Martinho Júnior, Luanda
Há dois anos publiquei esta
intervenção na minha página no Facebook (e em outras de vários grupos) e, pela
sua acuidade, parece-me bom relembrá-la hoje, quando cada vez mais se torna
evidente que para a sobrevivência da espécie humana e o respeito que a Mãe
Terra de todos merece, urge construir todas as pontes umbilicais em benefício
da civilização e da vida!
Em Angola está-se não só longe de
assim proceder, como também as interpretações egoístas e elitistas em relação à
natureza obstruem, ou chegam mesmo a fazer esquecer, a necessidade de educação
de todo o povo angolano no sentido de se mobilizar para cuidar de todo o espaço
nacional, dos seus tão diversificados ambientes e, sobretudo, da água interior,
por que água é vida, garante de biodiversidade e garante da sobrevivência do
próprio homem, cujo corpo tem mais de 60% de OH2!
O avanço para norte dos desertos
do Kalahári e do Namibe é um dos fenómenos que estão já a afectar a vida em
Angola em toda a periferia sul e, com a diminuição dos caudais em muitos cursos
de água, a começar a ameaçar a região central das grandes nascentes, pelo que
essas tão necessárias pontes umbilicais em benefício da civilização e da vida,
são um premente assunto que já de há muito deveria ter sido cuidadosa e
massivamente abordado.
Há preocupações visíveis do
actual Presidente da República pelas periferias norte, leste e sul, todavia,
apesar dos planos de aproveitamento dos rios para a construção das tão
necessárias barragens (em especial o Cuanza), barragens hidroeléctricas
produtoras de energias limpas, as questões ambientais não só não revertem para
as prioridades em termos do respeito pela sustentabilidade a muito longo prazo,
como o relacionamento dos factores físico-geográfico-ambientais com os factores
humanos, continua a não estar na ordem do dia influenciando o carácter do
poder, do estado e de toda a sociedade!
Isso acontece por que o
capitalismo neoliberal deseduca o próprio estado angolano, absorvido no que dá
lucro imediato e é estendido pelos ventos de elitismo que sopram movendo
êxtases e miragens turísticas a partir do Botswana, sob a directa influência do “lobby” dos
minerais e do capitalismo transnacional que lhe é “genético”!...
Esse elitismo aproveita
oportunisticamente para absorver em seu benefício todo o possível conhecimento
científico sobre a imensa região que já domina para além das kimberlites responsáveis
por colocar o Botswana no lugar de primeiro produtor mundial de diamantes!
A mudança de paradigma deveria
ter sido para ontem e, cada ano que passa, as pontes umbilicais dos angolanos
para com o respeito pela natureza do seu próprio país, correm o risco de ser
pontes que irão correr atrás dos prejuízos como sobre brasas já está a
acontecer a sul, por que não havendo cultura científica, nem educação e
mobilização de todo o povo angolano no sentido duma geostratégia para um
desenvolvimento sustentável, é o futuro que está em risco e as futuras
gerações!
Aqueles que lutaram no movimento
de libertação pelo direito à vida independente e soberana de Angola, clamam
hoje pela sua sequência, não só pelo seguro direito à vida dos humanos, mas
pelo equacionar dos garantes de sustentabilidade e segurança a muito longo
prazo, por que para que o homem seja feliz em Angola, terá de ser muito mais
responsável e consciente em relação à água interior de todo o seu espaço
nacional e regional, sobretudo em relação ao fenómeno imprescindível da região
central das grandes nascentes!
Que se respeite o caminho de
civilização que está aberto para todo o povo angolano e que todas as pontes
umbilicais que se construírem sejam nesse exclusivo sentido!
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Para cada um de nós, seres
humanos, houve um dia a disponibilidade secreta duma ponte-dádiva, original,
uma ponte umbilical, num ambiente desconhecido, incógnito, misto de trevas, de
plácidas águas e veludo, quando a vida nada mais era senão um micro embrião:
uma nave cósmica em seu bojo, com seu sangue, com seu pulsar, com seu leve
ardor intermitente, concedia então o tudo ou nada ao projecto fluido dum novo
ser!
