Pertencem a diferentes gerações.
Divergem em credos, convicções ou concepções estéticas e políticas.
Encontram-se espalhados por vários continentes. São homens e são mulheres. São
poetas, prosadores, ensaístas e dramaturgos. Escrevem para adultos e para
crianças. Alguns são músicos e compositores de canções. Vários receberam
prémios literários, entre eles os mais importantes da língua portuguesa. Há os
que dirigem ou representam associações de autores.
Todos estão unidos por uma única
vontade: não transigir com o racismo, a xenofobia e o populismo em Portugal. Porque ,
explicam, «como sempre nos mostrou a História, quem adormece em democracia
acorda em ditadura».
O dever da palavra
São «escritores portugueses e de
língua portuguesa». Estão, «por ofício, cientes do poder da palavra», mas
também «do poder da sua omissão». Por isso, «em tempos normais», dizem, não
dariam palco a comportamentos racistas, xenófobos e populistas.
As «circunstâncias vividas em
Portugal» neste domínio, que consideram «graves e inquietantes», levam-nos a
«correr esse risco». Até porque «cultura e literatura não florescem» em «tempos
sufocantes» em que o «mais repugnante pode emergir de uma sociedade em crise e
em estado de medo».
«Não podemos olhar para o lado
nem continuar calados, sob pena de emudecermos», afirmam. Exigem «compromissos
políticos que detenham a escalada do populismo, da violência, da xenofobia».
Dão o exemplo: «assumimos o compromisso de jamais participarmos em eventos,
conferências e/ou festivais conotados – seja de que maneira for – com ideias
que colidam com os princípios da tolerância e da dignidade humana».
Porque há valores a defender,
«antes que seja tarde». Elencam: democracia, multiculturalismo, justiça social,
tolerância, inclusão, igualdade entre géneros, liberdade de expressão e debate
aberto. «Tais», afirmam, «são as nossas grandes riquezas: a diversidade e a
tolerância», expressas na «língua portuguesa, feita de aglutinação, inclusão e
aceitação da diferença».
E gritam: «quem gosta de Portugal
jamais diz “Vão!”, antes diz “Venham!”».
A cada um a sua responsabilidade
Que cada um cumpra o seu dever, é
tudo o que pretendem os signatários da carta aberta.
«A todos os cidadãos portugueses,
à sociedade civil, aos professores das escolas e das universidades», os
escritores apelam «a que se distanciem de projectos e movimentos
antidemocráticos e ajudem na consciencialização das novas gerações para a
urgência dos valores humanistas e para os riscos das extremas-direitas; aos
órgãos de justiça, que investiguem, processem e condenem os interesses
económico-financeiros que se servem dos novos populismos; às autoridades
policiais e aos seus agentes, que se abstenham de condescender com movimentos e
acções promotores da exclusão, da discriminação e da violência; à comunicação
social, que assuma com veemência o seu papel de contraditório e de defesa da
verdade; aos partidos políticos, que sejam capazes de recuperar os princípios
esquecidos no decurso do jogo partidário de vocação eleitoral; ao Presidente da
República, à Assembleia da República e ao Governo, que exerçam um escrutínio rigoroso
da constitucionalidade e assegurem que o fascismo não passará».
A origem e o texto completo do
carta aberta
A iniciativa partiu dos
escritores Joel
Neto e Ana Margarida de Carvalho. Ambos os autores prestaram
declarações ao Jornal 2 da RTP-2, que podem ser ouvidas aqui.
Ao jornal Contacto (Luxemburgo), Ana
Margarida de Carvalho, um dos poucos autores a receber por mais de uma vez
o Grande Prémio do Romance e da Novela da APE, o maior galardão literário
português, explicou que a ‘Carta aberta dos escritores de língua portuguesa
contra o racismo, a xenofobia e o populismo e em defesa de uma cultura e de uma
sociedade livres, plurais e inclusivas’ «está alojada na página da Fundação
José Saramago» e que «continua a recolher assinaturas de várias mulheres e
homens da literatura».
No primeiro grupo de assinaturas,
durante um único fim-de-semana, eram cerca de 150 escritores. Hoje são mais de
200. Representam um autêntico quadro de honra da escrita em língua portuguesa.
O texto do manifesto encontra-se integralmente na página da
Fundação José Saramago, bem como a lista de escritores – sujeita a
actualização – que já o subscreveram.
AbrilAbril
Imagem: Manifestação contra a
morte do actor Bruno Candé e em defesa das vítimas do racismo, em Lisboa, a 31
de Julho de 2020. Bruno Candé, de 39 anos, foi baleado em 25 de Julho, num
crime com claros contornos de racismoCréditosMiguel A. Lopes / LUSA
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