sábado, 7 de novembro de 2020

À frente da Casa Branca há uma festa contínua até Trump sair

Esta sexta-feira ao final do dia havia centenas de pessoas ao pé da cerca que Trump mandou reforçar à frente da Casa Branca. Há milhares de cartazes, muita música, com alguns a prometer que só saem depois de Trump abandonar o edifício. Mesmo que ninguém saiba quando é

“Jesus vai salvar-nos", grita um pregador, que trouxe dois enormes crucifixos para a porta da Casa Branca. Ao lado dele, um outro tipo de pregador disputa o som dos alfifalantes com ele: "O que nos salva é a verdade". Atrás deste último está um caixão negro com um cartaz de lado: "Impeach Donald Trump again!". E mais: "Escolhe, somos o mal (Trump) ou somos o bem (a verdade)?".

O povo americano parece já ter escolhido, mas o inquilino da Casa Branca continua lá, sem reconhecer a derrota. É já sexta-feira na América, os quatro estados que estão em aberto inclinam-se todos para Biden, enquanto Trump dispara todos os dias tweets a alegar uma fraude eleitoral. Os tiros não atingem quem ali foi para se juntar à festa.

"Vou passar a minha última música, mas a música nunca vai parar! Vou passar aqui ao Lowry, vamos ter música sempre, 24 horas, nunca nos vão silenciar. Estão todos prontos?" Clarence é uma das animadoras, está lá há um mês, mesmo junto à cerca que Trump mandou reforçar com blocos de cimento para que ninguém tivesse a tentação de saltar nestes dias. Clarence é provocadora e pôs-se em cima dessas placas com a cabeça por cima da rede a insultar o Presidente, que estará lá ao fundo, no edifício. Mesmo com a polícia do outro lado.

A rede também é nova ali - foi posta depois dos protestos Black Lives Matter, que levaram Trump a enviar a polícia com gás pimenta para afastar todos enquanto ele ia a pé até à igreja da esquina tirar uma foto com a Bíblia na mão. Agora a praça chama-se assim mesmo: Black Lives Matter. E tudo naquele sítio está cheio, mesmo cheio, de cartazes contra o Presidente.

A música, a última que Clarence vai passar, está em modo "repeat" há muitos dias também. "Fuck Donald Trump", em registo hip hop, é cantada por muitos em uníssono e dançada por outros. Clarence está preparada para continuar a passá-la por mais uns tempos porque não acredita que Trump reconheça a derrota que parece estar quase quase segura: "Claro que não! Ele nunca o fará, vai sempre culpar outra pessoa, não tem qualquer capacidade de assumir responsabilidades!". Então e como é que ele vai sair da Casa Branca? "Sei lá!", diz ao Expresso. Pouco lhe importa: na verdade o objetivo já lhe soa a cumprido: Trump fora.

John também está ali em protesto desde 13 de outubro. Está pronto para sair quando Trump abandonar o edifício (será só a 20 de janeiro). Talvez até mais cedo: "Acho que daqui a mais uns dias acabam de contar os votos e ele não tem mais saída", confia. Pelo sim pelo não, John tem um pedaço grande de cartão na mão - e nós perguntamos-lhe para que é: "É para organizar protestos radicais, estou a pedir endereços de email para convocar, se for preciso". Não estão ali muitos emails - mas não é impossível que John já tenha outros guardados ali, onde tem todos os seus pertences.

Continuam a juntar-se pessoas, que lentamente vão chegando de todo o lado. Há famílias que levam os filhos com cartazes feitos pelos mais novos (um tem uma frase citada de Winnie the Poo), casais que decidiram ficar por lá umas horas na expectativa de um estado decisivo que se feche e entregue a faixa de Presidente da Biden.

Biden tem pedido paciência, dia após dia. Ali, naquele pedaço de Washington, é isso que se vê: muitas fotografias, muitos sorrisos nas caras - que se veem mesmo através das máscaras, nos olhos. Muitos passos de dança enquanto a música prossegue.

Uma rapariga em particular, Ray, agita o corpo como numa discoteca. "Acho que ele não vai conceder, ele não sabe fazê-lo. Mas as pessoas votaram, vai ser impossível para ele."

Ray volta para o seu posto, agarra o cartaz que tinha na mão e retoma o ritmo da música. Ao lado dele, outro dos permanentes tem um Trump desenhado nas mãos. "Game Over."

David Dinis | Expresso

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