Os tempos eram de vacas magras e de peste, até para os ricos. Os rios deixaram de correr e os pássaros de cantar. A fome era tanta que até os macacos ficavam paralisados no alto das árvores. Os que tinham ouro ficaram pobres, porque o metal precioso ficou lata. Os que tinham dinheiro perderam tudo, porque um pouco de água custava uma fortuna. Apenas o Milhafre Milionário que vivia no alto das montanhas que cercam o Maiombe tinha fortuna, porque a escondeu entre os rochedos pontiagudos onde fez ninho.
O Sol empobrecia todos os dias e lançava sobre a Terra uma luz andrajosa que não iluminava. Estava a dar as últimas. Até que a Lua lhe disse que o Milhafre Milionário era senhor de uma grande fortuna, que escondia nos rochedos da mais alta montanha de Cabinda. Então desceu lá das alturas e encontrou a ave de rapina comendo restos de perdiz.
- Milhafre Milionário, estou muito pobre e já não tenho forças para iluminar a Terra! Podes emprestar-me algum dinheiro? Confia em mim, todo o mundo sabe que não há melhor pagador do que eu.
- Sol, tu que és grandioso como um rei, só me pedes dinheiro porque a vida está péssima. Empresto-te a quantia que quiseres, mas tens que me devolver o empréstimo na próxima Lua Cheia.
O Sol aceitou a proposta e saiu do Maiombe com tanto dinheiro, que as moedas de ouro e prata arrancavam chispas de luz no rio Chiloango.
Quando chegou a Lua Cheia, o Milhafre Milionário preparou um banquete para receber o Sol. Bom pagador como era, não ia faltar ao prometido. Mas as horas do dia escoaram-se e ninguém apareceu.
No dia seguinte, bem cedo, o Milhafre Milionário saiu do ninho e voou em direcção à casa do Sol. Voou, voou, mas não conseguiu encontrar o devedor. No dia seguinte, nova viagem até aos confins da Terra. Passou o grande rio Zaire, ficou a descansar no alto de uma muanza nas margens do rio Mbridge. Ali pernoitou. Voou de novo, até ao mar do Ambriz. Depois desceu até à ilha do Zimbo. Até que encontrou o Sol, poisado nas águas da Barra do Cuanza.- Sol, tu és bom pagador, mas faltaste ao prometido. Quando me pagas a dívida?
- Sim, eu sou bom pagador e vais receber em dobro o que me emprestaste, mas tens que ir receber a minha casa. Eu não pago dívidas na rua.
Dito isto, desapareceu nas águas e caiu subitamente a noite. O Milhafre Milionário regressou a casa furioso com o Sol. Foi caçar para junto da aldeia e encontrou o Galo.
- Tu que sabes tudo, podes dizer-me onde fica a casa do Sol? – Perguntou o Milhafre.
- Diz-me primeiro em que direcção procuraste a casa do Sol.
- Parti a voar, desde o Maiombe até à Barra do Cuanza, onde o encontrei em cima das águas, a descansar.
O Galo começou a rir:
- Kiekie-kiekie, kiekie-kiekie. Coitado de ti! Vou ensinar-te o caminho para casa do Sol. Voltas as costas para o Poente e à tua frente está a casa do Sol. Mas tens que ir muito cedo, porque ele lava a cara e sai de casa quando eu canto pela primeira vez em cada amanhecer.
O Milhafre Milionário agradeceu ao Galo e na madrugada seguinte voou em direcção ao Nascente, sempre com o Poente pelas costas. Quando chegou ao destino, estava o Sol lavado e vestido com um manto de ouro, pronto a sair de casa.
- Milhafre Milionário, quem te indicou o caminho da minha casa?
- Foi o Galo da minha aldeia que canta em cada dia, quando tu lavas a cara.
O Sol desta vez cumpriu a
promessa e pagou a dívida
- A partir de hoje comes todos os galos que puderes, as galinhas e os pintainhos. Se não cumprires, derreto todo o teu dinheiro e faço de ti um carvão.
O Milhafre regressou a casa e desde então, passa a vida a comer galos, galinhas e pintainhos.
Bukua bu nbongo bupodico cubufiataco. Os ricos não são de fiar!
*Esta história foi-me contada por José Casimiro em Cabinda
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