segunda-feira, 28 de setembro de 2020

Portugal | PR e AR? "Misturar as duas coisas pode ser a receita para o desastre"

No entender de Vital Moreira, "dificilmente haverá pior sistema de governo do que aquele em que o poder governativo é compartilhado pelo PR e por um governo". Aliás, "misturar as duas coisas pode ser a receita para o desastre", defende.

Oconstitucionalista Vital Moreira discorda do politólogo Adelino Maltez que, numa entrevista ao Diário de Notícias, afirma que ter sido um erro diminuir os poderes presidenciais na revisão constitucional de 1982, defendendo que "devíamos ter mantido mais presidencialismo". 

Num artigo de opinião publicado no blogue Causa Nossa, o antigo eurodeputado explica por que razões não subscreve a tese do investigador. 

Vital Moreira defende, ao contrário do politólogo, que passados 40 anos, "foi oportuna" e "certeira" a decisão de "abandonar o sistema de governo semipresidencialista da versão originária da Constituição, em que o governo dependia cumulativamente da confiança política do PR e da AR, podendo ser demitido por ambos, e em que o Presidente acumulava a chefia do Estado com a presidência do Conselho da Revolução e com a chefia do Estado-Maior-General das Forças Armadas". 

Recordando a primeira legislatura da Assembleia da República (1976-79), em que o PS tinha uma maioria relativa, o constitucionalista lembra que houve "nada menos do que cinco governos em menos de quatro anos", três deles "de iniciativa presidencial" e sem base parlamentar, depois da demissão do 2.º governo pelo PR. Em contrapartida, sublinha, "dois dos governos de iniciativa presidencial foram demitidos pela AR".

Através destes exemplos, Vital Moreira aponta que "dificilmente haverá pior sistema de governo do que aquele em que o poder governativo é compartilhado pelo PR e por um governo, simultaneamente responsável perante ele e perante o Parlamento", tendo em conta o conflito e a instabilidade que daí advêm. 

Na opinião do constitucionalista, "um governo não poder servir dois senhores". "Ou depende do PR, sem depender do parlamento (sistema presidencialista) ou depende do parlamento, sem depender do Presidente (sistema parlamentar)", pelo que "misturar as duas coisas pode ser a receita para o desastre", considera. 

Vital Moreira realça ainda que a revisão constitucional que retirou o Presidente da República da esfera governativa e acabou com a responsabilidade política do Governo perante o Presidente, manteve um papel político próprio do PR como "poder moderador", com a função constitucional de assegurar o "regular funcionamento das instituições". O que, no entender do constitucionalista, "assegurou quase quarenta anos de estabilidade institucional e de razoável estabilidade governativa", concluindo que  se tratou de uma decisão "bem-sucedida". 

Melissa Lopes | Notícias ao Minuto

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