A cidade de Luanda assinala nesta terça-feira (25) o seu 446º aniversário, com a execução de dezenas de projectos, no âmbito do Plano Integrado de Intervenção nos Municípios (PIIM) e com a situação do lixo minimamente controlada.
Nestes 446 anos, Luanda continua
a debater-se com construções anárquicas, o registo de actos de vandalismo de
bens públicos e privados e um elevado número de famílias vulneráveis, como
consequência da Co-vid-19, que deixou milhares de trabalhadores informais
desempregados.
A cidade capital tem-se debatido com o aumento do custo de vida, que fez com
que muitas famílias perdessem o poder de compra e se agravassem as deficiências
nos serviços sociais básicos e os índices de criminalidade, factores que afectam,
igualmente, os outros municípios da província de Luanda.
No entanto, a execução dos projectos do PIIM, com a construção de escolas,
centros e postos de saúde, reparação de estradas, melhoria no abastecimento de
água potável e energia eléctrica apontam para dias melhores quanto a oferta
destes Serviços.
A solução para centenas de famílias carentes e vulneráveis na província
de Luanda foi a atribuição de kits de serralharia, alvenaria, corte e costura,
carrinhos de kitutes da terra, motas de três e duas rodas, para o fomento do
auto-emprego, no âmbito do Programa Integrado de Desenvolvimento Local e
Combate à Pobreza (PIDLCP).
Situada na costa Oeste de África, Luanda é a capital de Angola e foi fundada a
25 de Janeiro de 1576, pelo explorador português Paulo Dias de Novais, sob o
nome de "São Paulo de Assunção de Loanda”.
Um ano depois da sua fundação, o explorador português Paulo Dias de Novais
lança a pedra para a edificação da igreja dedicada a São Sebastião, no lugar
onde hoje é o Museu Central das Forças Armadas.
Só cerca de três décadas depois, com o aumento da população europeia e o
consequente aumento de edificações, a vila passa à cidade.
Com um perfil extremamente cosmopolita, os habitantes de Luanda são, na sua
maioria, membros dos grupos étnicos ambundos, congos e ovimbundos, existindo
fracções relevantes de todas as origens étnicas angolanas. Existe uma população
de origem europeia, constituída principalmente por Portugueses.
Após a Independência de Angola, em 1975, o município de Luanda foi extinto,
dividindo-se o território da província, primeiro, em três municípios e, depois,
em nove: Cazenga, Ingombota, Kilamba Kiaxi, Maianga, Rangel, Sambizanga, Samba,
Viana e Cacuaco.
A 1 de Setembro de 2011, pela Lei nº 29/11, foi restaurado o município de
Luanda, com
Com uma população estimada em mais de 2.194.747 habitantes, a cidade de Luanda,
cujo nome vem de Axiluandas, "os homens do mar” nativos da Ilha do Cabo, é
o município com maior número de habitantes da República de Angola.
Luanda é o principal centro financeiro, comercial e económico de Angola, nela
estão sediadas as principais empresas do país, como a Endiama, Sonangol, Banco
Nacional de Angola e a Bolsa de Dívida e Valores de Angola.
No campo industrial, Luanda tem a transformação como uma das principais
actividades, que inclui alimentos processados, bebidas, têxteis, cimento,
materiais de construção, produtos plásticos e metais e também possui um
excelente porto natural, de onde exporta diversos produtos.
Vale a pena mencionar, no entanto, a zona periférica que prolonga Luanda,
muitos quilómetros além da antiga cidade, como resultado de várias décadas de
conflito armado, acolhendo centenas de milhares de angolanos que procuraram
refúgio na capital.
Com uma extensão de
Quem vive ou visita Luanda, para se locomover tem como principal sistema de
transporte os táxis, também chamados de candongueiros, pintados de azul e
branco, que ligam as diversas zonas da cidade, usando como principais vias a
Estrada Nacional 100, que liga ao Norte do país, e a EN-230 (Deolinda
Rodrigues), que liga a Ndalatando, Malanje e Saurimo, entre outras.
Outro meio de transporte colocado à disposição dos luandenses são os comboios
do Caminho-de-Ferro de Luanda (CFL), que saem da Estação dos Musseques, Baixa
de Luanda, para Viana e os comboios suburbanos que se destinam a Catete e Icolo
e Bengo.
