Para o analista Diamantino Lopes,
a comunidade internacional, em "função dos seus múltiplos
interesses", não está isenta de ter contribuído para a instabilidade
política na Guiné-Bissau.
O analista político guineense
Diamantino Domingos Lopes disse à Lusa que a comunidade internacional
"falhou desde o começo" na Guiné-Bissau ao reconhecer Umaro Sissoco
Embacó como Presidente do país, comprometendo a idoneidade do Supremo Tribunal
de Justiça.
"Já tratavam Umaro Sissoco
Embaló como Presidente eleito, mesmo perante um contencioso no Supremo Tribunal
de Justiça e de repente decidiram recuar porque estavam a comprometer a
idoneidade da maior instituição judiciária da Guiné-Bissau", disse à Lusa.
Só que, salientou Diamantino
Domingos Lopes, já "não conseguiram porque já tinham manifestado o seu
posicionamento numa direção, isto levou Umaro Sissoco Embaló a tomar posse
simbólica e consequentemente demitir a e nomear um novo Governo".
Para o analista, a Comunidade
Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), que tem mediado a crise no
país a pedido do Conselho de Segurança da ONU, também não cumpriu a sua missão,
nomeadamente quando as forças armadas invadiram as instituições de Estado para permitir
que o Governo de Nuno Nabiam assumisse o poder.
"Não se sabe o que é
exatamente, mas há uma teoria de jogos muito mais complexa do que podemos
imaginar, que acabam por influenciar negativamente o processo político da
Guiné-Bissau", afirmou Diamantino Domingos Lopes.
"Dividir para reinar"
Para o analista, a comunidade
internacional, em "função dos seus múltiplos interesses", não está
isenta de ter contribuído para a instabilidade política na Guiné-Bissau.
O sociólogo alerta também que nos
próximos tempos se vai assistir a uma estratégia política de "dividir para
reinar" para os partidos políticos salvaguardarem os seus interesses.
"A homogeneização da
sociedade guineense complica as contas, mas, mesmo assim, há sempre o
crescimento de tendências radicais alinhadas a estes princípios, o que é muito
perigoso para a reconciliação nacional e um diálogo inclusivo em busca da
construção de uma Guiné-Bissau próspera", disse.
Apoio de deputados do PAIGC a
Governo demostra fragilidade da democracia
Diamantino Lopes considerou em
entrevista à Lusa que o apoio de cinco deputados do Partido Africano para a
Independência da Guiné e Cabo Verde ao programa do Governo de Nuno Nabian
demonstra a "fragilidade da democracia" na Guiné-Bissau.
"Parece um ato democrático
normal, mas na verdade está muito longe disso, considerando todo o aparato que
antecedeu a convocação da sessão parlamentar", afirmou o sociólogo
Diamantino Domingos Lopes, em declarações à Lusa.
O analista deu como exemplo o
sequestro, em maio, do deputado Marciano Indi, líder de bancada parlamentar de
Assembleia do Povo Unido -Partido Democrático da Guiné-Bissau (APU-PDGB).
"Até hoje não existe uma
justificação formal e oficial do Ministério de Interior sobre o sucedido,
também faltou uma reação enérgica da Assembleia Nacional Popular e dos
deputados e de todas as formações políticas, exceto do PAIGC e seus aliados",
afirmou.
Situação confusa
O programa de Governo de Nuno
Nabiam foi aprovado na segunda-feira (29.06) com o apoio de cinco deputados do
PAIGC, que viabilizaram, assim, a maioria reivindicada pelo Movimento para a
Alternância Democrática (MADEM-G15), Partido de Renovação Social e Assembleia
do Povo Unido - Partido Democrático da Guiné-Bissau (APU-PDGB).
Aquelas três formações políticas,
que constituem o atual Governo, nomeado pelo Presidente do país, Umaro Sissoco
Embaló, reivindicavam a maioria no parlamento, apesar de quatro dos cinco
deputados da APU-PDGB manterem fidelidade a um anterior acordo de coligação
assinado entre o PAIGC, a APU-PDGB, União para a Mudança e Partido da Nova
Democracia.
Para Diamantino Domingos Lopes,
isto revela "ausência de solidariedade mecânica", ou seja,
"menos competição e mais harmonia, coesão e integração" e excesso de
"competição, divisão e conflito social, que é característica da sociedade
guineense".
"É complicado descrever e
compreender a realidade sociopolítica da Guiné-Bissau, devido à ambiguidade
entre a irracionalidade e racionalidade, dilema e consenso, ação individual e
coletivo", afirmou.
"Cipriano fez jogo mais
complicado”
Segundo o sociólogo, o que
aconteceu no Parlamento na segunda-feira demonstra a "incongruência da
relação e interação social", bem como a "falta de compromisso com o
interesse do grupo de pertença".
Os cinco deputados do PAIGC, que
já não tinham participado nas jornadas parlamentares do partido,
"decidiram furar o boicote", viabilizando não só a realização da
sessão plenária, como também a aprovação do programa do Governo, justificando
"simplesmente com o interesse da Guiné-Bissau".
Em relação ao presidente do
Parlamento, Cipriano Cassamá, e que assume também as funções de vice-presidente
do PAIGC, Diamantino Domingos Lopes disse que "fez o jogo mais
complicado".
"Assumiu uma orientação do
Presidente para encontrar solução para um problema, caso contrário o Parlamento
seria derrubado, e com base nessa pressão deu fuga para frente assumindo a
responsabilidade de encontrar solução, mesmo fora do âmbito das suas competências",
salientou.
O analista considerou que
Cipriano Cassamá viu um "caminho aberto" para "concretizar o seu
maior sonho", que é chegar à liderança do PAIGC e "projetar a ida
para o Palácio da República".
"Merece ou não ser
sancionado, merece, apesar de votar contra (programa do Governo), ele neste
momento foi quem mais atingiu o partido", disse.
O analista considerou, por outro
lado, que o PAIGC tem tido problemas em lidar com a situação política vigente,
legitimando ou não as autoridades instaladas.
Deputados do PAIGC presenciar a
sessão parlamentar
"A presença da direção do
partido nas reuniões com o Presidente da República, considerações e
advertências que ao longo do tempo faz ao Governo, faz pensar que as
legitima", disse.
Por essa razão, defendeu o
sociólogo, o PAIGC deveria ter estado presente na abertura da sessão
parlamentar, para haver debate político sobre as ideias e as orientações
políticas do partido.
"Seria um bom momento de
debate político sobre os valores democráticos, fundamentada na ética,
compromisso, liberdade e responsabilidade. Era uma bela oportunidade para
reabrir os textos do compromisso assumido para com o partido e consequentemente
para com o eleitorado", salientou.
"Mas, o meu maior medo é a
supremacia do poder económico face aos valores, o dinheiro não deve comprar a
democracia, isto porque quem paga a fatura é a sociedade", concluiu.
Deutsche Welle | Lusa
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