Não o interpretávamos, nem o
sabíamos enquanto tal: estávamos na inocência absoluta, como na absoluta
dependência, como na ignorância completa que momentos antes havia apenas
deixado de ser apagão!
Pouco a pouco contudo, sensível e
emocionalmente, essa ponte umbilical, abria-se à primeira impressão
consistente, para lá dos próprios sentidos e limites insipientes e nos conduzia
em pleno plasma, no trago das águas, até ao outro lado do desconhecido, à mais
inusitada das percepções que um micro embrião poderia a quente deter e começar
a decifrar: a dialética na primeira das relações, a relação entre duas margens
com a nossa própria mãe!
Desde então, ficou gravado no
mais profundo do subconsciente humano, a incontornável qualidade vital da ponte
entre o micro embrião e nossa mãe, da mãe de cada um, da mãe que concedeu ao
homem o impulso inusitadamente contraditório de sua própria vida, ainda que ele
intrinsecamente mal se apercebesse enquanto frágil projecto!...
Foi assim que a mãe nos gravitou
até à força latente de sermos após o parto, com a carga de informação genética
e o transe do nascimento, para com os outros, para com o presente, para com o
passado e para com os sonhos, a plataforma, inscrita sete mil milhões de vezes,
reproduzida e multiplicada, de prodigiosos construtores de pontes…
Em muitos casos, os artifícios
acumulados procuraram subverter a vida, de tão inesperada e estranha que ela é,
com pontes que são apenas meros reflexos subvertidos, ou cópias degradadas da
original ponte vital e genética.
Saibamos racional e maduramente
interpretar a densidade dessa dádiva tornada lição e elevá-la por sua vez a uma
ponte ainda mais abrangente, de civilização, respeitando com toda a humildade a
arquitectura e a engenharia, dialética e vital, da Mãe Terra… e dos seus
múltiplos cordões umbilicais, disponíveis em outras incontáveis pontes!
Sejamos ainda mais humildes
enquanto transitórios sonhadores construtores de pontes, colectores de legados
e sonhos intemporais e de margens: estamos singularmente em breve passagem num
planeta azul perdido no universo, feitos de seus próprios materiais, de suas
químicas e dialéticas condições…
A transitoriedade da vida
conforme ela é misteriosamente sondada, é num planeta que por seu turno, não
passa de outro frágil micro embrião num plasma incontinente do que supostamente
será, numa escala que ao homem é impossível avaliar (quão minúsculos e
ignorantes somos, ainda que com todo o saber acumulado), a quase impenetrável
nave do espaço sideral, ela própria com suas tão insondáveis pontes e
invisíveis cordões umbilicais e ainda mais vaporosas margens! -- Martinho Júnior - Luanda, 11 de Setembro de 2017
Martinho Júnior -- Luanda, 14 de Setembro de 2019
Imagens:
01- A primeira ponte umbilical de
cada ser humano, garante de gestação e crescimento até ao nascer;
02- Queimadas, uma ruptura na
ponte genética e umbilical entre o homem e a natureza, prejudicial para os
fenómenos climático-ambientais; não há argumento algum que possa justificar a
falta de educação e mobilização do estado e de todo o povo angolano no sentido
de fazer a todo o transe diminuir o carbono na atmosfera do seu próprio país e
cuidar dos rios voadores que são as nuvens, das chuvas emanadas delas e dos
fenómenos que dão origem à região central das grandes nascentes;
03- O homem fora duma estação
espacial, liga-se a ela pela ponte umbilical que lhe garante vida nas condições
extraterrestres;
04- Quadro comparativo do número
de queimadas por país: Angola é, de longe, o país que tem produzido mais
queimadas no mundo e o estado angolano, ao invés de educar-se e mobilizar-se,
educando e nobilizando seu próprio povo, ilude-se e aliena-se com as propostas
de conceitos elitistas sobre o ambiente e a natureza que sopram do Botswana, só
por que elas dão lucro e brilham como os diamantes;
05- A região central das grandes
nascentes é, para a vida em Angola, a muito longo prazo, um garante de
sustentabilidade, como é a água componente em mais de 60% do corpo humano,
garante equação e condição de sua própria vida...
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