Luanda tem como cartão de visita a Baía de Luanda, a antiga Avenida Marginal ou
Avenida 4 de Fevereiro, com belas edificações, como o edifício do Banco
Nacional de Angola, que ainda mantém o brasão de Portugal na fachada.
Os edifícios históricos coloniais, como o Governo Provincial, os museus das
Forças Armadas, Antropologia, da Moeda, História Natural e o da Escravatura,
onde se podem ver instrumentos de coerção e imobilização usados contra os
escravos são, entre outros, locais que também servem de cartão postal.
Quem chega a Luanda devia fazer questão de visitar as ilhas de Luanda e do
Mussulo, que na realidade, não se trata de uma ilha, mas de uma restinga
acompanhada por diversas ilhotas, com belíssimas praias.
Outras atracções são o Miradouro da Lua, um local quase irreal, com falésias de
diversas cores, a Praça do Artesanato, com objectos de madeira, bijuterias e
belíssimos quadros, com as cores fortes típicas de África, e o Parque da
Kissama, com fauna e flora diversa.
Actualmente, com mais de oito milhões de habitantes, a província de Luanda está
dividida administrativamente pelos municípios de Luanda, Cazenga, Viana,
Cacuaco, Belas, Icolo e Ben-go, Kissama, Talatona e Ki-lamba Kiaxi.
Cidade está a crescer de forma desordenada
A capital de Angola, Luanda, assinala, hoje, 446 anos de existência, desde a
sua fundação, em 1576, pelo português Paulo Dias de Novais. Localizada na
região Centro-Norte do país, já foi considerada, durante várias décadas, uma
das cidades mais lindas de África.
Hoje, este estatuto tende a se perder devido ao crescimento desordenado de
inúmeros bairros, pelo deficitário sistema de saneamento básico e, acima de
tudo, pelos vários problemas sociais que apresenta.
Em prol à efeméride, o Jornal de Angola visitou alguns novos bairros de Luanda,
para saber como surgiram e os problemas que mais apoquentam os moradores.
Um dos bairros visitados é o da Mutamba, localizado no Distrito Urbano da Vila
Flor, município de Viana, fundado nos anos 2011/2012, que tem como principal
acesso a avenida Comandante Fidel Castro (Via Expresso).
O bairro surgiu na sequência de invasões de terreno, feitas, maioritariamente,
por cidadãos da etnia bakongo, que usavam a força, a ponto de matarem alguns
camponeses detentores de documentos provisórios, passados pelo Ministério da
Agricultura, que lhes dava permissão para explorarem a zona de cultivo.
Hoje, de zona agrícola apenas sobraram lembranças, porque o bairro continua a
crescer de forma tão desordenada que propicia a prática de vários crimes. No
bairro da Mutumba, Distrito da Vila Flor, os moradores têm hora de entrada e de
saída, que vai das 6h30 às 17h30, caso contrário são molestados por meliantes,
porque a presença da Polícia não se faz sentir.
O Distrito da Vila Flor, onde está localizado o bairro da Mutamba, ocupa uma
área de cerca de
Os meliantes, que diariamente tiram o sono aos moradores, até já sabem quando o
carro da Polícia está avariado, porque fica apoiado sobre pedras durante dias,
defronte à esquadra.
Eduardo dos Santos, um dos moradores mais antigos do bairro e funcionário da
Comissão de Moradores, disse à nossa reportagem que a Polícia pouco ou quase
nada faz pela segurança da população.
"Muitas vezes, quando contactados pelos moradores, a resposta da Polícia é
quase sempre a mesma: Está bem, a queixa está registada, mas de momento não
temos meios para nos dirigirmos ao local do crime”, lamentou Eduardo dos Santos.
Na visão dos moradores, no bairro da Mutamba as pessoas vivem a triste sensação
do salve-se quem puder e um forte sentimento de insegurança, por isso, quando
um bandido é apanhado, fazem justiça por mãos próprias, agredindo-os, muitas
vezes até à morte.
A título de exemplo, na última sexta-feira, data em que visitámos o bairro da
Mutamba, nos apercebemos que, na madrugada do mesmo dia, três bandidos foram
queimados pela população, até à morte, porque assaltaram, pela terceira vez,
uma cantina, que muito tem ajudado os moradores.
