Ordem dos Jornalistas pede intervenção internacional contra a perseguição à imprensa na Guiné-Bissau. Bastonário, António Nhaga, teme que Chefe de Estado esteja a intimidar os profissionais de comunicação no país.
Vários profissionais da comunicação social têm sofrido ameaças contra a integridade física nos últimos meses na Guiné-Bissau. Apesar da sucessivas queixas, o clima de perseguição parece estar longe do fim.
O sequestro e espancamento do bloguer Aly Silva e a agressão por agentes das forças de segurança a Adão Ramalho, jornalista da Rádio Capital, são os últimos acontecimentos da escalada de eventos que tem tido como alvo figuras da comunicação no país.
Em entrevista à DW África, o bastonário da Ordem dos Jornalistas guineenses, António Nhaga, sugere que o comportamento do Presidente da República, Umaro Sissoco Embaló, aumenta as dúvidas sobre a sua idoneidade perante a atual situação do jornalismo no país.
DW África: Como é que descreve o ambiente de trabalho atual dos jornalistas na Guiné-Bissau?
António Nhaga (AN): A Ordem dos Jornalistas da Guiné-Bissau tem vindo a testemunhar com bastante preocupação o cenário que atenta contra o exercício pleno do jornalismo, perpetrado por um grupo de pessoas singular, encapuçado e com armas de fogo. Os jornalistas têm sido alvo de intimidações, ameaças e discriminação por parte do próprio Presidente da República, que quando aparece em público diz coisas como ‘quem não segura a sua cabeça, vai ser assegurada'. Já no dia 26 de fevereiro disse no balanço do seu mandato que os jornalistas não tinham condições para conduzir o debate... Ele tem andado permanentemente a imiscuir-se com o exercício da profissão e isto preocupa-nos bastante.
DW África: O Presidente e o primeiro-ministro já vieram negar quaisquer responsabilidades nestes últimos incidentes, mas a impressão é que as agressões contra os jornalistas se intensificaram nos últimos tempos. É claro para a Ordem dos Jornalistas que há uma ligação entre o Chefe de Estado e esta aparente ofensiva contra a imprensa?
AN: Nós estamos a fazer balanços do que ele tem dito, porque estamos preocupados [com a possibilidade] de que o senhor Presidente da República possa ter alguma ligação com isso. De facto, o que ele faz acaba por provar-nos que ele deve ter mão obscura sobre isto, porque o comportamento do Presidente da República indica que ele poderá ter alguma coisa a ver com isto. Nós gostaríamos, de facto, de chamar o Presidente da República à atenção para que refina a sua conduta, pautando-se pelo rigor. A Ordem dos Jornalistas condena com veemência o comportamento inadequado de seja quem for que está a espancar jornalistas neste momento na Guiné-Bissau.
DW África: O que é que os representantes da classe e as organizações podem fazer para responder a estes ataques?
AN: O que nós podemos fazer é um trabalho conjunto. Provavelmente amanhã vamos dar uma conferência de imprensa para marcar a nossa posição. Nós temos de exigir ao senhor Presidente da República que tenha rigor e responsabilidade. A sua comunicação deve pautar-se por outras palavras para salvaguardar o seu estatuto enquanto Presidente. De facto, as coisas que ele diz não são aquilo que um Presidente da República deve dizer. Vamos dizer-lhe para ele ter respeito.
A Ordem já entregou uma proposta que se for aprovada poderia salvaguardar a imprensa, porque de facto os jornalistas da Guiné-Bissau trabalham em condições difíceis e precárias. Ele ataca a imprensa e discrimina jornalistas. Como Presidente de todos os guineenses, ele não pode convidar só um grupo de imprensa, que é o órgão público, e deixar o grosso dos jornalistas de fora. Todo este comportamento do Presidente da República faz-nos crer que ele não tem mãos limpas nesta matéria. Condenamos isto e solicitamos o senhor Presidente da República a usar a sua magistratura de influência junto do Governo para que seja aprovado um modelo para apoiar a independência do jornalismo na Guiné-Bissau. Nós temos um rol de perguntas para lhe fazer, mas o senhor Presidente da República parece que não quer ouvir a Ordem dos Jornalistas.
DW África: Os jornalistas ponderam outros instrumentos ou entidades, talvez até internacionais, para se fazerem ouvir?
AN: O que nós queremos é apelar à Federação Internacional do Jornalismo e aos Repórteres Sem Fronteiras para acompanhar de perto a situação do jornalismo na Guiné-Bissau. A situação está a agravar-se cada dia. É uma situação lamentável em que há pessoas que estão a tentar pôr em causa o exercício da liberdade de imprensa.
Maria João Pinto | Deutsche Welle
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