Com avanço de verdes e
populistas, conservadores e social-democratas devem perder maioria no
Parlamento Europeu, e alianças devem ser cruciais. Comparecimento às urnas foi
o maior das últimas duas décadas.
A maior surpresa das eleições
para o Parlamento Europeu foi a grande participação nas urnas. Entre 23 e 26 de
maio, cerca de 51% dos 420 milhões de eleitoras e eleitores da União
Europeia (UE) entregaram seu voto, oito pontos percentuais a mais do que no último
pleito, cinco anos atrás, e do que nas últimas duas décadas.
Protestos contra a política
climática, estudantes em greve e rechaço aos partidos populistas de direita e
antieuropeus aparentemente mobilizaram a população, avaliou Janis
Emmanouilidis, especialista em política do European Policy Centre de Bruxelas,
em entrevista à DW.
Na opinião da liberal
dinamarquesa Margrethe Vestager, atual comissária europeia para a Concorrência,
os cidadãos reconheceram que votar é poder. "Deve-se utilizar esse poder e
dizer que há coisas em jogo. Candidatam-se partidos que querem destruir a UE,
partidos que se denominam nacionalistas, mas vendem seu país aos russos. Isso
fez as pessoas pensarem que desta vez é preciso realmente ir votar."
O principal candidato dos social-democratas
europeus, Frans Timmermans, se disse feliz, pois a grande participação é
"um ótimo sinal de uma democracia funcional".
Liberais e verdes terão maior
presença no Parlamento Europeu. Na Alemanha, o Partido Verde conquistou 20% dos
votos, ficando em segundo lugar atrás dos conservadores da União Democrata
Cristã (CDU), da chanceler federal Angela Merkel, e da União Social Cristã
(CSU), e à frente do Partido Social-Democrata (SPD). Esse foi o
melhor resultado já obtido pela legenda ambientalista numa eleição de âmbito
nacional.
Decepcionado, o chefe da bancada
social-democrata europeia, Udo Bullmann, admitiu que seu partido subestimou o
tema da política climática, e prometeu corrigir a falha.
Também a presidente da CDU,
Annegret Kamp-Karrenbauer, admitiu déficits quanto à política ambiental. Apesar
das perdas, ela se disse feliz por a união conservadora se manter como grupo
mais forte na Alemanha e no Parlamento Europeu.
Business as usual em
Bruxelas?
Após o fechamento das urnas, o
alemão Manfred Weber, principal candidato da aliança conservadora Partido
Popular Europeu (PPE), anunciou a intenção de se tornar chefe da Comissão
Europeia: "Não conseguimos uma grande vitória, mas somos o grupo mais
forte."
O social-cristão alemão conclamou
os demais partidos pró-europeus a cooperarem, dirigindo-se expressamente aos
ambientalistas da política: "Os verdes são também os vencedores do dia,
pois isso são os possíveis parceiros. Devemos nos sentar juntos e esboçar um
mandato para os próximos cinco anos."
Segundo resultados preliminares,
o PPE de Weber dispõe de 180 assentos no Parlamento Europeu, 42 a menos do que antes. A
Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas (S&D) igualmente perdeu
espaço, detendo agora 146 vagas.
A Aliança dos Liberais e Democratas
pela Europa (ALDE) ficou com 109 mandatos, incluído o novo partido do
presidente francês, Emmanuel Macron. O Grupo dos Verdes/Aliança Livre Europeia
saltou de 52 para 69 vagas.
Os populistas de direita se
mostraram fortes em alguns dos 28 países-membros da UE, como a Itália e a
França, mas no geral tiveram desempenho abaixo dos prognósticos. Juntos,
concentram 150 assentos, porém divididos em três diferentes facções. Os
nacionalistas da Alternativa para a Alemanha (AfD) não cresceram tanto quanto
previsto. Nos estados de Brandemburgo e da Saxônia, no leste alemão, contudo,
obtiveram maioria, ainda à frente das conservadoras CDU/CSU.