A crescente onda de criminalidade no bairro tem sido causada, também, pela
falta de energia eléctrica da rede pública. A corrente eléctrica das poucas
lâmpadas acesas que vimos é fornecida por postes de transformação privados, que
cobram de
Fundação do bairro custa a vida da mulher
No bairro Dangereux, localizado no Distrito Urbano da Camama, município de
Talatona, fundado em 2003, com o aparecimento das primeiras construções
definitivas, o fornecimento de energia eléctrica tende a melhorar
consideravelmente, nos últimos tempos. O bairro, que possui cerca de 500 mil
habitantes, além de usar energia fornecida por postes de transformação
privados, conta com luz da rede pública, em sistema pré-pago.
Com uma área estimada em
O major Pensamento do Povo, como é tratado por todos, atribuiu o nome Dangereux
ao bairro em homenagem ao seu tio, Paulo Silva Mucungo "Dangereux”, que,
na altura, era membro do Bureau Político do MPLA, segundo informações dele.
O bairro, que é maioritariamente habitado por pessoas oriundas da zona Leste do
país (Moxico, Lunda-Norte e Lunda-Sul), já foi campo de batalha entre invasores
de terras e parentes do major Pensamento do Povo, por este estar à frente do
processo de distribuição de terrenos a alguns militares.
O presidente da Comissão de Moradores do bairro Dangereux, o coronel das Forças
Armadas Angolanas José Henrique de Amor, contou à nossa reportagem que o facto
de o major "Pensamento do Povo” estar à frente do processo causou inveja
no seio de alguns colegas, que planearam afastá-lo.
"Um dia, de noite, enquanto o major dormia, a sua residência foi invadida
por militares e agentes da Polícia, que, também, lutavam pelo lugar, e, numa
troca de tiros, acabaram por matar a sua esposa, com duas balas na cabeça”,
disse.
Para proteger a sua vida, porque a perseguição continuava, o fundador do bairro
fugiu para a província do Moxico, sua terra natal, dando assim origem a várias
construções anárquicas no bairro Dangereux, que já conta com 19 anos de
existência.
Apesar de estar cercado por condomínios luxuosos, o bairro Dangereux, à
semelhança do bairro Mutamba, possui graves problemas sociais, como
criminalidade, falta de água potável, fraco saneamento básico, índice elevado
de pobreza e muita prostituição.
Invasão de terrenos faz "nascer" bairros
A invasão de terrenos em algumas zonas da cidade capital dá origem ao
aparecimento de novos bairros, como é o caso do bairro Rei Mandume, que existe
há 12 anos e conta com cerca de dez mil habitantes.
O bairro Rei Mandume, "adjacente” ao Estádio 11 de Novembro,
localizado no Distrito Urbano da Cidade Universitária, município de Talatona, é
habitado, maioritariamente, por jovens. No bairro, que nasceu do nada,
falta quase tudo: água, energia da rede pública e outros serviços sociais. A
maioria das crianças estuda em colégios privados e a falta de iluminação faz
nascer o sentimento de insegurança.
Segundo o presidente da Comissão de Moradores do bairro Rei Mandume, Zito
Fernando Mondo, as primeiras casas começaram a ser erguidas em 2010.
Acrescentou que o bairro conta com uma área de mais de
"Temos muitos espaços livres no interior do bairro, onde podem ser
erguidas várias infra-estruturas de impacto social, que fazem muita falta, como
escolas, centros médicos, creches, parques infantis, zonas de lazer para os
jovens, entre outras, sublinhou Zito Fernando Mondo, acrescentando que
persistem os problemas de falta de água e energia eléctrica.
Zito Fernando Mondo deu a conhecer que houve alturas em que os moradores do bairro não tinham muitos problemas relacionados à falta de água, mas "actualmente, estamos a nove meses sem água, somos obrigados a ter tanques e nem todos têm condições para tal".
Explicou que já recorreram à Empresa Pública de Águas (EPAL) e, inclusive, o ministro da Energia e Águas, João Baptista Borges, visitou o bairro, há dois meses, acompanhado pela governadora de Luanda, Ana Paula de Carvalho, com o propósito de se erguerem fontenários, "mas, até hoje, nada se vê, apesar de termos escrito à direcção da EPAL, explicando que a população do bairro já consome água canalizada e não pode voltar aos chafarizes, pois seria um retrocesso, tendo em conta o contexto actual e porque vivemos no centro da cidade".
