sexta-feira, 26 de julho de 2019

Fretilin critica acordo de fronteiras Timor-Austrália por dar muito poder a Camberra


Díli, 23 jul 2019 (Lusa) -- A Fretilin, na oposição em Timor-Leste, disse hoje ter votado contra o tratado de fronteiras com a Austrália por considerar que o documento dá aos australianos recursos timorenses e o poder de deliberar sobre o desenvolvimento do projeto Greater Sunrise.

"Hoje a Fretilin [Frente Revolucionária do Timor Leste Independente] votou contra a resolução sobre o Tratado de Fronteira Marítima porque abre já caminho para partilha de recursos, de forma gratuita, com nosso vizinho. Este tratado entrega também parte da nossa soberania à Austrália com direito para gerir a nossa riqueza, que está dentro do nosso território", explicou Aniceto Guterres Lopes, chefe da bancada da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin).

"São retóricos e contraditórios os que afirmam que com o delinear da fronteira marítima ganhamos a soberania total, porque este mesmo tratado dá poder de decisão à Austrália e dá-lhes também 30% da nossa riqueza no campo de Greater Sunrise", afirmou.

A Fretilin ficou hoje sozinha num voto contra a resolução do tratado permanente de fronteiras com a Austrália, que foi aprovado -- conjuntamente com um pacote legislativo -- por uma ampla maioria de 42 dos 65 deputados.

Repetindo várias das críticas deixadas durante o debate, a Fretilin questiona em particular aspetos relacionados com os poços de Greater Sunrise, geridos por um consórcio maioritariamente controlado pela petrolífera timorense Timor Gap.

"O Tratado estabelece que se o gasoduto vier para Timor-Leste, a partilha será de 30% do Greater Sunrise para a Austrália. E além disso dá poder à Austrália para tomar decisões em conjunto com Timor-Leste sobre como desenvolver o campo do Greater Sunrise", afirmou.

"Simplificando, se a Austrália não aceitar o plano de desenvolvimento, nós não poderemos implementá-lo. Isto significa que entregamos 30% gratuitamente à Austrália, e damos gratuitamente a nossa soberania à Austrália para decidir sobre a nossa riqueza", afirmou.

O partido nota que o tratado estabelece que as decisões sobre o desenvolvimento do poço serão tomadas com base num plano a desenvolver por uma autoridade, que terá dois membros de Timor-Leste e um da Austrália, mas onde, apesar da maioria timorense, as decisões só podem ser tomadas em consenso.

Razões pelas quais, disse, a Fretilin questiona se este é um tratado fronteiriço ou "um tratado de partilha de riqueza com a Austrália", dúvida, que afirmou Lopes, não foi adequadamente esclarecida pelo Governo.

O executivo repetiu durante o debate que parte dos poços do Greater Sunrise residem em águas australianas e que, por isso, há uma necessária partilha de receitas.

O partido respondeu ainda a críticas do Governo ao anterior tratado, notando que foi esse texto que permitiu Timor-Leste arrecadar receitas importantes e, ao mesmo, abrir caminho para o tratado que foi hoje ratificado.

Lopes criticou ainda as declarações das bancadas do Governo sobre o facto do tratado representar a conquista da soberania plena de Timor-Leste, algo que, referiu, não se reflete na partilha de receitas e de decisões com a Austrália.

"Que soberania é estamos de que falamos? Como podemos dizer que a soberania é complete se através deste Tratado entregamos poder para outro país tomar decisões sobre a riqueza do nosso país", questionou.

"A Fretilin não é contra a fronteira marítima. A Fretilin defende a fronteira marítima delineada pela linha mediana. A Fretilin votou contra a partilha de recursos e a entrega da soberania que se encontra incluído neste tratado", afirmou.

Lopes conclui afirmando que em questões como estas "o diálogo é o único caminho" ainda que os deputados das bancadas do Governo "sejam um pouco alérgicos a esta palavra", mostrando-se disponível para "o diálogo com todas as entidades em Timor-Leste de forma a procurar soluções para questões de Estado e pelo povo".

Recorde-se que os deputados aprovaram uma resolução do Governo que ratifica o tratado -- em versões em língua portuguesa e inglesa -- e um conjunto de anexos, incluindo "Ilustração das Fronteiras Marítimas", o "Regime Especial do Greater Sunrise", a "Área do Regime Especial" e as "Disposições Transitórias e Arbitragem".

"O resultado do acordo é consistente com o direito internacional e ambas as Partes consideraram aceitável uma solução equitativa, bem como a criação de uma base estável e duradoura para as atividades petrolíferas na área dos fundos marinhos entre Timor-Leste e a Austrália com benefícios para ambas as partes", refere a resolução de ratificação.

A resolução de ratificação foi aprovada com 42 votos a favor e 23 contra dos deputados da Fretilin, partido do Presidente da República.

ASP // PJA

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