Se bem conhecemos o povo
brasileiro, a mentira e a manipulação não serão o fim desta história
Pedro Filipe Soares | Público |
opinião
O portal Intercept
Brasil publicou um conjunto de mensagens trocadas entre Sergio Moro e
procuradores do Ministério Público brasileiro. Na altura, Sergio Moro era
juiz federal e os procuradores pertenciam à equipa da Operação Lava-Jato.
Juntos, estruturaram e aplicaram um plano para a direita chegar à presidência
do Brasil, prendendo Lula da Silva e afastando o PT (Partido dos Trabalhadores)
do poder. Um verdadeiro assalto ao Palácio do Planalto sob a capa de um suposto
combate à corrupção.
Diz a lei que a Justiça se aplica
com imparcialidade, que o juiz não é o acusador nem faz parte da defesa, que as
acusações não são políticas e que os procuradores não têm agendas partidárias.
A lei diz isso em Portugal, como o faz no Brasil. Mas, entre a lei e a
realidade, há um Moro de distância que destruiu os pilares do Estado de Direito
e da presunção da inocência.
Os diálogos divulgados mostram a
enorme promiscuidade entre juiz e procuradores. Moro aconselha estratégias,
dá dicas ou pistas, até chega a repreender o procurador chefe por falhar o
calendário mediático. Por seu lado, o procurador partilha informação com o
juiz, manobra para que o caso lhe vá parar às mãos, confidencia a falta de
provas concretas e inequívocas, faz propostas para serem negadas e manter uma
aparência de separação de poderes. Neste jogo encenado o resultado já estava
combinado. Não houve um processo para chegar a uma acusação e a um veredito,
existiu um veredito primordial e uma acusação montada num processo que lhe
servia à medida. Lula
da Silva estava condenado à partida.
A trama dá conta de um pensamento
que faria inveja a Maquiavel. A cartilha populista está bem urdida,
demonstrando o que significa levar à prática a ideia da “justiça em praça
pública”. A personagem do justiceiro é sempre uma das mais acarinhadas, Moro
sabia disso e desejava-o. Da mesma forma, Deltan Dallagnol (o procurador que
chefiava a equipa da Lava-Jato) sabia que a suspeição de corrupção é o
suficiente para criar um clima de dúvida, pensa-se que “onde há fumo há fogo”.
Quando se alinhou com estes ingredientes a
agenda dos grandes grupos económicos da comunicação social, ficou visível a
imensa capacidade de manipulação de milhões de pessoas. “A opinião pública é
decisiva e é um caso construído com prova indireta e palavra de colaboradores
contra um ícone”, dizia um dos procuradores explicando como a condenação
pública era parte fundamental da estratégia.
A agenda política é inegável. O
caso mais caricato foi o da possibilidade de Lula da Silva dar uma entrevista
antes da segunda volta das eleições brasileiras. Uma conferência de imprensa
“antes do segundo turno pode eleger o Haddad”, conversaram entre si os
procuradores. Por isso, tudo fizeram para tal ser impossível, num desespero
épico como demonstram as mensagens. A entrevista não aconteceu e Bolsonaro teve
o caminho desimpedido para a presidência, o plano deu certo dessa vez.
O que também fica claro é a
dimensão da mentira. Por um lado, na atuação de Moro. “Vamos colocar uma coisa
muito clara, que se ouve muito por aí que é a estratégia de investigação do
juiz Moro. [...] Eu não tenho estratégia de investigação nenhuma. Quem
investiga ou quem decide o que vai fazer é o Ministério Público e a Polícia
[Federal].” Por outro lado, nas afirmações de Deltan Dallagnol, quando disse
que “o trabalho do MPF [Ministério Público Federal] na Lava-Jato é
técnico, imparcial e apartidário” e garantia sobre Moro que “sempre avaliou os
pedidos do Ministério Público de modo imparcial e técnico”. Tudo parte de um
imenso golpe, agora se percebe sem quaisquer dúvidas.
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