O novo tipo de coronavírus chegou
a Macau e mudou por completo o quotidiano da cidade. Autoridades responderam
rapidamente com várias medidas. Lições da SARS foram úteis, mas é cedo para se
perceber se é suficiente para evitar males maiores.
É preciso recuar 17 anos para
encontrar um cenário semelhante, aquando do surto de pneumonia atípica (SARS,
na sigla inglesa). Mas esta crise é diferente. A cidade está bem mais exposta
ao influxo de turistas da China continental e a resposta das autoridades é mais
determinada, dizem observadores.
O recolher pode não ser
obrigatório, mas a grande maioria da população está por casa nestes dias,
saindo à rua sobretudo em busca de bens alimentares ou máscaras. Autoridades e
sociedade estão a levar a sério os riscos associados ao surto do novo tipo de
coronavírus conhecido como vírus de Wuhan, capital da província de Hubei, onde
tem origem a doença que gera calafrios um pouco por todo o mundo. Famílias
inteiras passam quase todo o tempo dentro de portas com as férias de Ano Novo
Chinês de pais – funcionários públicos e não só – e filhos a serem estendidas.
As autoridades emitem comunicados
e mensagens várias vezes ao longo do dia, com conferências de imprensa e
medidas especiais a serem anunciadas diariamente. Será suficiente?
Resposta determinada
Em comparação com a crise de
2003, da SARS, o ritmo de circulação da informação e de ação do Governo é bem
mais intenso. Fernando Gomes, presidente da Associação de Médicos dos Serviços
de Saúde, salienta que “muito se aprendeu desde 2003”, notando que “a equipa
que está na liderança do Centro Hospitalar Conde de São Januário estava em
Macau há 17 anos”. Um deles, Lei Wai Seng, da direção do hospital
publico, lembra que desde 2003 houve um processo de aprendizagem e uma
experiência acumulada não apenas com a SARS, mas também com a Gripe A (H1N1),
gripe das aves ou a prevenção da MERS (Síndrome Respiratória do Médio Oriente).
Fernando Gomes destaca que “as decisões foram rápidas e com coragem e
determinação, o que é de louvar”. Outro médico que estava em Macau em 2003, Rui
Furtado – na altura como chefe do serviço de cirurgia do Hospital Conde de São
Januário – considera que “as autoridades estão a fazer o que tem de ser feito,
dando a resposta possível, sendo que as epidemias são mais ou menos
controláveis dependendo do número de infetados”.
Há 17 anos Macau teve apenas um
caso de SARS, um autêntico “milagre”, tendo em conta que a vizinha Hong Kong
vivia dias de angústia com cerca de 300 mortos e mais de 1700 infetados. “Nossa
Senhora de Fátima terá protegido Macau”, observa Rui Furtado.
Cidade mais exposta
Desta vez foi diferente. Macau
registava sete casos de novo coronavírus até ontem à noite, uma situação que
se deve não apenas ao facto de esta variante ser mais contagiosa que a de 2003,
mas também à maior exposição da cidade ao turismo da China continental. Recorde-se que há 17 anos ainda não estava em vigor o sistema de vistos
individuais para turistas do interior da China – entretanto suspenso em virtude
deste surto - uma medida que foi adotada em meados de 2003 e que
esteve relacionada com a tentativa das autoridades continentais de auxiliarem
as economias das regiões administrativas especiais a recuperar do impacto
económico da crise da SARS.
Sonny Lo, analista político e
docente na Universidade de Hong Kong, salienta que a resposta do Governo de
Macau tem sido mais eficiente e determinada que a das autoridades da região
administrativa vizinha que de resto tem estado sob intenso escrutínio e
críticas. Isto reflete-se na forma como as autoridades de Macau anunciaram
primeiro o prolongamento das férias escolares e as medidas de aquisição de
máscaras para a população.
E os casinos?
