Em entrevista à DW, o deputado da
UNITA Raúl Danda chama "corrupto" ao novo presidente da CNE de
Angola, Manuel Silva Pereira. Danda anuncia resistência à nomeação e não
descarta a hipótese de mais manifestações.
A União Nacional para a
Independência Total de Angola (UNITA) vai "continuar
a refutar" a designação de Manuel Silva Pereira
"Manico" como presidente da Comissão Nacional Eleitoral (CNE) de
Angola, disse à DW Raúl Danda, deputado do maior partido da oposição. Na
quarta-feira (20.02), em sinal de protesto, a oposição
abandonou em bloco a Assembleia Nacional por considerar que o novo
titular não cumpre os padrões de probidade para assumir o cargo.
O Movimento Popular de Libertação
de Angola (MPLA), partido no poder, aprovou, sozinho, a tomada
de posse do novo presidente da CNE. Em entrevista à DW África, Raúl
Danda diz-se desiludido com o Presidente João Lourenço, a quem acusa de
"estar a promover um corrupto". O deputado garante que a (UNITA) não
vai baixar os braços. E se a nomeação de "Manico" não for anulada,
Raúl Danda diz que um cenário bem provável é de novas manifestações em Angola.
DW África: A UNITA ainda vai
tentar reverter esta tomada de posse do presidente da CNE?
Raúl Danda (RD): Bem, o que
nós vamos fazer, obviamente, é continuar a refutar o sr. Pereira da Silva como
presidente da Comissão Nacional Eleitoral. Não podemos aceitar isso. Não é um
problema da UNITA. Não é um problema da oposição. É um problema de Angola e dos
angolanos. Os angolanos não querem. Quem quer é o Presidente da República, tal
como disse manifestamente. Porque quando o Presidente da República para uns
casos diz tratar-se de um poder à parte, e respeita isto e aquilo, mas depois
ordena praticamente à Assembleia Nacional que confira a posse a alguém que não
tem idoneidade, nem moral, alguém que não cumpre os padrões da probidade, isso
é gravíssimo. O combate que o Presidente João Lourenço propala contra a
corrupção é falso, porque está a proteger alguém que é um corrupto.
DW África: A UNITA apelou ao
Presidente da República que anulasse este concurso e que ouvisse os partidos da
oposição. Ficaram desiludidos com esta resposta de João
Lourenço?
RD: Muito desiludidos,
porque percebemos que aquilo que o Presidente da República tem estado a dizer
relativamente ao combate contra a corrupção é uma falácia, não é verdade. O sr.
Manico, que tomou posse ontem perante os deputados do MPLA, e apenas desses, é
alguém que tem uma auditoria, digamos assim, mandada instaurar pelo antigo
presidente da Comissão Nacional Eleitoral, e que mostra claros desvios de
fundos, despesas que ele realizou que não devia realizar, dinheiros que foi
buscar. E estamos a falar em milhões de dólares.
RD: Absolutamente. Não reúne
condições nem para a UNITA, nem para ninguém. Aliás, este senhor, se tivesse
tido uma nesgazinha de vergonha e de dignidade, nem teria sequer comparecido
perante os deputados para que lhe fosse conferida a posse. Portanto, ou o homem
é muito corrupto e por isso aceita aquilo, ou então é alguém que, francamente,
não se dá valor nenhum. Eu não vejo como aquele homem chega a casa e olha para
a família depois de tudo o que se passou ontem, aqui na Assembleia Nacional. Eu
não sei como é que aquele homem consegue olhar-se ao espelho e gostar da imagem
que nele vê refletido.
DW África: A UNITA pediu um
debate de interesse político e urgente sobre esta questão. Vão insistir neste
pedido de debate?
RD: Nós vamos insistir, mas
sabemos que isto está a caír em ouvidos moucos. Muitos dos deputados do MPLA
com quem estamos a falar também estão indignados com isso. Estão apenas no
seguidismo político e partidário. É uma orientação da direção do partido e no
topo do partido está o Presidente João Lourenço, infelizmente. Então eles
seguem, mas muitos deles não estão de acordo com aquilo que se está a passar.
DW África: Que medidas legais
podem os partidos da oposição tomar agora?
RD: Há um recurso que foi
feito junto do Tribunal Supremo. Primeiro, o Tribunal Supremo mandou uma
resposta à UNITA, mas não se sabe se veio do tribunal ou de uma praçazita ou de
um mercado qualquer. Não sabemos de quem é, porque aquilo não está assinado, não
tem nome de ninguém. Depois das reclamações, ouvidas também a nível da
imprensa, o Tribunal Supremo enviou, não sabemos porque carga de água, uma
carta ao presidente da Assembleia Nacional, a dizer que tinha respondido à
UNITA. Não sei porque é que essa informação tem que vir para a Assembleia
Nacional. Mas nós vamos insistir. A verdade é que a UNITA não pode aceitar. Os
angolanos não podem, nem querem aceitar. Aliás, houve uma manifestação que se
organizou ontem (10.09) frente à Assembleia Nacional, que foi reprimida, mais
uma vez, num país que se diz democrático, onde o Presidente João Lourenço diz
que existe a liberdade de se manifestar. O que é uma grande mentira: as pessoas
foram reprimidas, foram espancadas, sairam daqui a sangrar, com gás lacrimogéneo,
com cães à perna, etc., etc.
DW África: Depois dessa repressão
que houve ontem, o grupo juvenil da UNITA vai tentar manifestar-se novamente
contra a tomada de posse?
RD: Tendo em contra a
frustração e o desagrado das pessoas, se não se fizer marcha atrás rapidamente
com essa pretensão de manter um corrupto que querem mandar para poder violar e
subverter a ordem constitucional por via de eleições fraudulentas, mais uma
vez, eu acho que é o povo angolano que vai começar a vir para a rua para se
manifestar. Não podemos continuar a aceitar, e o Presidente João Lourenço devia
ter vergonha de se considerar Presidente numa eleição com fraude. Já devia
bastar este mandato que ele está a cumprir, porque foi para lá com base numa
fraude eleitoral flagrante, com base numa corrupção eleitoral de que ele
próprio foi protagonista, à luz da lei que nós temos. Já devia bastar isso. Mas
insistir em querer permanecer mais cinco anos no poder com base na fraude, isso
é o cúmulo da pouca-vergonha.
Madalena Sampaio | Deutsche Welle
Imagem: Raúl Danda, deputado da
UNITA, maior partido da oposição em Angola
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