domingo, 25 de agosto de 2019

Europeus divididos sobre acordo com Mercosul


Presidente do Conselho Europeu diz ser difícil imaginar pacto enquanto a Amazónia queima. França e Irlanda também se opõem, enquanto Alemanha e Reino Unido defendem acordo. Mas preocupação com a floresta é consenso.

Os incêndios que devoram a Floresta Amazónica provocaram comoção e declarações de preocupação por parte de líderes europeus. Chefes de Estado e governo, contudo, estão divididos sobre até que ponto a crise deve influenciar o acordo comercial entre a União Europeia (UE) e o Mercosul.

A questão amazónica será um dos temas centrais da cúpula do G7, que teve início neste sábado (24/08) na cidade de Biarritz, na costa sudoeste da França. Até o fim da cimeira, na segunda-feira, o anfitrião Emmanuel Macron, presidente francês, deverá tentar arrancar resultados concretos em relação à Amazónia dos colegas presentes, muitos deles líderes europeus.

Neste sábado, Macron lançou um apelo a todas as potências mundiais para que ajudem o Brasil e outros países da América do Sul a combater os incêndios na Floresta Amazónica, que chamou de "nosso bem comum". "Devemos responder de maneira concreta ao apelo das florestas que queimam agora na Amazónia", disse o francês em discurso transmitido na televisão.


Antes da cúpula, o governo de Macron deixou claro que se opõe à ratificação do acordo de livre-comércio com o bloco sul-americano, afirmando que Jair Bolsonaro mentiu ao assumir compromissos em defesa do meio ambiente, dados como condição para o pacto.

"Dada a atitude do Brasil nas últimas semanas, o presidente da República [francesa] só pode constatar que o presidente Bolsonaro mentiu para ele na cúpula [do G20] em Osaka. Nessas circunstâncias, a França opõe-se ao acordo com o Mercosul", diz uma nota do governo francês, emitida na sexta-feira.

O acordo UE-Mercosul foi fechado em junho, à época da cúpula do G20 no Japão, após 20 anos de negociações. Macron afirmara na ocasião que o fechamento só foi bem-sucedido porque Bolsonaro deu garantias de preservação do meio ambiente brasileiro. Os parlamentos de todos os países-membros do bloco europeu ainda precisam ratificar o pacto.

Na linha de Macron, o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, afirmou neste sábado que considera difícil imaginar que a União Europeia ratifique o acordo com o Mercosul enquanto o Brasil não detém os incêndios florestais na Amazónia.

"A Floresta Amazónica em chamas tornou-se outro sinal deprimente dos nossos tempos. É claro que apoiamos o acordo UE-Mercosul, que também se trata de proteger o clima e o meio ambiente, mas é difícil imaginar um processo harmonioso de ratificação pelos países europeus enquanto o governo brasileiro permitir a destruição dos pulmões verdes do Planeta Terra", disse Tusk em nota.

Também em Biarritz para a cúpula do G7, o presidente do Conselho Europeu acrescentou que a UE está "pronta para oferecer ajuda financeira para combater os incêndios".

O governo da Irlanda, país-membro do bloco europeu, mas não do G7, foi outro a afirmar que não deve ratificar o acordo devido à falta de comprometimento dos brasileiros em "honrar seus compromissos ambientais".

A posição, contudo, não é a mesma de outras nações europeias, como Alemanha e Reino Unido, que compõem o Grupo dos Sete ao lado de Canadá, Estados Unidos, França, Itália e Japão.

A chanceler federal alemã, Angela Merkel, afirmou neste sábado que compartilha da preocupação de Macron em relação à Amazónia, mas declarou que vetar o acordo comercial com o Mercosul não contribuirá para combater a destruição das florestas.

Em nota, o governo alemão disse que o pacto de livre-comércio "inclui um capítulo ambicioso sobre sustentabilidade com regras vinculantes sobre proteção do clima", sob o qual ambas as partes do acordo se comprometeram a implementar o Acordo de Paris sobre o clima.

"Portanto, a não conclusão [do acordo] não é, do nosso ponto de vista, a resposta apropriada ao que está acontecendo atualmente no Brasil", acrescentou o gabinete de Merkel.

Em mensagem de vídeo neste sábado, a chanceler federal deixou claro, contudo, que os líderes do G7 "não podem se silenciar" diante das queimadas amazónicas, e prometeu trabalhar para que tudo seja feito para combater os incêndios. "Emmanuel Macron está certo – nossa casa está queimando, e não podemos ficar em silêncio", afirmou.

Por sua vez, o primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, foi mais duro em suas declarações ao rebater os líderes europeus que sugeriram que a destruição na Amazónia deve afetar o acordo comercial com a região.

"Há todo tipo de gente que aceita qualquer desculpa para interferir no comércio e para frustrar acordos comerciais, e eu não quero ver isso", disse o chefe de governo britânico neste sábado, ao chegar a Biarritz para a cúpula do G7.

Ele concordou, contudo, que a cimeira na cidade francesa precisa discutir a situação das queimadas, que chamou de "tragédia do que a humanidade está infligindo ao mundo natural". Johnson ainda ofereceu a ajuda do Reino Unido para combater os incêndios.

Bolsonaro vem trocando farpas com líderes internacionais sobre a questão ambiental há tempos. Mais recentemente, reclamou das declarações de Macron sobre a Amazónia, acusando-o de "mentalidade colonialista" e de "instrumentalizar uma questão interna do Brasil". Em pronunciamento na sexta-feira, o presidente afirmou que os incêndios não podem servir de pretexto para retaliações internacionais.

Deutsche Welle | EK/afp/ap/dpa/ots

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