O presidente da Comissão de Moradores do bairro Rei Mandume manifestou-se, também, preocupado com os postes de transformação da rede pública, que não fornecem energia de qualidade à população. "A energia falha constantemente, o que tem causado vários constrangimentos aos moradores".
Informou que muitas famílias vivem às escuras, desde que construíram as residências, devido aos preços cobrados pelos donos dos postes de transformação. "Não temos a quem recorrer, um contrato pode custar 200 mil kwanzas, com uma mensalidade de oito mil, e ninguém tem esses valores, porque muitos até não têm emprego".
Apontou as ravinas e o excesso de areia nas vias públicas como factores que dificultam a livre circulação de pessoas e bens.
O bairro não tem nenhum posto médico público, contando, apenas, com uma clínica privada, que funciona até às 16h. "A nossa comunidade não é daquelas que têm famílias com estabilidade financeira, por isso a população recorre ao Hospital Geral e, muitas vezes, os casos agravam-se durante o percurso".
Em relação à segurança pública, Zito Fernando Mondo deu a conhecer que é estável e que, no passado, registaram-se alguns casos de criminalidade, que foram, prontamente, combatidos pela Polícia, havendo, apesar disso, a necessidade de um posto policial.
"Já houve algumas situações, mas não é tanto como em outros bairros. Tem havido alguns assaltos, devido à falta de luz nas entradas do bairro, na zona do ULENGO, da PUMANGOL e na rua da Cabine”, disse Zito Fernando Mondo.
Explicou que a recolha de lixo é deficitária, estando à vista uma lixeira, que se tornou, praticamente, no cartão de visita do bairro, que necessita de atenção especial do Governo Provincial e de verbas para o seu crescimento e melhoria da qualidade de vida da população.
"Havemos de Voltar” passou a ser Mateba
Quando Sakapopa e João Kahendjengo chegaram da província do Bié, em busca de trabalho, no município de Cacuaco, em Luanda, não lhes passou pela cabeça que algum dia haveriam de fixar residência na Barra do Bengo, que, na altura, já despontava como um sector promissor na agricultura e pesca, onde fundaram o actual bairro da Mateba.
Corriam os anos de 1980 e, atraídos pela exuberância e beleza da região, encontraram na agricultura o seu primeiro ganha-pão. Primeiro começaram a trabalhar nas lavras de nativos, que, na altura, possuíam extensas terras para o cultivo, e na criação de animais de pequeno porte.
Na altura, a zona onde se situa hoje o bairro Mateba era conhecida como
"Havemos de Voltar”, nome dado por eles, convictos de que um dia haveriam
de regressar à província de origem.
Construíram casotas precárias de pau-a-pique, cobertas com folhas de matebeira
(da espécie de palmeiras), e aos poucos o pequeno aglomerado foi recebendo mais
gente, vinda, principalmente, da província do Bié.
O tempo passava e a esperança de regressar se diluía. A única solução era
chamar as mulheres, parentes e amigos e fixar residência. Na altura o bairro
deixa de ser conhecido como Havemos de Voltar e passa a chamar-se Mateba. Ao
mesmo tempo aumenta o interesse de muitas pessoas em conseguir um espaço, para
a construção de moradias, encantadas com a tranquilidade da região.
Os donos de terras começam a vendê-las e, aos poucos, surgem no local casas de
construção definitiva. Aos trabalhadores dos campos agrícolas era-lhes dada a
possibilidade de angariarem clientes.
Aos poucos desaparecem os trabalhos de campo e a pesca é fomentada, surgindo na
região fábricas de chatas.
Os jovens da periferia afluem em massa à costa, atraídos pela actividade da pesca, e, ao mesmo tempo, o negócio da venda de terrenos ganha nova dinâmica. Cada vez mais gente começa a procurar terrenos e aparece a figura do intermediário. O bairro cresceu com residências de carácter definitivo e desapareceram os casebres de pau-a-pique.
A zona, antes pacata, começa a ser frequentada por um maior número de pessoas.
Em 2006 já eram notáveis várias residências de construção definitiva.
