Decisão sobre extradição de
Manuel Chang está longe, alerta especialista em direito internacional. Será
preciso esgotar as alternativas ao nível dos tribunais antes que ministro da
Justiça sul-africano bata o martelo.
O Tribunal Superior de Gauteng,
em Joanesburgo, rejeitou
nesta quarta-feira (11.12) o pedido de Moçambique para que uma
instância superior de Justiça mantenha a extradição do ex-ministro das
Finanças, Manuel Chang, para o seu país. Mas os advogados de Moçambique
anunciaram de imediato que vão recorrer da decisão junto do Tribunal Supremo
de Recurso sul-africano.
Há, entretanto, aspetos polémicos
na interpretação de lei. Conversámos com Andre Thomashausen, académico e
especialista em direito internacional, sobre os contornos do caso e sobre o que
vem a seguir.
DW África: Com a recusa do pedido
de Moçambique para que o Conselho Constitucional mantenha a extradição de Chang
para Moçambique o que se seguiria?
Andre Thomashausen (AT): Vai
haver mais demoras. O processo na África do Sul é um pouco diferente do
processo noutros países, no sentido em que, se alguém quer interpor um recurso,
como a decisão do tribunal, necessita da autorização desse tribunal. E é essa
autorização que foi hoje recusada. E contra essa recusa do tribunal de primeira
instância existe um outro processo e um outro recurso ao Supremo Tribunal de
Justiça, e isso poderá atrasar o processo mais uns cinco ou seis meses. A
defesa de Chang, os advogados Mabunda, já indicaram que iriam utilizar esse
último recurso.
DW África: Os advogados de
Moçambique neste caso apresentam um problema que tem a ver com a interpretação
do artigo 4 do protocolo da SADC, sobre a extradição. E entendem que o
Tribunal Supremo de Recurso dará uma leitura diferente da que é feita pelo Tribunal
que tomou a decisão de hoje. Poderia clarificar-nos isso?
AT: Temos aqui duas leis que
estão um pouco em concorrência. Temos o acordo de extradição com os EUA, que já
data de 2002, e temos um protocolo muito mais recente da SADC sobre a
extradição na região. E, como o pedido dos EUA foi feito antes do pedido de Moçambique e
é regido pelo acordo de extradição entre a África do Sul e os EUA, é esse que
vai prevalecer. É uma regra muito geral em qualquer forma de Direito, uma coisa
que se faz posteriormente a outra, não pode invalidar aquilo que já se fez.
Quer dizer, quem compra um carro não pode deixar de pagar por esse carro só
porque resolve comprar um outro carro. Assim, a África do Sul está vinculada
aos termos do acordo de extradição com os EUA e só na medida em que esses terão
sido satisfeitos é que se pode olhar para o protocolo da SADC.
É uma regra de interpretação,
talvez um pouco complexa, mas é a regra que se aplica em direito internacional
e é bem possível que os advogados que vão agir por conta de Moçambique, que não
são especiaistas nesta matéria, não tenham entendido bem esse pormenor. Eu
penso que não se trata de aplicar corretamente a lei, trata-se simplesmente de
arranjar maneiras para atrasar ainda mais a extradição de Chang para os EUA com
alguma esperança e expetativa de que o processo nos EUA poderia acabar sem o
Chang, e então o caso Chang talvez ficar sem interesse, mesmo para os EUA. É um
jogo arriscado.
DW África: Um outro argumento
apresentado pela defesa de Moçambique é de que se trata de um caso inédito o
facto de o atual ministro da Justiça da África do Sul, Ronald Lamola, ter
invalidado a decisão do seu antecessor. Haveria a possibilidade de questões
internas sul-africanas afetarem as decisões tomadas neste caso?
AT: Não, também não
vejo força nesse argumento, porque isso acontece em qualquer parte do
mundo e muito frequentemente, incluive em Moçambique, que um Governo invalide
uma decisão anterior. Claro, em certos casos isso pode dar direito a um recurso
e pode até dar direito a uma indemnização - se, por exemplo, uma administração
autorizou a construção de uma habitação e posteriormente resolve que não, que
essa habitação não pode ser construída de uma certa forma e revoga a decisão
anterior. Isso pode acontecer.
Nádia Issufo | Deutsche Welle
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