terça-feira, 13 de abril de 2021

Portugal | Novo Banco quer brinde de 600 milhões

Mariana Mortágua* | Jornal de Notícias | opinião

Lembram-se da garantia pública de 3900 milhões que Mário Centeno jurou que não existia e, depois, que não seria para utilizar? Pois o Novo Banco já tirou dela 3576 milhões.

E agora invoca o contrato para pedir mais 600 milhões. Mas as contas do próprio banco mostram que cumpre os requisitos europeus de supervisão e que essa injeção é um mero brinde.

O Governo e o Fundo de Resolução contestam este novo pedido. De facto, o Novo Banco incluiu nele 166 milhões associados à venda da operação em Espanha e que não deveriam ter sido registados. Não é a primeira vez que o acionista do Novo Banco passa uma fatura empolada ao Estado. Já o tinha feito nos bónus pagos aos administradores e adotando uma regra contabilística que inchou a injeção pública em cerca de 200 milhões. Desta vez, é o próprio primeiro-ministro que afirma que o pedido "manifestamente ultrapassa aquilo que é devido". Sim, o mesmo primeiro-ministro que há poucos meses atacava o Bloco de Esquerda por ter proposto que novas injeções ficassem dependentes de uma auditoria isenta às contas do Novo Banco. Na altura, para proteger a qualquer custo a ruinosa venda do Novo Banco à Lone Star, a bancada do PS dizia que a aprovação da proposta do Bloco era uma "bomba atómica" sobre o sistema financeiro. Insinuou até que, sem a injeção requerida, imediata e sem condições, o banco não cumpriria o capital obrigatório e seria levado a novo processo de resolução.

Mas a conclusão de António Costa é muito incompleta, ao falar "daquilo que é devido". Quem ler as contas do Novo Banco chega a uma só conclusão: todo dinheiro pedido ao Estado este ano é dinheiro a mais uma vez que o Novo Banco já cumpre os requisitos de capital exigidos pelo Banco Central Europeu e com uma folga de 500 milhões (que aumentará para 1000 milhões se o pedido do Novo Banco for aceite).

O Novo Banco não precisa desta injeção. Com ela, o Estado está apenas sobrecapitalizar o banco da Lone Star. Mas esta conclusão é desconfortável para o Governo, porque expõe mais uma vez a natureza ruinosa da venda feita por Mário Centeno. Segundo o contrato, o Fundo de Resolução entra com dinheiro se o rácio de capital do Novo Banco ficar abaixo dos 12%. Ora, para enfrentar a pandemia, o BCE reduziu aquele rácio para 8,25%, de modo a facilitar o crédito à economia e a absorção de perdas. Sem nova injeção, o Novo Banco já cumpre hoje um rácio de cerca de 10%, bem acima do exigido pelo BCE.

Agora, em vez de fazer refletir as novas condições europeias no pedido de injeção ao Fundo de Resolução, o Novo Banco invoca o contrato, pede 600 milhões de que não necessita e prepara-se para se apropriar da diferença. É este assalto que o Governo pode impedir. António Costa sabe que tem votos para isso no Parlamento.

*Deputada do BE

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