A crise entre os Estados Unidos e
o Irão desenvolve-se desde a decisão do Presidente americano, Donald Trump, de
executar, no Iraque, um ataque por meio de um veículo aéreo não-tripulado (drone)
que matou o general iraniano Qasem Soleimani, no dia 3 de janeiro de 2020.
Soleimani era comandante da Força Quds, uma divisão do Exército iraniano
responsável pela condução de
ações militares extraterritoriais e operações clandestinas. Trump aprovou a operação de eliminação de Soleimani após
receber dados dos órgãos de inteligência estadunidenses que indicavam múltiplas ameaças vindas do Irão a americanos
no Oriente Médio. Como forma de retaliação, Teerão lançou dezenas de mísseis contra bases americanas no
Iraque, no dia 7 de janeiro de 2020.
Em mandarim, a palavra “crise” (wēijī)
(危机), é composta pelo ideograma “wēi”, que
significa “perigo”, e “jī”, que compõe a palavra “jīhuì” (机会), que significa “oportunidade”. Do mesmo modo, a
China tem vislumbrado oportunidades na atual contenda entre os dois países,
pois Pequim possui fortes laços com Teerão e realiza regularmente exercícios militares trilaterais com a
nação persa e a Rússia. Após o ataque que matou Soleimani, o Ministro chinês de
Negócios Estrangeiros, Wang Yi, condenou “o ato de aventurismo militar dos Estados
Unidos, que vai contra as normas básicas que governam as relações
internacionais e que agravará as tensões e a turbulência na região”. Segundo o governo chinês, Teerão espera que “a China
possa exercer um papel importante na prevenção da escalada das tensões regionais”.
Assim, o eliminação do general iraniano possui o potencial de não apenas fornecer a Pequim um papel de manter a
estabilidade no Oriente Médio, mas também de aumentar a sua influência na região, onde muitos
países consideram Washington como um ator crescentemente
imprevisível.
Desse modo, a política externa
chinesa, que enfatiza, sobretudo, o desenvolvimento e o comércio, torna-se cada
vez mais atraente para as nações da região, sejam elas democráticas ou não. Nos
últimos anos, a China tomou o lugar dos Estados Unidos como o maior doador financeiro para os países em
desenvolvimento e celebrou grandes acordos comerciais através da Ásia, do
Oriente Médio e da África, como parte do megaprojeto internacional de
infraestrutura do presidente Xi Jinping, a Iniciativa do Cinturão e Rota.
De acordo
com os analistas Lindsey Ford e Max Hill, do Asia Society Policy
Institute, de Nova York, “embora a expansão da presença da China no Oriente
Médio ocorra por cálculos econômicos, ela oferece oportunidades estratégicas
para Pequim”. Para os autores, “a ênfase da China nos princípios de
não-interferência, desenvolvimento econômico liderado pelo Estado e manutenção
da estabilidade regional, ressoa entre muitos líderes não-democráticos do
Oriente Médio, permitindo que a China promova o seu modelo alternativo de
liderança de grande potência”.
Os chineses têm sido capazes de manter laços com aliados tradicionais na
região, como o Irã e a Síria, enquanto incrementa suas relações com rivais
desses países, como a Arábia Saudita, Israel e os Emirados Árabes Unidos.
Jonathan Fulton, do Atlantic Council, de Washington, observa que “os interesses de Pequim se baseiam em um
Oriente Médio estável e já considera há muito tempo que isso, eventualmente,
requererá alguma forma de participação chinesa nas questões de segurança da
região”. Fulton também afirma que “a China não é um país revisionista”, e indica que o Estado asiático “não quer remodelar o
Oriente Médio e nem tomar para si a responsabilidade de manter a sua segurança,
mas deseja uma região previsível e estável, o quanto for possível, na qual
possa desenvolver atividades comerciais e investir”.O analista aponta que o eliminação de Soleimani por Washington, “no
curto prazo, aumentará o custo dos Estados Unidos fazerem negócios na região e
colocará muitas pessoas em risco, mas, no longo prazo, pode aumentar o poder e
a influência da China no Oriente Médio, enquanto o país assume maiores
responsabilidades na preservação de seus interesses regionais”.
Desde o fim da Guerra Fria, os
Estados Unidos são a principal potência, não apenas no Oriente Médio, mas do
mundo. À medida que a China desafia cada vez mais a hegemonia americana, o
Oriente Médio vai emergir como uma das principais arenas dessa rivalidade e, ao
decidir eliminar Soleimani, o governo americano pode ter facilitado para Pequim
contestar o poder de Washington na região nos próximos anos.
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