Em
Com o crescimento da actividade piscatória, o bairro se estendeu ao actual bairro
Emanuel, que se prolonga até ao bairro dos Pescadores II.
Hoje, o bairro da Mateba, localizado na região antes do bairro da Barra do
Bengo, a Nordeste da vila de Cacuaco, conta com 4.991 habitantes, na sua
maioria pescadores e camponeses.
Notabiliza-se pela sua posição estratégica, que o torna o maior centro de pesca tradicional, limitando-se a Norte pela Barra do Bengo, a Sul pelos bairros dos Pescadores II e Emanuel, a Oeste pelo mar e a Nordeste pela vila de Cacuaco. É banhado, também, pelo mar, ao Oeste.
No princípio, os fundadores do bairro tinham, apenas, a intenção de trabalhar, amealhar algum dinheiro para mais tarde regressar à terra natal, para se juntar às famílias. Porém, as circunstâncias os obrigaram a fixar residência e, aos poucos, foram chamando parentes, mulheres, amigos e demais familiares.
De acordo com o mais velho António Correia, a maior parte dos moradores do
bairro, além do trabalho agrícola, aprendeu, também, a arte da pesca e as
mulheres dedicam-se à confecção de bebidas caseiras, como kimbombo, macau e
kissarra, feitas de fuba de milho e massambala, vendidas no mercado do Kikolo.
O crescimento do bairro Mateba deve-se à chegada de populares vindos dos
bairros da Petrangol, São Pedro da Barra, Sambizanga, Boa Vista, etc. Vários
coordenadores passaram pelo bairro, sendo o primeiro o mais velho João
Kahenjengo, mais tarde o mais velho António Correia Gomes, que, por razões de
saúde, cedeu o lugar a Domingos Luciano, que viria, também, a deixar o cargo
por questões de saúde.
Os mais velhos António Correia e António Luciano contam que Mateba daquele
tempo nada tem a ver com o actual bairro. Hoje, o bairro cresceu, alberga muita
gente nova com culturas e origens diferentes. "Antes vivíamos como irmãos,
família. O bairro era tranquilo, as pessoas dedicavam-se cada um à sua
actividade, vivíamos felizes”, desabafou António Correia.
Já o mais velho Domingos Luciano lembra, com saudades, o tempo que já se foi,
afirmando que muitos que moram hoje no bairro foram atraídos pelas belas praias,
as áreas turísticas da contra costa, a actividade da pesca, além da
tranquilidade.
Imensas dificuldades
O crescimento do bairro trouxe, também, a elevada taxa de delinquência. José Domingos Bonga, morador, afirmou que, por causa da alta taxa da delinquência,
muitos habitantes deixaram as casas e abandonaram alguns haveres.
"Antes qualquer cidadão podia circular, dormir à vontade, o bairro tinha
pouca gente, ao contrário dos dias de hoje, em que, a partir das 17 horas,
circula-se com medo de ser assaltado em qualquer esquina ou ruela”, salientou.
Acrescentou que todos conhecem os bandidos e os que tentaram denunciá-los tiveram problemas com os pais ou parentes dos marginais.
Por seu turno, Domingos de Lemos, outro residente, mostra-se agastado com a onda de delinquência e solicita um encontro urgente entre a população e o comandante municipal da Polícia, porque é de opinião que a situação ficou mais difícil de controlar nos últimos meses.
"Os jovens assaltam a população em plena luz do dia, fumam liamba em
qualquer esquina, por 50 kwanzas você pode ser esfaqueado, assim vamos viver
como no bairro”, disse o ancião, realçando que os crimes são frequentes e a
partir das 17 horas já se circula com muita cautela. "A população vive
apavorada".
Saneamento básico
Os mais velhos que falaram para a reportagem do Jornal de Angola consideram que
o bairro carece de saneamento básico e, quando chove, as ruas ficam totalmente
alagadas, por falta de valas de drenagem.
Outro caso apontado é a questão do lixo. Queixam-se, ainda, de alguns
amontoados de lixo, que se verificam em algumas ruas do bairro, à excepção da
rua principal, onde é recolhido todos os dias, por uma das operadoras de
limpeza do município de Cacuaco.
O actual coordenador do bairro, Álvaro Simão Lisboa, aponta, também, as
inundações que se verificam em épocas de chuva, deixando muitas famílias sem
abrigo e sem haveres.
