uma maioria a favor de nenhum desses caminhos. Foram oito “votos indicativos” que deveriam ter permitido aferir as simpatias dos deputados de uma forma mais pormenorizada, mas isso também não foi conseguido. O diário “The Guardian” faz uma primeira página em que fica bem claro que, mesmo com todas estas opções à sua disposição, o consenso parece o mais raro dos bens entre os deputados. Na manchete lê-se o seguinte: “Os deputados tiveram finalmente voto na matéria: Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não.”



O primeiro número a aparecer nas redes sociais de todos os jornalistas que passaram a noite em Westminster a acompanhar a votação foi “27”: o número de deputados trabalhistas que votaram contra a possibilidade da realização de um referendo ao acordo de Theresa May, apesar de ser essa a política oficial do partido e de Jeremy Corbyn, o líder dos trabalhistas, e de este não ter oferecido liberdade de voto à sua bancada.

Ou seja, 27 rebeldes desafiaram a disciplina. Por quantos votos é que esta moção não passou? Esses mesmos 27. De forma ainda mais clara: podíamos estar agora a escrever sobre se Theresa May iria ou não dar seguimento às preparações para um segundo referendo que poderia mudar todo o rumo do Brexit, mas em vez disso está toda a imprensa a tentar entender o que levou quase três dezenas de trabalhistas a abandonar a política oficial do partido.

Algumas razões prendem-se com o facto de muitos membros do Labour, Corbyn incluído, quererem respeitar a decisão do povo britânico no referendo de 2016, independentemente de existir agora muito mais informação sobre o Brexit e suas potenciais consequências do que quando o referendo se realizou. A defesa de um referendo não pressupõe que os trabalhistas queiram reverter o Brexit, querem apenas um acordo diferente mas, ainda assim, 111 deputados votaram no sentido de revogar o artigo 50, e, assim, acabar com o Brexit de uma vez por todas. A disciplina partidária não foi respeitada por mais de 120 membros do partido trabalhista.

Do lado dos conservadores, os números são igualmente merecedores de análise. Oito conservadores votaram num segundo referendo e dez votaram no fim do Brexit. Menos de metade dos parlamentares conservadores votaram na ampliação da data legal para a saída de Reino Unido. Apenas 150 votaram a favor, 93 votaram contra. Ou seja, foi aprovado por votos trabalhistas.

Portanto, mais de 100 membros conservadores afastaram-se, e muito, daquele que tem sido o discurso oficial do partido em todas as frentes. A favor de uma saída sem qualquer acordo votaram 160 deputados no geral - incluindo Dennis Skinner, Kate Hoey e Ronnie Campbell, os três trabalhistas.

Pouco depois de conhecidos os resultados, um outro cenário começou a desenhar-se. Se forem contabilizados os votos a favor da moção que previa que o Reino Unido integrasse uma união alfandegária, verifica-se que há mais deputados a favor desta moção do que do acordo de May (264 contra os 242 de May). E a diferença é ainda maior quando se colocam lado a lado os votos favoráveis ao acordo de May e aqueles que hoje foram depositados a favor de um segundo referendo - 268 a favor, mais 26 do que os de May. É esta a discussão que tomou agora conta do processo do Brexit: será que uma destas opções pode comandar a lealdade de uma maioria de deputados?

Alguns deputados estão a defender que estas moções sejam de novo levadas a votos, mas ainda não é claro que o presidente da Câmara concorde em voltar a dar uma oportunidade a estes textos - que já foram rejeitados uma vez - tal como não dá a May para que ela leve, de novo, o seu acordo a votos. O jornalista de política da "Sky News" Lewis Goodall considera que uma eleição geral pode estar mais perto do que nunca. “Dado que os números não existem neste parlamento para aprovar o seu acordo, ou qualquer acordo, a única alternativa deve ser votarmos num novo parlamento”.

Ana França | Expresso | Foto: EPA

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