Martinho Júnior, Luanda
… E se o que estiver mal e pronto
a corrigir, for muito mais do que aquilo que está bom e merece ser
melhorado?...
01- Apesar de não ter tido ainda
fim o ciclo de terapia neoliberal que tem infestado Angola desde 2002, na
sequência do choque protagonizado por Savimbi por via da sua “guerra dos
diamantes de sangue”, o primeiro ano do exercício do General João Lourenço na
Presidência da República tem sido uma primeira “pedrada no charco” dos “acomodados”.
A “acomodação”, decorrente
de mais de 33 anos de instalada deriva instalando o capitalismo neoliberal,
estabeleceu-se com:
- Uma vulnerabilização
progressiva do estado angolano, que acabou por ser tutelado por poderosas
máfias intestinas e internacionais, num alucinado projecto de “100
novos-ricos”;
- Um “mercado” (?)
selvagem que contribuiu para desequilibrar mais ainda a sociedade, provocando
ainda mais assimetrias e aumentando a dependência ao sector do petróleo, apesar
da desvalorização do preço do barril;
- Um esbanjamento crónico de
recursos económicos e financeiros em resultado da perda de mérito, competência
e rigor, favorecendo na razão inversa uma corrupção cada vez mais desenfreada e
exclusivista, aparentemente “sem limites”, sob os mais diversos rótulos e
justificações;
- Uma retrógrada deriva
social-democrata, camuflando velados expedientes de assimilação com identidade
neocolonial, em prejuízo da identidade patriótica que daria sentido a um
coerente Programa Maior ao movimento de libertação…
No fundo procurou-se cortar
definitivamente com o sentido histórico do movimento de libertação, ainda que
mantendo os rótulos, desalojando a criatura “antiga” residente
natural da concha, a fim de albergar um “novo” e injectado indivíduo,
apagando ou subvertendo tanto quanto o possível a própria história.
02- Os parâmetros dessa “acomodação” lesa-pátria,
em nome duma glasnost não anunciada muito menos democratizada, com o início da
Presidência do General João Lourenço esgotou-se no cúmulo desse processo
contraditório, “chocando contra a parede”!
Gerir um estado fiel depositário
dos legítimos interesses e aspirações do povo angolano, mas fragilizado
pela “doença holandesa” do “deus”petróleo que amarra curto o
país a uma dependência crónica, tornou-se ademais incompatível com o grau de
corrupção, a nível interno e a nível dos induzidos relacionamentos
internacionais.
Angola prova assim o “petróleo
enquanto excremento do diabo”, quando no tempo do exercício da administração
republicana de George W. Bush a imagem do petróleo para todo o Golfo da Guiné
era passada como de “petróleo ara o desenvolvimento”, a tal ponto que
facilitou a gestação discreta do laboratório AFRICOM!
Enquanto a “acomodação” se
instalava e o estado angolano adoecia com tumores intestinais, a “acomodação” que
nos termos protagonizados pelo comportamento, a atitude e o carácter da “nova
elite” angolana do após Savimbi se foi tornando pantanosa e imbuída
visceralmente na química da corrupção, agora com a Presidência do General João
Lourenço sofreu uma primeira “pedrada no charco” que tem provocado“ondas
de incómodo”, desde logo nessas mesmas “novas elites” sujeitas a
compressão.
Por incrível que possa parecer
aquelas antigas palavras de ordem em relação à agricultura, ganharam novo vigor
dada a urgência da diversificação económica…
Está-se a sair duma sulfúrica
letargia para uma dinâmica social que começa a inventariar as suas próprias
energias, por que o início do combate à corrupção que se começou a instalar há
mais de 33 anos a esta parte, acelerada desde 2002, começa a sacudir os
adormecidos, os palúdicos e até os que absorveram a mentalidade-padrão
formatada pelos subversivos expedientes de assimilação.
03- O momento é de contração e
dor para o estado angolano que vai minguar com as receitas do Banco Mundial e
do Fundo Monetário Internacional, que vai colocar nas mãos de privados alguns
dos “pesos” que são herança…
Será que o Presidente João
Lourenço, vendo-se livre do atoleiro da terapia neoliberal que levou à “acomodação” da
corrupção com clientela mafiosa própria, não estará a cair noutro atoleiro em
função de dívidas que dificilmente se poderão amortizar?
Estará o povo angolano
suficientemente desperto e motivado para enfrentar os decorrentes desafios?
Não se resumindo a vida à luta
contra a corrupção, quais vão ser as nossas respostas face aos desafios?
Quanto mais não seja, com
saudável consciência crítica, com sentido pedagógico, na trilha duma inevitável
lógica com sentido de vida protagonista duma paz que para o ser se deve abrir à
justiça social, só posso estar com os milhões de “incomodados desta terra”,
começando a agilizar nossas titubeantes pernas nos caminhos do futuro.
04- Se para a corrente de “acomodados”,
o sucessor do Presidente José Eduardo dos Santos era a “cereja em cima do
bolo” que poderia fazer continuar as suas inquinadas projecções, a pesada
herança mercenária e antipatriótica está a tornar o actual Presidente no para
já decisivo prático “incomodado”, ainda que as suas medidas se situam pela
ramagem da árvore que se plantou e cresceu desde 1986!
A incógnita é saber até onde
esse “incómodo” irá, por que se fica pela ramagem, se fica pela poda,
a hegemonia unipolar do império, com seu arsenal “soft power” de
ementas, tem sempre a oportunidade e os recursos de voltar aos propósitos de
sua essência, com outras doses de ingerência e manipulação de que Angola aliás
tem vindo a sofrer.
Passar da ramagem para o tronco e
do tronco para a raiz dessa árvore, regenerando a sua seiva, é um dos grandes
desafios para a década até 2025, quiçá ainda para a década seguinte…
Alinhando o país ao poder da
hegemonia unipolar não haverá capacidade para se chegar à raiz da árvore, por
que nem o capitalismo proteccionsta de Donald Trump conseguiu neutralizar os
falcões reitores do choque e terapia neoliberal instalados pelo capitalismo
financeiro transnacional que se aplicam a nível global, continental, regional e
país a país, Estados Unidos incluídos…
Angola não tem poder, nem
capacidades, nem meios vocacionados para resistir, por que até se está a
arriscar a ser constantemente mobilizada para se moldar!
Da minha parte e no sentido da
purificação da seiva, bato-me por uma doutrina, por uma filosofia e por uma
ideologia patriótica, capaz de possibilitar avançar-se nos parâmetros práticos
e inadiáveis duma geoestratégia para um desenvolvimento sustentável cultora de
vida, de independência, de soberania e de aprofundamento da democracia!
Clarividência em relação aos
processos imperialistas em curso, torna-se essencial para alguma vez se trilhar
esse caminho!
Martinho Júnior - Luanda, 25 de Junho de 2019
Imagem: Campanha da
candidatura de João Lourenço em 2017, sob o “moderado” lema “melhorar
o que está bem e corrigir o que está mal”…
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