Nuno Dala apelida a imundice em Luanda como "engenharia política do caos". Ativista acusa governadora da cidade de criar empresas para "abocanhar" parte dos 34 mil milhões de kwanzas atribuídos para sanar o problema.
A capital angolana, Luanda, tem sido afetada nos últimos tempos por um grave problema de recolha de lixo. A situação agudizou-se com as fortes chuvas que caíram nesta terça-feira (16.03), que provocaram inundações em alguns bairros da cidade, devido a dificuldades de escoamento das águas.
Sobre a situação, a DW África ouviu o ativista angolano Nuno Dala, para quem o caos que se vive em Luanda ilustra "um país que não tem sequer sido governado".
DW África: Porquê considera que Angola não é governada?
Nuno Dala (ND): Eu, enquanto cidadão e ativista, quando olho para a quantidade de lixo que Luanda tem naturalmente vejo ali um recado que me remete para a imagem de um país que não tem sequer sido governado. Quando se diz que Angola tem sido má governada não estamos a ser efetivamente honestos, o lixo representa a governação sem projeto do MPLA, manter o caos para se manter no poder.
DW África: Isso justifica o silêncio do Presidente da República em relação à questão do lixo em Luanda?
ND: Exatamente. Chamamos a isso engenharia política do caos, quanto mais caótica for a capital e as outras grandes cidades, melhor consegue capitalizar.
DW África: Nota-se em Luanda montões de lixo, o que denuncia falhas no sistema de recolha. O que estaria por detrás disso?
ND: Decidir as empresas que vão fazer a recolha, a gestão do resíduos sólidos ao nível da província [está na mão] do governador. E depois temos um outro grande problema que reside no modelo de contratação, ou seja, a atual governadora está ainda a cuidar de certificar quais serão as empresas que vão cuidar do saneamento nos próximos tempos.
DW África: Está a dizer que não há um processo de procurement que obedece os protocolos de transparência?
ND: Exatamente. Note que quando o anterior governador de Luanda, Bento Bento, tomou posse e começou a trabalhar fez questão de eliminar todas as empresas que até então tinham mantido Luanda mais ou menos limpa. Criou no espaço de mais ou menos 24 horas uma empresa sua que passou a ser para si dos melhores contratos de saneamento para Luanda. Não foi o primeiro governador a fazer isso, a atual governadora quando chegou fez a mesma coisa, tanto é que ontem tomamos conhecimento de que já foram escolhidas as novas empresas, mas que são todas ou propriedade da governadora ou de pessoas amigas. É o problema do tráfico de influências.
DW África: Por outras palavras, a recolha de lixo é uma espécie de saco azul para os dirigentes?
ND: É um negócio milionário. A governadora, na verdade, faz negócio consigo própria, é ela que dá o aval final para que os contratos possam ser executados. Pode ter a certeza de que neste momento em que estamos a falar o processo para as empresas da governadora e pessoas ligadas a ela está efetivamente a ser concluído para que elas tenham acesso aos melhores contratos. E aqueles que comportam mais de 80% dos 34 mil milhões de kwanzas que o Presidente da República disponibilzou para resolver o problema, por um lado da dívida, e por outro, o problema do estabelecimento de novos contratos com as empresas de saneamento.
DW África: Há vozes que pedem que a governandora Joana Lina seja afastada.
ND: A exoneração da governadora não seria a resolução do problema, ou seja, não tocaria na raiz do problema.
DW África: Qual seria a melhor via?
ND: Para começar, uma auditoria à dívida que o governo tem com as empresas de saneamento. Como é possível que, estando no orçamento todo o problema do saneamento de Luanda, como o governo acumulou uma dívida de dois ou três anos? A seguir uma responsabilização de todas as figuras, bem identificadas, que desviaram o dinheiro que era para pagar as empresas de saneamento, porque a crise do lixo não foi só devido a falhas estruturais do modelo.
Amós Fernando | Deutsche Welle
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