quarta-feira, 10 de abril de 2019

Portugal | Patrões que valem por 52


Pedro Ivo Carvalho* | Jornal de Notícias | opinião

Pode um patrão valer por 52 trabalhadores? Não. A nenhum homem ou mulher pode ser dado esse poder. Independentemente da sua condição social ou profissional. Mas sendo essa uma impossibilidade filosófica, é um facto que os CEO das principais empresas cotadas na Bolsa portuguesa obtiveram no ano passado um rendimento médio 52 vezes superior ao de cada funcionário. Fosso salarial que, ano após ano, se vai repetindo e que traduz a natural vocação dos grandes grupos económicos em privilegiar os acionistas em detrimento dos empregados. A lógica é a de sempre: a obtenção de resultados redunda no pagamento de prémios chorudos aos gestores e de dividendos aos donos. São as regras do mercado. Mas a dimensão das empresas e dos empresários não se mede apenas na riqueza e nos postos de trabalho gerados, mas também, e cada vez mais, na forma como coletivizam os lucros. E por coletivizar entenda-se democratizar, universalizar, recompensar. No fundo, gerir com justiça. A The Navigator Company, cujo CEO Diogo da Silveira terminou o ano de 2018 a ganhar 23 vezes mais do que os trabalhadores, deu, pese embora esta discrepância salarial, um exemplo que merece nota. Os acionistas aprovaram a distribuição de 23 milhões de euros em prémios aos 3200 trabalhadores (cerca de 7200 euros por cabeça). Ora, isto só foi possível porque o grupo registou a melhor performance da sua história (225 milhões de euros de lucro, uma subida de 8%), embora isso em Portugal não seja condição obrigatória para nenhum tipo de altruísmo. Aliás, ninguém estranharia que o quinhão agora reservado aos funcionários tivesse ido parar ao bolso dos acionistas. Mas não: ao melhor resultado de sempre, a The Navigator Company decidiu atribuir o prémio mais elevado de sempre aos trabalhadores. Certamente que nem todas as empresas podem dar-se a este luxo (devíamos chamar-lhe normalidade), mas fica provado que a busca de resultados e a sujeição às regras do capitalismo não são um bicho-papão. E que é possível conciliar a derradeira missão de uma empresa (o lucro) com a responsabilidade social perante aqueles que, em diferentes patamares de responsabilidade, alimentam o êxito. É assim que se mede o valor dos patrões.

*Diretor-adjunto

Sem comentários:

Mais lidas da semana