Eugénio Costa Almeida* | opinião |em Vivências
O Presidente João Lourenço, pelo
Dia da Paz e da Reconciliação Nacional, efectuou uma visita de Estado e de
charme à Rússia.
No Dia da Paz condecorou o líder
russo, Vladimir Putin com a Ordem Agostinho Neto (ainda que não saiba o que fez
Putin para merecer a condecoração. Se é para celebrar o apoio do povo russo no
conflito menor nacional – dito guerra-civil, e que de menor nada teve, bem pelo
contrário, dado ter envolvido directa e indirectamente, vários países em
território nacional – então deveria ter sido o principal representante russo, a
Duma, a ser condecorada. Assim condecorar-se-ia quem, de facto, contribuiu com
pessoas e material para a guerra em Angola: o Povo Russo.
Mas há factos que a diplomacia
não pode evitar. E um dos factos é que quem manda – e no caso russo, sabe-se
bem quem manda – é que determina as relações inter-Estados, em particular, a
cooperação.
Vários protocolos e acordos de
cooperação foram assinados, com especial destaque para a cooperação militar e,
com maior ênfase por parte dos russos, para a exploração diamantífera e pescas
e...exploração espacial! – neste caso, com clientes como nós, em que entregam
produto deteriorado e ficamos, eternamente, a aguardar a reposição da parte
garantida, ou seja, um novoa...
Também não é em vão que, para os
russos «Angola é um parceiro confiável há muito tempo». Somos comidos e ainda
celebramos... Se bem que acredito que o Presidente João Lourenço terá feito
saber aos russos da nossa incomodidade quanto aos atrasos com o segundo AngoSat
e como isso condiciona as nossas telecomunicações e defesa do habitat... (é
incompreensível que um satélite demore mais de 2 anos a ser construído)!
Mas o que mais ressalva, apesar
das notícias indicarem que a cooperação abordada seria a nível é a colaboração
no âmbito militar com a possibilidade dos russos construírem uma fábrica de
equipamento militar (muito vago) e pelo facto da Rússia – e da antiga União
Soviética – ter sido – é ainda é, pelo menos a nível aéreo como a seguir
referirei – um dos principais fornecedores de armamento e de muitos militares,
como o próprio Presidente João Lourenço, terem sido formados nas academias
militares russas.
Ora essa (contínua) colaboração
já se fez sentir, recentemente com o recebimento pela Força Aérea Nacional de 6
novos caças seis caças russos Sukhoi Su-30 e aguardando a entrega mais dois
aviões no final de Maio, além de estarmos interessados em comprar um dos mais
modernos sistemas russos antiaéreos – e justamente considerado como um dos mais
avançados –, o “escudo” S-400, com capacidade para abater aviões inimigos a 250 km de distância(!?).
Nós sabemos que Angola é um
“chock point” muito estratégico na rota atlântica austral. E mais será com o da
sua plataforma continental para ocidente, quase “ocupando” mais de 1/3 do
Atlântico Sul a ocidente.
Mas a questão que se coloca é
esta. Precisa Angola de reforçar a sua esquadrilha de caças – por certo muito
caros – quando há disposições internas que carecem desse dinheiro para
benfeitorizar áreas como a saúde, a má-nutrição, a salubridade pública, o desenvolvimento
territorial – não esquecer as previstas eleições regionais – a distribuição de
água potável e de electricidade (dendo que esta é dos produtos de primeira
necessidade que mais faz desenvolver um País), etc?...
Dirão que uma coisa não impede a
outra. Mas quando todos sabemos e o Presidente não o eixou de o referir por
mais de uma vez que estamos em crise e que todo o dinheiro é pouco; por alguma
coisa estamos a exigir que os fundos saídos irregularmente do País, retornem, é
lógico que devemos pensar um pouco e ponderar das prioridades.
Será que temos as nossas
fronteiras sob escrutínio territorial de terceiros? Mesmo sem descurar a
Segurança Nacional, não seria mais útil gastar estes dinheiros em outros fins,
como s já indicados?
Até porque se analisarmos o IISS
Military Balance 2018 (editado no primeiro trimestre de 2019) vamos verificar
que dentro da nossa área estratégica (Atlântico Austral e Golfo da Guiné e
comparando com as maiores potências da área) Angola, o 58o país, a nível
mundial, em despesa militar (em 2017 correspondia a 2,% do PIB), tem cerca de
78 aviões de ataque (entre caças (32) e ataque ao solo e bombardeiros (42) e
helicópteros (117, inclui de transporte e de ataque) além de aviões de transporte
e de treino) sendo que no total deveremos ter cerca de 293 aeronaves, não
incluindo estas últimas) contra, por exemplo, a África do Sul, 32o a nível
mundial em despesa militar, mas que só representa 1,34% do PIB, e que tem,
grosso modo e no total cerca de 195 aeronaves (distribuídas entre 26 aviões de
combate gerais e 86 helicópteros e o restante de treino e de transporte), ou,
ainda, o Brasil, 13o e com cerca de 1,41% de despesas militares face ao PIB,
mas com uma força aérea de cerca de 650 aeronaves (96 aviões de combate,
incluindo caças (47) e ataques ao solo (49), e 95 helicópteros, além de aviões
de patrulha marítima, UAV (drones), de transporte e de treino).
Dirão que até nem teremos muitos
aviões para defesa territorial. Talvez não, mas teremos, certamente, muitos
mais que outros países limítrofes a nós, como a RDC que só tem cerca de 20
aeronaves, entre caças e helicópteros...
Por vezes, devemos ter em conta
não a quantidade, mas a qualidade do material de guerra e de defesa nacional.
Seno que vamos ter uma das
maiores áreas de plataforma continental do Atlântico Sul, se uma boa Força
Aérea é importante para patrulhar o espaço nacional (terrestre e,
principalmente, marinho), não menos é importante a Marinha. E nesta somos
largamente ultrapassados pelos nossos vizinhos atlânticos.
Enquanto Angola apresenta uma
Marinha com 59 navios (entre patrulhas atlânticos e corvetas), a Árica do Sul,
só apresenta ter 20 navios – mas de qualidade superior, já que incorporam
patrulhas oceânicos, corvetas, fragatas, navios de apoio e transporte e... 3
submarinos que lhe permitem controlar toda a área marítima e a rota atlântica,
aquilo que os russos veem em nós como parceiro estratégico nessa área – e o
Brasil tem cerca de 50 navios, entre patrulhas atlânticos oceanográficos (31) e
5 submarinos.
É lógico que não vamos aqui pedir
que compremos submarinos. Mas podemos ter outros meios de defesa mais baratos
ou de custos inferiores e de incorporação nacional. Recordemos como o navio
oceanográfico de pesquisa comprado à Holanda está inoperacional por razões
técnicas de origem ou compramos patrulhas costeiras ao exterior quando, no
Lobito, temos estaleiros que podem construir além de barcos de pesca/arrasto,
pequenos navios patrulhas costeiras – não esquecer a Operação Transparência no
Mar e na defesa dos nossos atractivos bancos de pesca – e, mais tarde,
patrulhas oceânicos.
Fica à consideração.
*Investigador do Centro de
Estudos Internacionais do ISCTE-IUL(CEI-IUL) e investigação para Pós-Doutorado
pela Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto**
** Todos os textos por mim
escritos só me responsabilizam a mim e não às entidades a que estou agregado
*Eugénio Costa
Almeida – Pululu -
Página de um lusofónico angolano-português, também colaborador em Página Global
Foto: © Sputnik / Grigory Sysoev
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