quarta-feira, 11 de setembro de 2019

Antigo diretor da "secreta militar" angolana começou a ser julgado


Previsto para começar na semana passada, teve início, em Luanda, o julgamento do antigo chefe do Serviço de Inteligência e Segurança Militar António José Maria.

O ex-chefe do Serviço de Inteligência e de Segurança Militar, António José Maria, conhecido por "Zé Maria", começou a ser julgado esta terç-feira (10.09.), em Luanda, pelo Supremo Tribunal Militar angolano, por crimes de insubordinação e extravio de documento que contém informações secretas.

Segundo a acusação, o réu general "Zé Maria", em novembro de 2017, quando tomou conhecimento da sua exoneração, recusou participar na cerimónia de entrega da pasta do cargo que ocupava e levou consigo os arquivos afirmando que não era subordinado de João Lourenço (Presidente de Angola) e só cumpria ordens de José Eduardo dos Santos, o antigo chefe de Estado.

A sessão desta terça-feira que está a decorrer no Estado Maior General das Forças Armadas Angolanas, foi marcada com a leitura de pronúncia, acusação e contestação, tendo sido horas depois suspensa para ser retomada na quinta-feira (12.09.) com interrogatórios ao arguido.

Prisão domiciliária desde Junho

António José Maria, um dos homens fortes na governação do antigo Presidente José Eduardo dos Santos, está em prisão domiciliária desde o mês de junho.

No despacho de pronúncia lida por um oficial de justiça, consta que o general angolano na reserva, ordenou o então chefe dos transportes do Serviço de Inteligência e Segurança Militar que retirasse do escritório daquele órgão do Estado, os documentos e que guardasse num local indicado alegadamente pelo réu.

Contactado pelo atual chefe dos Serviços de Inteligência e Segurança do Estado (SINSE), o general Fernando Garcia Miala, que foi orientado pelo Presidente da República, João Lourenço a exigir a devolução do património, António José Maria recusou ir às instalações do SINSE e marcou um encontro num dos restaurantes situados na Ilha de Luanda.

"Uma vez transmitida a ordem do Comandante em chefe o réu negou-se a cumpri-la e de forma peremptória disse que só faria a devolução se lhe fosse ordenado pelo Presidente José Eduardo dos Santos, por ser ele que lhe confiara tais documentos e quem os quisesse de volta que o contactasse, referindo-se ao ex-Presidente José Eduardo dos Santos".

Documentos recuperados por ordem do MP

A atitude do arguido, deu lugar ao presente processo-crime, e os documentos foram recuperados no decorrer do processo, por ordem do Ministério Público, mediante um mandato de revista, busca e apreensão.

Por seu turno, Sérgio Raimundo, advogado do general "Zé Maria" apontou durante o momento da contestação vários casos que considerou de irregularidades no processo.

"Não se coloca a questão de saber se contêm ou não informações de caráter militar que se constituem segredo militar, uma vez que, diz a própria acusação no seu artigo 3.º e retomado pela pronúncia no parágrafo terceiro, que o réu, general António Maria, cito, ordenou o senhor coronel Eurico Manuel, então chefe dos transportes do Serviço de Inteligência e de Segurança Militar que fosse ao serviço e retirasse os documentos constantes nos autos, e os guardasse num local alegadamente por ele indicado. Logo, reconhece a acusação, que os documentos não perderam, e nem se quer foram extraviados, já que só seriam assim considerados extraviados se o arguido não pudesse apresentá-los, que não foi o caso, pois extraviado significa desaparecer".

Ato de busca e apreensão "forjado"

O advogado considerou de "forjado" o ato de busca e apreensão dos mesmos documentos, efetuados na sede da Fundação Eduardo dos Santos (FESA), propriedade do ex-Presidente da República, onde também trabalha o arguido.

"Constatamos que existiu um ato de busca e apreensão forjados que confirma que não foram os documentos em referência, perdidos, nem extraviados, pois reafirmamos aqui e agora, forjados, porque o mesmo auto, embora mencione o nome do mandatário judicial do arguido Alberto Sérgio Raimundo, como tendo presenciado a diligência, nunca este foi assinado e nem exibido e entregue uma cópia ao arguido e ao seu defensor como manda o preceito do artigo 16.º da lei nº 2/14 de 19 de fevereiro, Lei sobre revistas, buscas e apreensões também aqui aplicada na justiça penal militar por força do artigo 34.º da lei nº 5/24 de 11 de fevereiro, que diz claramente o ato de apreensão, cito, é assinado pela autoridade presidiu a diligência e os demais que estiverem presentes”.

Entre os documentos de caráter sigiloso retirados e transportados numa carrinha, constam igualmente, processos sobre a histórica batalha do Kuito Cuanavale. O ex-Presidente da República, José Eduardo dos Santos está entre os declarantes do processo.

Borralho Ndomba (Luanda) | Deutsche Welle

Sem comentários:

Mais lidas da semana