domingo, 10 de março de 2019

Portugal | Quem representa o quê?


Domingos de Andrade* | Jornal de Notícias | opinião

É um círculo vicioso. Cada vez menos povoado, o interior do país vai perdendo representatividade e peso político. Sem voz no Parlamento, cresce a dificuldade de ver debatidas e aprovadas medidas que equilibrem a balança a seu favor. Desde 2002, o interior perdeu seis deputados e nas próximas legislativas prepara-se para uma redução de mais dois.

Não deixará de haver um político que bata no peito a lamentar o sucedido. O problema é que nem por isso se preparou, com tempo, uma reforma do sistema eleitoral que evitasse a crescente distorção do território.

Este é o Governo que criou uma Secretaria de Estado para a Valorização do Interior. Mas uma coisa é o sinal de boa vontade (ou propaganda?), outra a aprovação de medidas com impacto direto no terreno. Essas, claro, ou incomodam ou custam dinheiro. Eliminar portagens nas antigas SCUT, por exemplo. Assumir um choque fiscal capaz de atrair investimento. Descentralizar serviços e admitir que a administração central saia dos limites do Terreiro do Paço.

Um país que não está devidamente representado na Assembleia da República é a prova provada da falência do próprio sistema político. De um conjunto de eleitos que os eleitores mal conhecem, que saem pouco nos dias em que deveriam ter trabalho nos círculos que os elegem, que passam sessões legislativas inteiras sem uma única intervenção no hemiciclo.

E na verdade, na verdade verdadeira, também não fará muita diferença. Mais deputado, menos deputado, porque a maioria está lá para servir os diretórios partidários e não o interesse de quem os elegeu. E essa é a questão fulcral. Há anos que se arrasta o debate em torno de propostas como a de criação de círculos uninominais. Seja essa ou outra via para reformar o sistema, algo tem de ser feito no sentido da coesão e da representatividade do todo e das suas partes. Não apenas para que o país pare de morrer aos poucos, mas para que também a classe política recupere o respeito e a confiança daqueles que é suposto representar.

*Diretor do JN

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