No entanto, o Governo de Macau
não fica imune a críticas e a opiniões na sociedade que pedem medidas mais
restritivas como o encerramento efetivo das fronteiras ou fecho dos casinos.
Eilo Yu, professor no Departamento de Governo e Administração Pública da
Universidade de Macau, chama a atenção para um outro estado de espírito de
exigência de maior proteção. “Parece que existe uma sensação na sociedade local
que, esta crise ilustra que uma integração mais profunda com a China
continental comporta riscos, como podemos ver pelo número de pessoas a pedir o
encerramento das fronteiras”.
Com eventos públicos suspensos,
pedidos para que as pessoas se protejam e permaneçam o mais possível em casa e
longe de aglomerados, serviços públicos encerrados e incentivo a empresas que
procurem formas de trabalho a partir de casa, algumas vozes pedem ao Governo
que avance nesta fase para um encerramento dos casinos. É o caso da Associação
Novo Macau para os Direitos dos Trabalhadores do Jogo. Para já a questão não se
coloca, embora o Chefe do Executivo Ho Iat Seng não deixe de lado essa
possibilidade em caso de agravamento sério do surto em Macau.
O risco do contágio local
Nesta fase, Leong Iek Hou, do
Centro de Controlo e Prevenção de Doenças, defende a opção do Governo. “Já
foram aplicadas as medidas de restrição de entrada de pessoas de Wuhan nos
casinos. Essa medida já consegue impedir o risco de infeção”, afirma.
Até ao momento todos os casos
registados em Macau são importados de cidadãos que vieram de Wuhan. Um dos
maiores receios diz respeito ao risco de contágio local, entre a comunidade.
Leong refere que as autoridades adotaram medidas como a restrição da entrada de
pessoas de Wuhan na cidade e também a limitação de áreas de circulação para as
pessoas de Wuhan”. São passos “para prevenir e impedir um surto na comunidade”,
algo que, acontecendo, elevará o patamar de alarme e deverá suscitar novas
medidas.
Número de casos do coronavirus
por territórios afetados
Casos confirmados: 7,921
Mortes: 170
Territórios afetados: 22
Medidas especiais
- Cancelados praticamente todos
os eventos comemorativos do Ano Novo Lunar
- Férias escolares de Ano Novo
Chinês prolongadas. Data de regresso às aulas a ser anunciada para a semana
- Creches públicas
suspenderam serviço desde a passada 4a feira
- Funcionários públicos
dispensados de ir trabalhar ontem e hoje. Empresas aconselhadas a fazer o mesmo
- Governo pediu às
operadoras de jogo para ajustarem horários dos trabalhadores em consonância com
o funcionamento dos postos fronteiriços
- Residentes de Macau na
província de Hubei terão de permanecer por lá
- Residentes de Hubei têm de
apresentar atestado emitido por instituição médica para entrar em Macau
- Governo encomenda 20 milhões de
máscaras
- Governo aconselha população a
evitar ir ao cinema, concertos, ou outras concentrações em espaços públicos
- Sistema de controlo de
temperatura corporal à entrada e saída de Macau
- Serviços de transporte de
passageiros de ferry entre Macau e Tuen Mun e Kowloon em Hong Kong
suspensos
- Frequência de viagens de ferry
para Sheung Wan e Aeroporto de Hong Kong reduzidos
Síndrome Respiratória Aguda
Severa (SARS) vs. Novo Coronavírus
Semelhanças
- São ambos da famílias dos
coronavírus, com origem em animais que evoluem e passam para humanos
- Têm origem na China continental
- Os sintomas incluem febre,
tosse, dificuldades respiratórias, podendo evoluir para pneumonia
Diferenças
- Período de incubação (4-14
dias) é superior ao da SARS (2-4 dias)
- Novo coronavírus é mais
contagioso que SARS
- Taxa de mortalidade é, (3
a 4 %) é menor que a da SARS (cerca de 10%)
José Carlos Matias | Plataforma
Macau
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