quinta-feira, 19 de março de 2020

Portugal | BRANDOS COSTUMES, BRANDO ESTADO DE EMERGÊNCIA


O diretor-adjunto do Expresso, Miguel Cadete, dá título que é mais um alerta para a situação atual em Portugal, afinal para toda a humanidade em todo o mundo. Escreve ele que “Entrámos num túnel e não sabemos onde vai dar”. É uma verdade que devemos ter presente e cuidar de sermos muito cautelosos no caminho para o dia em que todos no mundo nos livremos do Covid 19 planetáriamente. Mais incisivo que ele foi um elemento do governo Bolsonaro que declarou alto e em bom som que as famílias se devem preparar porque vão morrer familiares a quase todos os brasileiros… Assim mesmo, com esta exata interpretação.

Em Portugal não vai ser muito diferente, apesar de estar a tomar medidas para minimizar a hecatombe. Medidas que em opinião de muitos portugueses pecam por tardias… Pois é. A economia é que manda. Afinal até dá jeito morrerem os mais idosos, que descontaram durante uma vida inteirinha de trabalho e foram construindo o país, a liberdade e a democracia, suportaram durante treze anos uma guerra colonial que devastou imensos jovens – tantos são os que ainda repousam em paz em cemitérios das ex-colónias, ficaram lá. Porém, agora, são trastes velhos como os trapos. São muitos, vergados ao economicismo, a pensar na libertação desse peso, apesar de já não estarem ainda vivos tantos quanto isso e na maioria receberem reformas de miséria decretadas quase por esmola pelos atuais políticos que detêm os poderes.

Nos dias que correm a guerra é outra. Falta saber se foram senhores da guerra que libertaram o vírus que nos consome um pouco por todo o mundo. Que ele vem armado para abater muitos milhares de pessoas sabemos e experienciamos. Compete-nos agir e reagir ao ataque, em prol de melhores dias. De dias sem medo de sermos surpreendidos nas emboscadas levadas a cabo pelo inimigo, o coronavíros/covid 19.

O estado de emergência em Portugal foi decretado ontem. Com atraso.  Mais vale tarde que nunca. Contudo perdeu-se a janela de oportunidade de defesa efetiva, que nos pouparia recursos e vidas, quando tivemos conhecimento do que estava a ocorrer em Itália. Perante um inimigo como o coronavírus não podem existir liberdades que permitam o seu avanço. As pessoas serem livres de ir fazer férias de carnaval para Itália não é democracia mas sim permitir-lhes que contraiam o vírus e regressem com ele, contaminando em Portugal quem cumpria as suas vidas de trabalho e de lazer com toda a normalidade. Quando se refere Itália – porque era o mais flagrante – também o mesmo cabe na referência a Espanha e outros países que sabia já com casos de contaminação. Quer dizer, com o pretexto da democracia deixam-se os cidadãos caminharem para a enfermidade ou o matadouro? Que raio de liberdade e democracia é essa? Por essas e outras, graças à liberdade, muitos mais vão ficar contaminados e morrerão às centenas.

Conclui-se que as medidas agora impostas já deviam ter sido decretadas há cerca de dois meses. Prevenir, para não ter que remediar. Coisa que Portugal não fez, coisa que a União Europeia não fez. A gravidade da situação não foi corretamente exposta aos portugueses. Ainda agora, já com o estado de emergência em vigor, vimos cafés e restaurantes repletos de pessoas em alguns locais de Lisboa… É um estado de emergência democrático. Matem-se se quiserem. Contaminem-se e contaminem os vossos concidadãos em liberdade, graças à democracia. Democracia não é isso, e nem assim é justa. Não foi para isso que em 25 de Abril de 1974 reconquistámos as liberdades e a então democracia – que aos supetões e pé ante pé se vai deteriorando. Brandos costumes, brando estado de emergência.

