domingo, 17 de maio de 2020

Portugal | Proteção ou abandono?


Inês Cardoso | Jornal de Notícias | opinião

Não temos respostas únicas ou seguras, mas é tempo de refletirmos sobre como lidamos com o novo coronavírus sem deixar que ele mate a presença e o contacto de proximidade com aqueles que queremos proteger, particularmente os mais velhos.

É um caminho novo, que se faz a apalpar terreno, mas à medida que os dias passam torna-se particularmente penoso ver a imensa solidão a que muitos idosos estão expostos.

Não se trata apenas de quem vive em lares ou outras respostas institucionais. Há pessoas de 70 e 80 anos, ativas e habituadas a uma vida preenchida, que há dois meses não veem filhos e netos. Acontecerá em meio urbano, mas mais ainda nalguns ambientes rurais, quando as famílias estão separadas por centenas de quilómetros e à distância física se juntaram as barreiras psicológicas.

Nos tempos de incerteza que cruzamos, todas as reações são legítimas e compreensíveis. Mas importa refletir que o afastamento absoluto, única forma de prevenir o risco de covid, acarreta outros danos. Mais difíceis de medir, mas corrosivos. Os especialistas têm vindo a apontar sugestões concretas para um convívio em segurança. Um piquenique ou uma mesa colocada num quintal ou pátio são opções para refeições em família, sem que isso implique expor os outros a riscos. Há cuidados a ter, claro, mas nenhum é impeditivo de retomar contacto.

Importa ainda recordar que proteger os mais velhos pressupõe ouvi-los. Na ânsia de decidirmos por eles, acabamos por os menorizar e desrespeitar. Proteger não é decidir por alguém que tem plena capacidade para o fazer. Poderia parecer muito cómodo manter os grupos de risco isolados até que haja uma vacina. Mas seria uma absurda restrição da sua liberdade e vontade. Os nossos pais e avós precisam de particular cuidado, mas não que os infantilizemos. Ou que os abandonemos meses a fio, fechados numa redoma que não escolheram.

* Diretora-adjunta

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