"Todos os anos o cenário é o mesmo, quando chove o bairro torna-se inacessível,
quase que ninguém consegue sair de casa devido às lagoas, que tomam conta de
quase todas as ruas do bairro.
Como resultado das últimas chuvas que se abateram sobre a região, que inundaram
e destruíram várias residências, ainda são visíveis charcos de água parada em
algumas ruas, provocando muitos mosquitos. "Temos esperança de que, a
partir deste ano, alguma coisa venha a mudar, tendo em conta as promessas
feitas pelo administrador municipal, na última visita que efectuou a este
sector de Cacuaco”, referiu o jovem que se encontra à frente da coordenação do
bairro, há sensivelmente dois anos.
No bairro da Mateba, precisa-se de escolas, não existe nenhum hospital, o único
centro de saúde atende, também, os bairros dos Pecasdores II e Emanuel, bem como
a população da Barra do Bengo e até moradores vindos dos bairros da Vidrul.
De acordo com o coordenador, existem, por parte da Administração local, vários
projectos a serem executados ao longo deste ano, no âmbito do Plano Integrado
de Intervenção nos Municípios (PIIM), entre os quais a construção de uma
escola, no bairro Emanuel, para servir, também, as crianças da Mateba.
Outro projecto, de acordo com Álvaro Lisboa, prende-se com o melhoramento das
três vias de acesso ao bairro, que vão ser asfaltadas, prevendo-se, também,
valas de drenagem.
A limpeza das valas de drenagem e a colocação de postes de iluminação pública
constam, também, dos projectos anunciados pela Administração Municipal.
17 de Setembro carece de mais infra-estruturas
O bairro 17 de Setembro, no projecto Nova Urbanização, em Cacuaco, província de
Luanda, seria, sem dúvida, o cartão postal do município, a julgar pela sua
projecção, caso as autoridades acompanhassem o seu crescimento em termos de
infra-estruturas sociais. Nasceu em 1997, data em que foi lançado o projecto
que contemplava habitações de alto, médio e pequeno padrão, por iniciativa do
então administrador Agostinho Miguel Lima e Aníbal Rocha à frente do Governo da
província de Luanda.
Situado nos dois lados da Via Expressa, a partir da sua entrada no sentido
Cacua-co/Benfica, o projecto delimita-se até à estrada da Nova Cimangola,
passando pelo SIAC/Cacuaco e desemboca na via que liga à Recolix, in-terligando
à rua que parte dessa linha em direcção ao Hospital Municipal.
Na altura do lançamento, o projecto contemplava mil lotes devidamente
talhonados para a construção de habitações de alta, média e baixa renda, áreas
para construção de edifícios até três andares, zonas reservadas para
instituições bancárias, quadras desportivas multiuso e locais para actividades
comunitárias.
O projecto conta com áreas para actividades comerciais e ruas com
Depois de momentos de graça, que se seguiram à apresentação do referido
projecto, o bairro estagnou. Todos os planos ficaram sem "pernas” para
andar, o que criou uma carência de várias infra-estruturas sociais, tais como
escolas, áreas de lazer e vias estruturantes.
O bairro conta, apenas, com três vias construídas, designadamente do Hospital
Municipal (feita em betão), da zona interior da Vidrul, que liga a Via Expressa
ao SIAC, até à Nova Cimangola, e a da Crisgunza, feita com fundos privados
(ambas asfaltadas).
Quanto às demais, atendendo à tipologia dos solos que são argilosos, são
intransitáveis em tempo chuvoso. A falta de água no referido bairro agrava
ainda mais a preocupação dos moradores, que se vêem obrigados a abandonar as
suas residências à procura de novas habitações nas centralidades.
Para melhores esclarecimentos, o Jornal de Angola ouviu Miguel Lima, que na
altura em que surgiu o bairro era administrador de Ca-cuaco, que contava,
apenas, com o chamado bairro da Ecocampo, formalmente conhecido como bairro 4
de Fevereiro, uma pequena urbanização que surgiu em 1986. "Olhando para a
zona de Cacuaco, que na altura contava apenas com uma rua, por sinal a
nacional, nos finais de 1990, surgiu-nos a ideia de criar uma urbanização com a
dimensão e condições de habitabilidade aceitáveis. Foi assim que convidei um
grupo de jovens que acabavam de chegar de Cuba, com formação média de arquitectura,
e que residiam na Casa do Desportista, na Ilha de Luanda, para projectarmos o
bairro, que hoje tem o nome de 17 de Setembro”, contou.