É evidente que perante a situação atual vimos o governo e o PR a reagir ao atacante, um inimigo invisível que mata que se farta. Mas isso só acontece com mais alguma intensidade porque anteriormente, no momento certo, há dois meses atrás, não agiram. Se agissem quando deviam, de modo eficiente e radical, corajoso, não iam beliscar a democracia mas sim salvá-la e salvar-nos da doença, salvando muitas vidas que se vão perder. Possibilitaria também salvar a economia deste ataque que vai arrasar o que foi recuperado com muita dificuldade e sacrifício aquando dos roubos nos bancos pelos banqueiros e alta finança portuguesa, da União Europeia, da união global dos criminosos negreiros impunes que constituem os tais 1% ou um pouco mais da lista da Forbes.

A prosa vai longa. Não devia. O propósito era cumprir a abertura habitual para o Expresso Curto. Aconteceu. O sentir e a tendência para a verdade imbuíram o teclado na fuga para os desabafos, talvez psicoterapêuticos.

Basta o que basta. Não se interprete daqui que está tudo mal, que não devemos reconhecer e agradecer aos combatentes da saúde pelo seu esforço a salvar vidas. Também aos que por profissão ou voluntariado estão na linha da frente deste combate contra o vírus e a salvar vidas, não esquecendo as muitas horas suplementares que os dos poderes decisórios dispensam com afinco. Mas, então, porque foram tão titubeantes inicialmente? Alguns mesmo muito cobardes e outros escandalosamente displicentes. Assim, agora, por isso tudo, estamos metidos numa enorme camisa de onze varas, num grande sarilho. Que nos vai levar a muita desgraça e mortandade. Evidentemente que sobreviveremos. Não todos, porque vai ocorrer muita mortandade.

Bom dia. Cabeça erguida no combate de cada um em proteger-se, protegendo os seus iguais, que estão a seu lado ou que com eles se cruzam a cerca de dois metros ou que até mudam de passeio nas ruas quase desertas, só habitadas com irresponsáveis, inconscientes ou pelos que impreterivelmente têm de as usar porque estão a combater o inimigo em prol da proteção e salvação de outros. O reconhecimento a esses e um grande muito obrigado.

Longo, o que fica para trás. Desculpem. Curto a seguir, apesar de apresentado tarde é a boas horas. Vá nessa. Não dói nada.

MM | PG



Bom dia, este é o seu Expresso Curto

Entrámos num túnel e não sabemos onde vai dar

Miguel Cadete | Expresso

Bom dia!

O Expresso já está a divulgar desde o fim do dia de ontem algumas medidas do Estado de Emergência decretado pelo Presidente da República. É uma situação que não tem semelhança com nada que tenha sucedido no país desde há 45 anos.

Os estabelecimentos comerciais fecham todos com exceção dos supermercados, farmácias, bombas de gasolina e bancos. Porém, os restaurantes podem vender para fora ou fazer entregas ao domicílio.

O teletrabalho passa a ser obrigatório e os serviços públicos são reduzidos ao mínimo essencial. Todas as instituições culturais e desportivas ficam encerradas e os transportes públicos vão circular com lotação limitada.

Algumas destas medidas carecem de maior definição mas estão já em vigor, desde a meia noite e por um prazo de 15 dias que pode ser renovado. Toda a informação está nesta notícia da jornalista Liliana Valente, incluindo as medidas que visam apoiar os idosos, um dos grupos de maior risco da Covid-19.

Ontem à tarde, na Assembleia da República, o primeiro-ministro António Costa, disse que o surto do novo coronavírus em Portugal está para durar: “A consciência que temos é de que esta curva não acabará nos próximos 15 dias, mas que terá um pico em meados de abril e só poderá ter termo no final do mês de maio.” Sublinhou ainda que estas medidas estarão em vigor durante um período alargado e não apenas por uma ou duas semanas. E alertou: “podemos ter de viver mais um inverno sem vacina”.

