SIM, ESTAMOS TODOS EM GUERRA

Miguel Prado | Expresso (curto)

Bom dia.

É com a frase com que o primeiro-ministro arrancou a sua entrevista à TVI sobre o pacote de apoios às famílias que lhe lanço este Curto. Sim, estamos todos em guerra. Uns mais que outros, é verdade. Mas por cá António Costa já percebeu que tem de assumir como sua a guerra comunicacional, porque os primeiros tiros do pacote talvez não tenham sido tão certeiros quanto esperava. Insistiu agora que “não há truque nas pensões”.

Em reação à entrevista, o antigo ministro das Finanças Fernando Teixeira dos Santos não foi meigo. Falando à CNN Portugal, qualificou a forma como António Costa comunicou sobre as pensões como “desastrada e desastrosa”. “Não foi claro. Essa falta de clareza está a fazê-lo pagar um preço político, porque deixou uma incerteza enorme quanto ao que irá ser a evolução das pensões além de 2023”, comentou Teixeira dos Santos.

António Costa defendeu a bondade da antecipação de parte da atualização de 2023 sob a forma de meia pensão a distribuir em outubro. “Não podíamos transformar esta inflação atípica e extraordinária num efeito permanente”, sublinhou, na defesa das medidas para mitigar a perda de poder de compra. O que o primeiro-ministro não disse, mas disse-o Teixeira dos Santos, é que no próximo ano a inflação até pode baixar para zero por cento que os preços ficam no nível onde estão hoje, inflacionados por largos meses de aumentos históricos de preços.

E não é que o primeiro-ministro tenha sido apanhado de surpresa para agora avançar com uma atualização das pensões em molde diferente do que vinha sendo seguido e que reiterou ainda em junho. Os preços vêm subindo já desde o final do ano passado, empurrados pelo custo galopante da energia, e em maio deste ano, como aqui escrevemos no Expresso, já era praticamente certo que em 2023 as pensões teriam um aumento histórico, devido à inflação.

Sim, estamos todos em guerra. Até o líder da oposição, sabendo que tem pela frente uma longa temporada para lidar com um PS maioritário. Luís Montenegro, criticando as “habilidades” de António Costa, comentou que a atribuição de meia pensão em outubro “é de uma injustiça gritante”, por antecipar mais dinheiro aos pensionistas ricos do que aos pobres para fazer face ao disparo dos preços. Na análise à entrevista do primeiro-ministro, pode ouvir este episódio do podcast Expresso da Manhã, acabado de sair. E ainda a opinião de Mariana Mortágua e Cecília Meireles no debate “Linhas Vermelhas”, da SIC Notícas.

Sim, estamos todos em guerra, incluindo os que já sentiram o cinto apertar, porque a inflação é inclemente. E a subida dos juros também não perdoa. Da entrevista do primeiro-ministro esta segunda-feira ficou a nota de que “é provável que venha a haver” um apoio a quem tem crédito à habitação e arrisca vir a pagar muito mais pelo empréstimo da casa. E a garantia de que os funcionários públicos não serão “com certeza” aumentados em 7,4%. Também eles estão numa guerra, há vários anos, contra a perda de poder de compra.

A menos de um mês da apresentação do Orçamento do Estado para 2023, António Costa enfrentará várias batalhas no terreno. Para já, a educação: o primeiro-ministro abre hoje o ano letivo numa escola secundária em Évora, enquanto em Leiria terminam as jornadas parlamentares do PS, nas quais Augusto Santos Silva deixou a sua própria receita sobre como gerir uma maioria absoluta. Também o Chega realizou as suas jornadas parlamentares, em Setúbal, para as quais convidou Jorge Bacelar Gouveia e Rui Gomes da Silva.

Todos em guerra, uns mais do que outros, é verdade. Como os investigadores, que hoje apresentam na Fundação Gulbenkian, em Lisboa, um estudo sobre a investigação sobre o cancro em Portugal (num discurso ontem à noite o presidente norte-americano, Joe Biden, defendeu que acabar com o cancro deve ser um “desígnio nacional”).

Em Estrasburgo, também os comissários da Comissão Europeia estão numa guerra contra a escalada dos preços da energia e analisam hoje mais medidas para mitigar os seus efeitos (Portugal deve apresentar novas medidas na próxima quinta-feira). E em São Francisco, nos Estados Unidos, uma guerra com muitos zeros: os acionistas do Twitter votam a proposta de compra da empresa por Elon Musk por 44 mil milhões de dólares. Porque “estamos todos em guerra”, também os banqueiros travam a sua, para cativar capital: o banco suíço UBS anunciou esta manhã um aumento de 10% dos dividendos.