Emmanouilidis ressalta que as
legendas pró-europeias ainda detêm cerca de 80% dos assentos. "Como grupo,
os populistas de direita não são tão fortes quanto alguns advertiram antes. Já
sabíamos que não obteriam maioria, mas eles são talvez ainda mais fracos do que
pensávamos", afirma o especialista em política da UE.
Na Itália, a ultradireitista
Liga, do ministro do Interior Matteo Salvini, abocanhou a maior parte dos
votos. Na França, a extremista de direita Marine Le Pen venceu o partido do
presidente. "Macron realmente tentou colocar seu peso político na balança
para tentar evitar que Le Pen e o partido dela ganhassem dianteira. E não
conseguiu", resume Emmanouilidis.
Em muitos dos Estados-membros da
UE observa-se que os até então dominantes grupos centristas encolheram.
Liberais, verdes e direitistas se fortaleceram. Peritos eleitorais de Bruxelas
falam de uma fragmentação crescente.
"Vemos que os grandes
partidos devem engolir alguns sapos, e que precisa se formar uma coalizão ampla
para encontrar uma maioria", afirma Emmanouilidis.
No futuro Parlamento Europeu,
conservadores e social-democratas não terão mais maioria como "grande
coalizão" informal, como até então, precisando se associar aos liberais e
talvez também à bancada verde. Uma coalizão de centro-esquerda, formada por esquerdistas,
social-democratas, verdes e liberais não basta para a maioria. Uma maioria de
centro-direita tampouco é viável, já que os democratas-cristãos descartam
associar-se aos nacionalistas e populistas de direita.
"A partir de agora vai ficar
complicado, porque ninguém consegue juntar uma maioria que baste sem o
outro", observou Vestager, que concorre a presidente da Comissão Europeia
pelos liberais. "Então vai ser bem interessante nos próximos dias, ver
quem fala com quem, para colocar as coisas em andamento."
Efeitos colaterais
No Reino Unido, a eleição
europeia foi especialmente incomum, pois, embora pretenda abandonar a UE, o
país não conseguiu organizar o Brexit a tempo, antes da votação. Por isso, na
sexta-feira a primeira-ministra britânica, Theresa May, apresentou sua
renúncia. Como previsto, o novo Partido do Brexit, do eurocético Nigel
Farage, venceu o pleito com folga, obtendo 31,5%, e os conservadores no governo
foram duramente castigados.
Na Grécia, a legenda populista de
esquerda Syriza perdeu para a oposição conservadora, levando o premiê
Alexis Tsipras a anunciar novas eleições.
Na Áustria, o conservador Partido
Popular (ÖVP), do chanceler federal Sebastian Kurz, ganhou novas forças, embora
nesta segunda-feira ele deva se apresentar ao parlamento em Viena para uma
moção de confiança.
Por sua vez, os populistas de
direita do Partido da Liberdade da Áustria (FPÖ) ficaram em terceiro
lugar, atrás dos social-democratas e alguns pontos percentuais a menos do que
previsto antes do recente "caso Ibiza".
Num encontro na ilha espanhola
com a suposta sobrinha de um oligarca russo, em 2017, o ex-chefe do FPÖ e agora
ex-vice-chanceler federal Heinz-Christian Strache prometeu-lhe
vultosos contratos públicos em troca de apoio financeiro para sua campanha
eleitoral. A recente divulgação do vídeo do encontro por dois veículos de
imprensa alemães desencadeou um escândalo político, forçando os populistas de
direita a abandonarem a coalizão governamental e Strache a renunciar a seus
cargos.
Na Alemanha, quem ficou
especialmente feliz com o resultado das urnas foi Martin Sonneborn,
fundador do Die PARTEI: o partido agora possui dois mandatos em Estrasburgo,
mas ainda nenhum programa. Die PARTEI é acrônimo para "Partido do Trabalho,
Estado de Direito, Proteção dos Animais, Incentivo às Elites e Iniciativa
Democrática de Base", em alemão.
Bernd Riegert | Deutsche Welle
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