À noite, Marcelo Rebelo de Sousa, ele próprio saído de uma quarentena que durou duas semanas, revelou que o Serviço Nacional de Saúde pode não chegar e que vai ser necessário “tratar os contagiados em casa”. Ângela Silva reportou o discurso que Marcelo Rebelo de Sousa fez em direto para as televisões.

A Direção Geral da Saúde anunciou quarta-feira que já estavam confirmados 642 casos de Covid-19 em Portugal, um aumento de 43% relativamente ao dia anterior. Até agora registam-se no país duas mortes atribuídas ao novo coronavírus, tendo a segunda acontecido ontem.

O passamento de Vieira Monteiro, presidente do Banco Santander, foi conhecido logo de manhã. Sabe-se que terá contraído o vírus no Carnaval, durante uma viagem ao norte de Itália.

Ainda antes de ser decretado o Estado de Emergência, a cidade de Ovar – com cerca de 55 mil habitantes - já conhecia medidas mais drásticas por se encontrar fechada: não é possível entrar nem sair do seu perímetro.

André Manuel Correia andou por lá em reportagem e falou com Joaquim, enfermeiro: “Fui uma das pessoas que esteve na conferência onde Luís Sepúlveda marcou presença e contactei com ele. Pedi-lhe para me assinar três livros, depois tiramos uma foto e ainda trocámos algumas palavras de circunstância. Eu até falei mais do que ele. Disse-lhe que se tivesse levado todos os livros que tenho dele, ele iria passar a tarde toda a assinar livros”.

Quem também vai assinar cheques é o ministro das Finanças Mário Centeno e o da Economia Siza Vieira que anunciaram medidas extraordinárias que visam conter a pandemia no país e salvar a vida económica. Ao todo vão ser injetados 9,2 mil milhões de euros na economia. É muito dinheiro para uma “crise que é diferente de todas as outras”, como salientou João Vieira Pereira, diretor do Expresso, no Jornal da Noite da SIC, notando que o valor pode ser pequeno, sobretudo se comparado com os 200 mil milhões de euros que o primeiro-ministro de Espanha, Pedro Sanchéz, anunciou ainda na semana passada.

OUTRAS NOTÍCIAS

Testes sobem em flecha. Os laboratórios privados já fizeram, na última semana, perto de cinco mil testes. Custam entre 100 e 200 euros mas isso não evita que se formem longas filas à porta dos laboratórios. “Há pessoas que nos ligam a chorar para fazer o teste”, conta a diretora médica do Synlab. Neste momento, os testes só podem ser feitos através de prescrição médica passada pelo médico de família, da medicina do trabalho, do delegado de saúde ou do clínico particular.

Infetados no Hospital de Santa Maria. Há pessoal de saúde do serviço de reumatologia que se encontra infetado – “menos de dez pessoas” que estiveram em contacto com doentes infetados ainda antes de se saber que tinham contraído o vírus. Encontram-se, por ora, de quarentena.

BCE compra 750 mil milhões de ativos. O banco central europeu mantém-se fiel à política de Draghi e está a injetar dinheiro nos mercados, através do fundo Pandemic Emergency Purchase Programme. Devido à turbulência registada decidiu investir mais 750 mil milhões de euros até ao final do ano para estimular a economia. Porém, o presidente do Conselho Europeu ainda não se comprometeu com a emissão de coronabonds, os títulos de dívida mutualizada, que Angela Merkel aceita mas que vê passarem com dificuldade no Parlamento alemão.

Farmácias queixam-se por não terem equipamentos de proteção. A bastonária alertou que as farmácias estão a ficar sem máscaras e que se colocam em risco de fechar. O alerta foi deixado depois de se saber que foram compradas cerca de dois milhões de máscaras para o SNS mas não para os estabelecimentos farmacêuticos.

