Paulo Baldaia | TSF | opinião
Chegou a ser comovente a forma
como encaramos o início da Covid-19, tratando o novo coronavirus como uma
coisa democrática que não fazia distinções sociais, ameaçando de igual forma
pobres e ricos. Ainda há quem pense assim, porque de facto, apanhados pelo
vírus, as consequências seriam iguais para ricos e para pobres. E seria assim,
se o vírus circulasse apenas por países com sistemas nacionais de saúde que
acodem democraticamente a todos. Mas como sabemos, uma coisa é viver na
Europa e outra bem diferente é viver na América Latina, em África e até mesmo
nos Estados Unidos da América, onde o sistema de saúde se encarrega de
distinguir ricos e pobres.
"Não houve o mínimo de igualdade entre os que mantiveram a totalidade do seu rendimento, os que o perderam parcialmente e os que o perderam de todo."
Neste país onde é suposto ter
corrido tudo muito bem, aqui em Portugal, é verdade que evitámos o colapso do
SNS, mas também por cá se percebeu que o vírus perdia a sua característica
democrática sempre que era preciso tomar decisões. O confinamento, por exemplo,
não foi para todos, obrigando muitos profissionais mal pagos, como caixas de
supermercados, recolha do lixo, enfermeiros e pessoal auxiliar nos hospitais,
forças de segurança, todos esses trabalhadores foram sujeito a riscos muito
maiores que todos aqueles que puderam recolher-se em sua casa. Mesmo para os
que ficaram em casa, não houve o mínimo de igualdade entre os que mantiveram a
totalidade do seu rendimento, os que o perderam parcialmente e os que o perderam
de todo.
"O que agora se está a passar em Portugal mostra que o vírus pode ser muito democrata, nós como sociedade é que deixamos muito a desejar."
Chegamos a este momento e
percebemos que o vírus se mantém capaz de fazer adoecer pobres e ricos,
mas a sociedade encarrega-se de contrariar esse espírito solidário, não
fornecendo a uma enorme massa trabalhadora das periferias das grandes cidades,
Lisboa à cabeça, uma rede de transportes que não os coloque em perigo. E os mais pobres
dos pobres vivem em casas sem condições, muitos emigrantes a viverem amontoados
em quartos, bairros inteiros colocados em perigo...
O que agora se está a passar em
Portugal, com os mais pobres a serem vítimas quase em exclusivo da Covid-19,
mostra que o vírus pode ser muito democrata, nós como sociedade é que deixamos
muito a desejar.
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