terça-feira, 3 de setembro de 2019

Timor-Leste | Fotografia e artesanato em exposição para celebrar independência


António Sampaio, da agência Lusa

Díli, 03 set 2019 (Lusa) -- Pequenas portas de madeira, fabricadas por artesãos timorenses, por trás das quais se escondem fotografias que retratam a vida de quem as cria, em vários pontos de Timor-Leste, são o elemento central de uma exposição inaugurada em Díli.

A exposição é um diálogo entre criação artesanal - em madeira e tecido, com os tradicionais tais -- e imagens de Bernardino Soares, um dos nomes mais sonantes da fotografia artística timorense, já com vários projetos completados.

Estátuas, máscaras, peças esculpidas em madeira de artesãos do enclave de Oecusse, surgem aqui intercaladas com fotografias gigantes, que mostram artesãos a trabalhar ou momentos do quotidiano da vida mais rudimentar, mais antiga e mais tradicional.

A exposição, que se insere no programa da comemoração dos 20 anos do referendo em que os timorenses escolheram a independência é iniciativa da empresa Things & Stories -- um dos principais motores de artesanato em Timor-Leste, com colaboração com 800 artesãos que produzem produtos tradicionais e modernos para várias lojas em Díli.

"Queríamos reunir a parte tradicional que está disponível nas lojas, mas que as pessoas não veem desta forma, mas também o lado contemporâneo, com os jovens artistas timorenses como o Bernardino Soares. Um projeto que juntasse as duas partes, a tradição e uma visão contemporâneo de um jovem timorense através de fotografia", diz à Lusa João Ferro, da Things & Stories.

"Trabalhamos com os artesãos para, respeitando a tradição, encontrar formas de apelar aos mercados e, com os mercados, para abrir portas e canais que permitam que os artesãos vendam os seus produtos e aumentem o seu rendimento", explicou.

"Kik mas Boot", joga com palavras que, além de serem 'pequeno' e 'grande' em tétum, acabaram por assumir em Timor-Leste outras conotações, referindo-se a gerações mais jovens ou mais idosas, ao povo e aos grandes líderes nacionais ou até ao sentido do individual e do grupo.

Mas aqui KIK é também uma sigla, a de Kultura, Identidade e Korajen - a grafia em tétum das mesmas palavras em português -- um retrato contemporâneo de misturar o sagrado, o antigo, e a modernidade de um país ainda jovem.

Bernardino Soares explica que o projeto foi uma grande lição, uma oportunidade de mergulhar no processo de fabrico, no que cada peça representa.

"Sempre começo a fotografar com uma pergunta e a resposta vem durante o processo. E neste caso, comecei por perguntar porque é que estas peças, estas janelas, os tais, são tão caros", diz à Lusa.

"E a resposta é de tem a ver com o processo. Fazer um tais, por exemplo, sacrificamos o nosso tempo, há que fazer a coloração. Há uma história. Não se compra um objeto só, compra-se a tradição, o ritual, o lulik (sagrado) que vem com o próprio tais", explica.

Num momento de celebração da independência, o fotógrafo diz que muita gente sabe quem são os veteranos da luta e os líderes do país, mas que esta exposição quer "celebrar a identidade cultural e a coragem dos timorenses".

"Os artesãos são os guardiães da nossa identidade e muitas vezes as pessoas esquecem-se disso. Esta é uma oportunidade de falar sobre quem está por trás destes panos, destas estátuas, destas peças", diz.

"Tradução e ritual foram uma grande parte da luta pela independência. Mas hoje muitos falam de política, mas esquecem-se de que estes artesãos também são heróis, preservaram, protegeram, sacrificaram-se para preservar e dar continuidade a esta tradição", afirma.

Joana Bobotano, uma das artesãs envolvidas no projeto, trouxe a Díli exemplos do tais da sua aldeia, Bobometo, próximo de Oesilo, no enclave de Oecusse-Ambeno.
  
Obras que, explica à Lusa, estão a ajudar a empoderar as mulheres locais, a fortalecer a economia de muitas famílias e também a mostrar um pouco da tradição timorense a um público nacional e internacional.

A exposição é o arranque de um projeto, em parceria com a USAid do qual sairão um livro de fotografia e vários filmes documentais sobre o processo de criação artesanal em Timor-Leste, entre outros projetos.

ASP // VM

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