Hospitais espanhóis perto do limite. Em Espanha, a Covid-19 cresce a uma velocidade por vezes maior do que sucedeu em Itália. Há mais de 14 mil casos registados, sendo que 800 estão nas unidades de cuidados intensivos. Teme-se o pior, segundo o diário catalão “La Vanguardia”, notando que o total de camas de cuidados intensivos - não apenas para as vítimas da pandemia - é de 4627. Só na região de Madrid, conta o “El País”, acontece uma morte a cada 16 minutos. Em Espanha, o total de mortos já vai em 640.

Encerradas todas as lojas da Zara e da Massimo Dutti. A Inditex, a empresa galega dona da Zara e da Massimo Dutti, mandou fechar todas as 335 lojas de venda de roupa que possui em Portugal. A Inditex já tinha fechado os 1600 estabelecimentos comerciais que possui em Espanha desde sábado.

China regista zero casos. É a primeira vez, desde que eclodiu o surto de Covid-19, há cerca de três meses, que a China anunciou não confirmar qualquer caso. Na quarta-feira, na cidade de Hubei, registaram-se, porém, oito mortes.

Metro de Lisboa é gratuito até ao fim do mês. Para evitar o contacto com os torniquetes de passagem, o Metro de Lisboa abriu as portas e todas as viagens serão gratuitas até que termine março. A venda de passes também está suspensa.

Jorge Jesus tem teste negativo. O Flamengo, clube onde atualmente trabalha, anunciou na sua conta da rede social Twitter que o terceiro teste feito a Jorge Jesus deu negativo, conta a Tribuna.

O mundo da música ao vivo está a ser fortemente abalado pela pandemia. Ontem foi anunciado o cancelamento do Eurofestival e de Glastonbury, o mais importante festival de verão europeu, o que deixa em risco os primeiros festivais portugueses do calendário. Em declarações à Blitz, Álvaro Covões da produtora Everything Is New anunciou também que o concerto de Nick Cave na Altice Arena seria desmarcado, mantendo, porém, esperança na concretização do NOS Alive.

FRASES

“Ninguém vai mentir a ninguém”. Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente de Portugal

“Com a declaração do estado de emergência, a democracia não será suspensa”. António Costa, primeiro-ministro

“Desejo-lhe sorte porque a sua sorte é a nossa sorte” Rui Rio, líder do PSD

“As pessoas podem perder todo o sentido de obediência à lei” Daniel Hill, comprador de armas ouvido pelo “New York Times”

O QUE ANDO A LER

O novo coronavírus, precisamente por ser novo, não tem vacinas ou medicamentos que o tratem. Uma das suas mais temíveis armas é a capacidade de se transmitir rapidamente, muito maior do que a de uma gripe vulgar para a qual já existem antídotos.

Outra das suas terríveis competências é o facto de deixar sem sintomas muitos contagiados. Por estes dias, a produção de artigos científicos sobre o assunto é avassaladora. Não sou, nem pretendo ser especialista, mas gostava de chamar a atenção para este estudo publicado na “Science”, e feito com base nos casos de Covid-19 na China, antes de ser decretado o lockdown, a 23 de janeiro – portanto sem quaisquer medidas de contenção:

Substantial undocumented infection facilitates the rapid dissemination of novel coronavírus” estima que os casos não documentados ascendiam a 86%, o que dá bem a ideia da quantidade de infetados que não revela sintomas.

Outro artigo que pode ser útil, também de teor estatístico, encontra-se neste estudo sobre a importância da estrutura demográfica na propagação do contágio. Aliás, há um outro que aponta precisamente no mesmo sentido e que questiona a alta taxa de letalidade de Itália face aos países orientais e que pode ser lido aqui.

Ao comparar o caso da Coreia da Sul e o de Itália, conclui que a epidemia terá beneficiado muito pelo facto da população italiana ser bastante mais envelhecida. A má notícia é que o mesmo sucede em Portugal em termos demográficos. A estrutura etária italiana é muito semelhante à portuguesa.

Proteja-se e tenha um bom dia!
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