Para o antigo administrador, as grandes dificuldades prendem-se com a falta de
água, terraplanagem das vias, escolas públicas e saneamento básico.
Quanto à origem do nome 17 de Setembro, Agostinho Lima conta que sempre nutriu
simpatia pelo primeiro Presidente de Angola, Agostinho Neto, razão pela qual,
em concordância com outras individualidades, atribuiu-se a data do seu
nascimento ao bairro, que coincidiu precisamente com o dia do lançamento do
projecto.
Moradores agastados com a fábrica de blocos
A poluição sonora e ambiental provocada pela fábrica de blocos existente logo
no início da Via Expressa, a escassos metros de várias residências, tem vindo a
criar transtornos aos moradores daquele perímetro.
Yaba Rosinho, de mais de 60 anos, morador daquele bairro há quase 20 anos, disse ao Jornal de Angola que, além da poluição sonora provocada pelo barulho das máquinas, eles convivem, também, com a ambiental, criada pela poeira do cimento, o que pode causar problemas respiratórios. Apela às autoridades de direito para a tomada de uma decisão, com vista a solucionar o problema.
"Escolhemos este bairro para viver até aos últimos dias das nossas vidas,
mas alguém entendeu instalar aqui, numa zona residencial e já habitada, uma
fábrica de blocos para tirar o nosso sossego e nos criar problemas de saúde”,
disse, visivelmente insatisfeito.
Yaba Rosinho acrescenta que, além dos transtornos acima referidos, a fábrica
tem criado outros inconvenientes aos moradores, com a ligação da energia que
alimenta aquela unidade fabril à mesma rede que abastece as residências.
Segundo ele, isso tem provocado uma sobrecarga que resulta em queima de
fusíveis no PT e electrodomésticos nas residências, pelo que os moradores
daquela circunscrição apelam à ENDE para se por cobro a esta situação, que vem
criando muitos danos.
Bairro está mergulhado em mar de dificuldades
Os problemas causados pela falta de saneamento básico, de escolas do ensino de
base, água, iluminação pública e esquadras policiais continuam a marcar o
dia-a-dia dos moradores do bairro 17 de Setembro.
Ruas esburacadas, muitas delas cobertas de lama, sem valas de drenagem, e lixo
espalhado por todos os cantos, por falta de recolha, são o cenário que se
assiste, sobretudo quando "São Pedro” abre as torneiras, altura em que a
situação degrada-se mais, pois ninguém consegue sair de casa, nem mesmo a pé.
Rita António, uma das primeiras moradoras daquele bairro, explicou à nossa
reportagem que por causa das péssimas condições das ruas, sobretudo em tempo de
chuva, muitos dos seus vizinhos abandonaram o bairro.
A falta de escolas primárias, de agua, de terraplenagem das ruas, bem como os terrenos abandonados são, entre outras, as grandes inquietações dos moradores.
André Wankunku, de 62 anos, professor de profissão e residente há mais de 20
ano no bairro, corrobora da ideia dos restantes moradores e reafirma a falta de
escolas públicas, esquadra policial, terraplanagem das vias de acesso,
iluminação pública, água, recolha de lixo, assim como a reconstrução da ponte
das Madres como as principais dificuldades.
"Descaracterização de Luanda resulta da falta de autoridade”
O arquitecto António Gameiro considera que a descaracterização da cidade de Luanda "resulta de al-guma falta de poder e autoridade das administrações municipais”.
"Isso é falta de poder. Se tens poder e não exerces é o mesmo que não ter”, afirmou, acrescentando que, para corrigir essa situação, "é preciso apenas seguir e implementar os instrumentos legais que regem as políticas do ordenamento do território”.
Numa entrevista ao Jornal Metropolitano de Luanda, publicada ontem, António
Gameiro afirmou que as questões do ordenamento do território "ficaram,
praticamente, em banho-maria”, desde que se juntou essa área às Obras Públicas.
