As histórias que nos contam os
números das votações nas oito moções do Brexit
Oito caminhos alternativos
oferecidos, oito caminhos negados. Os deputados britânicos votaram contra a
revogação do Artigo 50, que anularia o Brexit, mas também votaram contra todos
as opções que confirmariam o Brexit. Como se resolve isto? Os números das votações
desta quarta-feira não oferecem consensos claros mas há cenários bem mais
populares que outros. As moções poderão voltar a ser votadas mas quem manda no
agendamento já disse que um terceiro voto ao acordo de Theresa May só
acontecerá se o texto for claramente diferente daqueles que já foram rejeitados
pelos Comuns.
lguns números contam histórias
tão bem quanto palavras. Esta quarta-feira, a Câmara dos Comuns britânica votou
oito alternativas ao acordo de Theresa May - e não houve uma maioria a favor de
nenhum desses caminhos. Foram oito “votos indicativos” que deveriam ter
permitido aferir as simpatias dos deputados de uma forma mais pormenorizada,
mas isso também não foi conseguido. O diário “The Guardian” faz uma primeira
página em que fica bem claro que, mesmo com todas estas opções à sua
disposição, o consenso parece o mais raro dos bens entre os deputados. Na
manchete lê-se o seguinte: “Os deputados tiveram finalmente voto na matéria:
Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não. Não.”
O primeiro número a aparecer nas
redes sociais de todos os jornalistas que passaram a noite em Westminster a
acompanhar a votação foi “27”: o número de deputados trabalhistas que votaram
contra a possibilidade da realização de um referendo ao acordo de Theresa May,
apesar de ser essa a política oficial do partido e de Jeremy Corbyn, o líder dos
trabalhistas, e de este não ter oferecido liberdade de voto à sua bancada.
Ou seja, 27 rebeldes desafiaram a
disciplina. Por quantos votos é que esta moção não passou? Esses mesmos 27. De
forma ainda mais clara: podíamos estar agora a escrever sobre se Theresa May
iria ou não dar seguimento às preparações para um segundo referendo que poderia
mudar todo o rumo do Brexit, mas em vez disso está toda a imprensa a tentar
entender o que levou quase três dezenas de trabalhistas a abandonar a política
oficial do partido.
Algumas razões prendem-se com o
facto de muitos membros do Labour, Corbyn incluído, quererem respeitar a
decisão do povo britânico no referendo de 2016, independentemente de existir
agora muito mais informação sobre o Brexit e suas potenciais consequências do
que quando o referendo se realizou. A defesa de um referendo não pressupõe que
os trabalhistas queiram reverter o Brexit, querem apenas um acordo diferente
mas, ainda assim, 111 deputados votaram no sentido de revogar o artigo 50, e,
assim, acabar com o Brexit de uma vez por todas. A disciplina partidária não
foi respeitada por mais de 120 membros do partido trabalhista.
Do lado dos conservadores, os
números são igualmente merecedores de análise. Oito conservadores votaram num
segundo referendo e dez votaram no fim do Brexit. Menos de metade dos
parlamentares conservadores votaram na ampliação da data legal para a saída de
Reino Unido. Apenas 150 votaram a favor, 93 votaram contra. Ou seja, foi
aprovado por votos trabalhistas.
Portanto, mais de 100 membros
conservadores afastaram-se, e muito, daquele que tem sido o discurso oficial do
partido em todas as frentes. A favor de uma saída sem qualquer acordo votaram
160 deputados no geral - incluindo Dennis Skinner, Kate Hoey e Ronnie Campbell,
os três trabalhistas.
Pouco depois de conhecidos os
resultados, um outro cenário começou a desenhar-se. Se forem contabilizados os
votos a favor da moção que previa que o Reino Unido integrasse uma união
alfandegária, verifica-se que há mais deputados a favor desta moção do que do
acordo de May (264 contra os 242 de May). E a diferença é ainda maior quando se
colocam lado a lado os votos favoráveis ao acordo de May e aqueles que hoje
foram depositados a favor de um segundo referendo - 268 a favor, mais 26 do que
os de May. É esta a discussão que tomou agora conta do processo do Brexit: será
que uma destas opções pode comandar a lealdade de uma maioria de deputados?
Alguns deputados estão a defender
que estas moções sejam de novo levadas a votos, mas ainda não é claro que o
presidente da Câmara concorde em voltar a dar uma oportunidade a estes textos -
que já foram rejeitados uma vez - tal como não dá a May para que ela leve, de
novo, o seu acordo a votos. O jornalista de política da "Sky News"
Lewis Goodall considera que uma eleição geral pode estar mais perto do que
nunca. “Dado que os números não existem neste parlamento para aprovar o seu
acordo, ou qualquer acordo, a única alternativa deve ser votarmos num novo parlamento”.
Ana França | Expresso | Foto: EPA
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