quarta-feira, 22 de janeiro de 2020

Sindika | Mundo da arte recusa virar as costas ao marido de Isabel dos Santos



Curadores e negociantes de arte mantêm apoio ao empresário e colecionador de arte, o congolês Sindika Dokolo, marido de Isabel dos Santos.

"Que eu saiba, Sindika não era traficante de armas nem de droga. Que eu saiba, ele não geria empresas nacionais [de Angola]. Até que surja algo de novo, o que retenho sobre ele é que é alguém que faz avançar a arte contemporânea em África e por isso continuo a ter todo o respeito pela sua atividade". As palavras são do curador de arte Simon Njami, que durante muitos anos foi conselheiro de Sindika Dokolo, que, tal como outros agentes do mundo da arte ouvidos pelo Le Monde recusam virar as costas ao empresário congolês que está envolvido no caso Luanda Leakes, juntamente com a mulher, Isabel dos Santos.

Uma investigação de dezenas de meios de comunicação internacionais revelou, este domingo, 19 de janeiro, informações mostram o esquema que permitiu a ascensão de Isabel dos Santos, filha do ex-presidente angolano José Eduardo dos Santos, que durante 38 anos liderou os destinos de Angola.

Apesar das suspeitas de desvio de dinheiros públicos que recai sobre o casal após as revelações feitas pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação, do qual o Le Monde faz parte, o mundo da arte não vira as costas a Sindika Dokolo, continuando a valorizar o seu papel na divulgação e promoção da arte africana.

Fundadora da revista Something We Africanians Got, na qual Dokolo participou num número editado em 2016, a franco-marfinense Anna-Alix Koffi também se mantém ao lado de Sindika Dokolo: "Ele é um verdadeiro apaixonado pela arte, não tem a ver com oportunismo. Conhece muitas pessoas que comprariam obras por centenas de milhares de euros para devolvê-las ao seu país? Ele é um defensor da arte africana e, como tal, estou ao seu lado".


Fundação no Porto continua só no papel

Com uma coleção de mais de três mil peças, Sindika Dokolo é um dos maiores colecionadores africanos de arte contemporânea. Tem uma fundação sediada em Luanda e a sede europeia deveria estar já instalada em Portugal, no Porto.

Pelo menos era essa a expectativa, em 2016, quando a empresa Supreme Treasure, ligada ao casal, adquiriu à Câmara Municipal do Porto, em hasta pública, a chamada Casa Manoel de Oliveira, desenhada para Souto de Moura. Um investimento de 1,58 milhões de euros, mas o projeto nunca ganhou vida.

Antes, em 2015, a inauguração da exposição You Love Me, You Love Me Not, na Galeria Municipal do Porto, nos Jardins do Palácio de Cristal, com peças da coleção de Sindika Dokolo, era vista como uma primeira aproximação entre o colecionador de arte e a cidade portuguesa. Antes da inauguração, Dokolo recebeu mesmo a medalha de ouro da cidade e, numa entrevista ao Sol, dizia que a instalação no Porto da sede europeia da sua fundação tinha como objetivo o estabelecimento de "um eixo cultural estratégico entre o Porto e Luanda".

Coleção feita em dez anos

Em menos de dez anos, Sindika Dokolo destacou-se como colecionador e mecenas de arte africana, período durante o qual já era casado com Isabel dos Santos. "Ficamos sempre encantados pela África que prospera, temos fome de personalidade como a dele. Ele faz-nos sonhar", conta Didier Claes, negociador de arte em Bruxelas e nascido no Congo, que durante quatro anos fez negócios com o marido de Isabel dos Santos.

Com a crescente valorização da arte africana na Europa, Sindika Dokolo tornou-se uma referência para a elite mundial da arte, tornando-se um convidado VIP em diversas feiras de arte contemporânea e até da mais recente gala de amigos do Museu de Arte Moderna de Paris, em outubro de 2019.

No entanto, segundo o Le Monde, citando fonte do mercado de arte, nos últimos dois anos Sindika Dokolo terá parado de engrossar a sua coleção que, segundo os especialistas, contará com cerca de 500 peças de grande qualidade entre as mais de três mil que a constituem.

Lavagem de arte?

Será que Sindika Dokolo estava a fazer "lavagem de arte"? "Não acredito", diz Didier Claes ao Le Monde, que afirma que o empresário, nascido há 47 anos em Kinshasa, no Zaire (atual República Democrática do Congo), pagava as obras de arte através de empresas europeias oficiais.

Outros negociantes de arte revelaram ao Le Monde que o milionário fazia as transações através de uma empresa de construção registada no Congo. "Foi o dinheiro dele, não o que ele teria em comum com Isabel dos Santos, que nunca interveio, e os preços nunca foram inflacionados", disse um comerciante, que não se quis identificar.

Correram rumores e levantaram-se dúvidas no mercado de arte em torno das compras de Sindika Dokolo. Uma situação classificada como usual por Didier Claes. "Há sempre burburinho em torno de oligarcas africanos, com um fundo de racismo", afirmou o negociante. Dúvidas que se dissipam quando a coleção é mostrada em público, como Dokolo fez no Porto em 2015 e em 2019 no Museu Bozar, em Bruxelas, aponta Claes.

Plataforma | Imagem: Instagram oficial Isabel dos Santos

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