Para o arquitecto, não há nada em fase de implementação, apesar da
transferência para o actual Ministério das Obras Públicas e Ordenamento do
Território de todos os dossiers sobre a matéria em questão. "Ele está lá,
mas é lógico que do ponto de vista do ordenamento do território não se sente
nada.
Ordenamento do território é consciência, visão estratégica e desenvolvimento. É
impossível desenvolver um país se não houver ordenamento do território”,
explicou, acrescentando que "ordenamento do território é aplicação daquilo
que são as políticas económicas e sociais, urbanísticas, am-bientais, de um
determinado território. Tem que ver com localização, organização e a gestão
correcta das actividades humanas”.
Apesar das críticas, António Gameiro sublinhou que "não foi um erro”
juntar os dois sectores, mas lamentou o facto das políticas sobre ordenamento
do território terem parado. "As coisas pararam, só se fala de habitação.
Mas esquecem-se que para haver habitação tem que haver políticas de ordenamento
do território.
No país fala-se muito das ravinas, mas parece não haver consciência de
que, para evitar o seu surgimento é necessário o ordenamento do território,
pois é através dele que se torna possível a instalação dos principais serviços
sociais, como sa-neamento básico, fornecimento de água e energia, a construção
de estradas, entre outros”.
António Gameiro admite "não ser fácil” gerir uma cidade com cerca de dez
milhões de pessoas, das quais mais de 80 por cento na periferia, com graves
problemas de saneamento básico, fornecimento de energia e água canalizada,
estradas, ordenamento do território, entre outros problemas.
Face ao estado actual da capital, há quem defenda a destruição da cidade como
solução para os problemas. António Gameiro mostrou-se contrário a essa ideia,
justificando que "a própria ciência desaconselha esse tipo de saídas”.
"Quando se pensa em destruição de uma certa região é preciso ter em
atenção o factor humano, porque destruir uma região é o mesmo que destruir o
tecido sociocultural e os laços de uma determinada comunidade, o que não é bom
para a memória colectiva”, sublinhou.
O arquitecto defende uma solução que passa pela "introdução de melhorias
paulatinas nas áreas críticas”, com infra-estruturas, equipamentos e serviços.
"Destruir apenas quando já não houver outras alternativas”, frisou.
O Plano Director para o desenvolvimento da cidade, lembrou, foi pensado como um
documento orientador, onde foi definido o que deve ser o ordenamento do
território, as áreas de investimento e as áreas específicas de intervenção.
Embora reconheça que esse Plano Director "tem boas coisas”, António
Gameiro afirmou "não estar de acordo com tudo”.
"Sem querer desvalorizar o que foi feito, preferia atribuir maior valor se
o projecto fosse elaborado cá mais abaixo, a partir dos municípios, ou seja,
Plano Director Municipal”, disse.
Para justificar a sua posição, o arquitecto apontou como exemplos os casos dos
municípios do Icolo e Bengo e Cazenga, cujas realidades são amplamente
díspares. "Icolo e Bengo é um município rural, na sua essência. Cazenga
não. Cazenga é um município com uma determinada população, com determinado tipo
de ocupação. Ao contrário do Cazenga, no Icolo e Bengo posso partir com
soluções livres, liberto de qualquer interferência e dar qualidade que quiser.
Ali, posso perfeitamente desenhar, pensar e implementar um plano sui-generis”,
explicou.
António Gameiro é de opinião que o Plano Director de Luanda devia ser mais
inclusivo, com a entrada no mercado de um sector terciário, integrado por
agentes privados e cooperativas. Para o arquitecto, a responsabilidade do
Estado deve incidir apenas na elaboração e na construção das infra-estruturas,
como estradas, pontes, transporte de energia, água, caminho-de-ferro e muitos
outros.
Por outro lado, lamentou a inexistência de um programa de autoconstrução
dirigida, com assistência técnica de um engenheiro ou arquitecto, pago pelo
Governo.
"Está previsto, mas na prática não existe. Em várias partes do
mundo, esse sistema de autoconstrução dirigida está em crescimento, constituindo
um grande auxílio para a construção de unidades habitacionais”, disse.
JORNAL DE ANGOLA
António Kilamba, Alexa Sonhi, Alberto Quiluta, António
Canepa/Cacuaco, Avelino Umba | Cacuaco e António Pimenta
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