sábado, 7 de novembro de 2020

Memorial da escravatura em Lisboa será concluído no 1.º trimestre de 2021

O projeto 'Plantação -- Prosperidade e Pesadelo', do artista angolano Kiluanji Kia Henda, para criação de um memorial da escravatura em Lisboa, vai estar concluído no final do primeiro trimestre de 2021, revelou o autor à agência Lusa.

Acriação de um memorial da escravatura foi um dos projetos vencedores do Orçamento Participativo de Lisboa de 2017/2018, na sequência do qual foi lançado um concurso pela Câmara, saindo vencedora, em março deste ano, a proposta de Kiluanji Kia Henda.

"Há algum atraso devido à situação de pandemia de covid-19, mas o trabalho continua. Já temos o protótipo de uma cana de açúcar que está a ser realizado no Porto, por uma empresa portuguesa. Depois será a fase de produção, e segue-se a de engenharia. A expectativa é que o memorial esteja concluído no final do primeiro trimestre de 2021", disse o artista sobre o andamento do projeto, em entrevista à agência Lusa.

Kiluanji Kia Henda idealizou uma plantação com 540 canas de açúcar, cada uma com quatro metros de altura, em alumínio lacado a preto, colocadas numa área pintada na mesma cor - no Campo das Cebolas -, ladeada por bancos de betão em círculo, onde os visitantes poderão sentar-se "para contemplar e refletir, ou para apresentar eventos culturais".

"O memorial representa simbolicamente uma plantação de luto pelas vítimas da escravatura. Será uma plantação metálica, estéril, com uma leitura vertical, que nos remete para um passado trágico, mas também para um futuro próspero", descreveu o artista, nascido em Luanda, em 1979, e que em 2017 venceu o Prémio Frieze da feira londrina de arte.

Para o criador angolano, este monumento tem múltiplas dimensões: "Tem nele o luto e a dor, mas também aponta para a esperança em dias melhores. Há nele dor e tragédia, mas também há uma porta aberta para um futuro melhor".

Henda tem vindo a pesquisar os temas da memória colonial e dos movimentos globais de imigrantes. Usa habitualmente a fotografia, o vídeo, a instalação e a 'performance' nos seus trabalhos, apresentados em Portugal, França, Itália, Alemanha, Polónia, Brasil, Angola, Estados Unidos, Austrália e China.

"Plantação - Prosperidade e Pesadelo" foi criado como "convite à reflexão" num espaço que reproduz a atividade económica da produção da cana de açúcar, que chegou a ser chamada de "ouro branco" - uma mercadoria luxuosa, há cinco séculos, originária do sul da Ásia que os Descobrimentos consagraram como mercadoria, num mercado global.

Plantações, companhias, entrepostos, refinarias, depósitos e lojas foram criados em vários pontos do mundo, numa rede alimentada por rotas comerciais ativas entre os séculos XVI e XIX, baseados no trabalho de escravos, que se generalizou no império português, e só viria a ser abolido no início do século XIX.

Para a criação do projeto do memorial em Lisboa, no espaço reabilitado pelo arquiteto João Carrilho da Graça, as autoridades municipais já anunciaram um orçamento entre 150 mil e 180 mil euros para a concretização, mas "só com a realização do protótipo será possível ter uma ideia de quanto custará", disse à Lusa Kiluanji Kia Henda que, no concurso para o projeto, ficou à frente das propostas de mais dois artistas afrodescendentes, Grada Kilomba e Jaime Laureano.

Quanto ao anteriormente anunciado Centro Interpretativo do memorial, o artista indicou que "está previsto, mas deverá ser criado numa fase posterior", ainda a planear.

Kiluanji Kia Henda foi distinguido em 2012 com o Prémio Nacional de Arte e Cultura do Ministério da Cultura de Angola.

Notícias ao Minuto | Lusa

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