O Presidente João Lourenço
prometeu melhorar as condições dos doentes angolanos com junta médica em
Portugal. Mas de novembro até hoje nada melhorou, pelo contrário, a situação
degradou-se.
Dez meses depois da visita
oficial do Presidente angolano João Lourenço, as condições de habitabilidade e
a qualidade da alimentação nas pensões que acolhem os pacientes não melhoraram.
Há mais doentes a chegarem a
Lisboa, mas também há casos de pessoas desalojadas por falta de pagamento, em
consequência dos atrasos nas transferências de dinheiro de Angola para
Portugal. O setor da saúde da Embaixada de Angola reuniu-se esta semana com a
associação que representa os doentes para mais uma tentativa em busca de
soluções.
Condições precárias
Um dos doentes é José Maria
Paixão Fonseca, 62 anos, tenente coronel das Forças Armadas, que vive numa das
quatro pensões em Lisboa que albergam angolanos que têm recebido cuidados
médicos.
"Sim, sim, as coisas estão
cada vez mais a piorar. A questão da alimentação, que é primordial, nunca foi
boa. Aqui, por exemplo, não tenho alimentação. Eu devia pagar a minha
alimentação por mim mesmo. Coisa que eu não posso fazer porque os senhores do
Banco de Poupança e Crédito (BPC) em Luanda trancaram a minha conta. Então, não
consigo fazer transferência porque não tenho como tirar o dinheiro da conta”,
relatou Paixão Fonseca.
Há seis anos em Portugal, este
paciente angolano que faz hemodialise, também lamenta o tratamento inadequado
que os doentes recebem do setor da saúde da Embaixada de Angola, sob a
responsabilidade de Rosa de Almeida.
"Há uma coisa que eu não
entendo. Como é que a senhora chefe do setor, para além de nós não sabermos
quanto é que ela recebe aqui, vem pagar estes hotéis muito caros onde a vida
praticamente é uma desgraça; é uma miséria estas pensões, não têm ar
condicionado conforme pode ver. E dizem que nós não podemos reivindicar porque
as nossas casas em Angola não têm ar condicionado. Não posso reclamar uma boa
sopa porque a sopa que se dá aqui é melhor que a sopa que eu teria na minha
casa?”, reclamou José Maria Paixão Fonseca.
A estas interrogações e
inquietações juntam-se outras sobre a qualidade da alimentação, que, segundo os
doentes, é péssima. Há casos de doentes que sofrem intimidação da Embaixada por
exporem a situação à imprensa, soube a DW África de fonte segura. A nossa fonte
fala igualmente de doentes que estão a ser despejados das casas arrendadas.
"Porque o tempo que levam
sem pagar começa a ser preocupante para os proprietários. Os proprietários não
aceitam e os doentes são obrigados a procurar espaços mais pequenos, um quarto
ou uma garagem, para poderem sobreviver”, explicou o tenente coronel das Forças
Armadas.
Gabriel Chimuco, presidente da
Associação de Apoio aos Doentes Angolanos em Portugal foi quem expôs a situação
dos pacientes ao Presidente João Lourenço, quando este visitou Portugal em
novembro de 2018. Confirma que de lá até então, não houve melhorias e a
situação degradou-se.
"As condições não são boas.
O que aflige neste momento a comunidade de doentes em Portugal é que vai fazer
agora cinco meses que os doentes não recebem os seus subsídios de alimentação e
de alojamento. E isto está a trazer um grande constrangimento aos doentes”,
expôs Chimoco.
Dificuldades com as
transferências
Na última terça-feira (10.09.), a
associação esteve reunida no Consulado da Embaixada de Angola, com a chefe do
setor de Saúde da Junta Nacional de Saúde em Portugal, Rosa de Almeida, para
expôr as preocupações dos doentes. Contatada pela DW África, a responsável
disse que não está autorizada a prestar declarações aos jornalistas e que iria
reunir-se esta quinta-feira (12.09.) com o embaixador de Angola em Lisboa para
analisar o caso.
Entretanto, no encontro desta
terça-feira (12.09.) com a associação encabeçada por Gabriel Chimuco foi dito
que o problema está na dificuldade do Governo angolano em transferir dinheiro
para Portugal.
"O próprio setor tem estado
a fazer demarche junto ao presidente da Junta Nacional, Augusto Lourenço, e
junto à ministra da Saúde, Sílvia Lutucuta que, até o momento, não tem dado
resposta ao que se está a passar aqui em Lisboa, porque há um atraso de
pagamentos não só dos subsídios como das pensões onde estão alojados os doentes”
afirmou Gabriel Chimuco.
Acontece que, face a isso, o
proprietário da pensão, onde está a maior parte dos doentes evacuados, cortou a
última refeição do dia. "Neste momento, os doentes têm apenas uma sopa
muito mal confecionada como jantar”, nota Gabriel Chimuco. A situação é preocupante
para doentes com patologias crónicas complexas e gravosas, doentes de foro
oncológico, para insuficientes renais crónicos e transplantados, que fazem uma
medicação "muito pesada” e que precisam de ter uma dieta regular e
adequada.
Plano para novo espaço
Chimuco lembra a proposta já
apresentada ao Executivo angolano para a aquisição ou construção de um edifício
"com um espaço maior” para alojamento dos doentes evacuados de Angola.
"A demanda é cada vez maior.
Todos os dias chegam doentes a Lisboa e não há sítios para colocar estes
doentes, que subiu de 400 para os 600” ,
disse, considerando a situação insustentável.
Para o dirigente da associação,
"não faz sentido” o Estado estar a pagar a estadia de doentes de longa
duração em pensões que custam cerca de 2300 euros mensais. "Este doente
custaria menos de 50 por cento se estivesse alojado numa casa arrenda",
exemplifica.
"Provavelmente o Presidente
da República não terá compreendido o fundo da questão”, recordou Chimuco,
salientando que há cada vez mais doentes a virem para Portugal porque é crítico
o setor da saúde em Angola, onde não existem condições técnicas e medicamentos
para serem devidamente tratados.
Se as promessas não forem cumpridas,
os doentes ameaçam sair à rua, em Lisboa, em forma de protesto, de acordo com o
teor de uma Carta Aberta endereçada à ministra da Saúde.
João Carlos | Deutsche Welle
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