Pela paz, o Papa Francisco visita hoje o Cazaquistão. E, longe daí, no Brasil prossegue a campanha para as eleições presidenciais de 2 de outubro: segundo uma sondagem divulgada esta segunda-feira Lula continua na frente, com 46% das intenções de voto, contra 31% para Bolsonaro.

Como a arena política, também o mercado do entretenimento é toda uma guerra, em busca de audiências, palcos, prémios e brilho. Enquanto dormia foram anunciados os vencedores dos Emmys (a cerimónia foi transmitida na SIC Caras e pode ver a lista completa de quem ganhou aqui). E porque, fora do mundo dos galardões dourados, a atualidade prossegue, deixo-lhe ainda uma mão cheia de outras sugestões de leitura.

OUTRAS NOTÍCIAS

Guerra. Com a Ucrânia a reconquistar em modo acelerado uma boa parte do território que a Rússia tinha ocupado, damos-lhe conta de que uma petição de autarcas a pedir a demissão de Putin já recolheu 35 assinaturas. Pode continuar a acompanhar a cobertura da guerra na Ucrânia e o noticiário relacionado minuto a minuto no Expresso.

Reino Unido. Após a morte da rainha Isabel II, quais os desafios para Carlos III? Neste artigo analisamos o que o novo rei tem pela frente, com os contributos de Germano Almeida, Francisco Seixas da Costa e Paulo Almeida Sande.

Liga dos Campeões. O Futebol Clube do Porto recebe hoje no Estádio do Dragão o Club Brugge, enquanto o Sporting recebe em Alvalade o Tottenham. O treinador Sérgio Conceição já fez a antevisão da partida e Ruben Amorim também.

Abusos. D. José Policarpo deu ou não autorização para o padre Inácio trocar Lisboa pelo Algarve? Há versões contraditórias em 2013 e em 2022. Saiba mais aqui.

Economia. O Instituto Nacional de Estatística reviu em baixa a inflação de agosto para 8,9%, depois de uma primeira estimativa apontar para os 9%. Recorde-se que em julho a inflação em Portugal tinha ascendido a 9,1%. E aqui contamos-lhe que na última decisão do BCE, que trouxe um histórico aumento de juros, Mário Centeno ficou de fora da votação.

FRASES

“Não temos de nos preocupar com a oposição porque não somos oposição, somos Governo”

Augusto Santos Silva, presidente da Assembleia da República, nas jornadas parlamentares do PS

“Não há truque nenhum [com a atualização das pensões], nem de retórica nem de coisa nenhuma. O que há é transparência e clareza”

António Costa, primeiro-ministro, em entrevista à TVI / CNN Portugal

“Continuamos pacientes, mas também permanecemos claros: o Irão deve ser impedido de poder obter armas nucleares”

Olaf Scholz, chanceler alemão, após reunião com o primeiro-ministro israelita

“Desde o início de setembro, os nossos combatentes libertaram mais de seis mil quilómetros quadrados do território da Ucrânia, no sul e no leste”

Volodymyr Zelensky, presidente da Ucrânia, citado pela Reuters

PODCASTS A NÃO PERDER

Porque nos faltam professores? Daniel Oliveira entrevista o ministro da Educação na semana em que se inicia um novo ano letivo. "No tempo da troika saíram da profissão mais de 30 mil professores", sublinha João Costa. Uma conversa a não perder no podcast PERGUNTAR NÃO OFENDE

Um Reino pouco Unido e órfão de Isabel II Com o Reino Unido de luto pela rainha que mais tempo ocupou o trono, os grandes desafios mantêm-se: coesão do país, relação com a União Europeia e crise do custo de vida vão marcar o início do reinado de Carlos III e do Governo da primeira-ministra Liz Truss. Para ouvir no podcast O MUNDO A SEUS PÉS

As empregadas de limpeza são invisíveis? Aos 28 anos, a jornalista Rita Pereira Carvalho escreveu o livro “As Invisíveis - Histórias sobre o trabalho da limpeza” e é precisamente sobre esse tema, e todos os preconceitos a ele associados, que fala no podcast AS MULHERES NÃO EXISTEM

O QUE ANDO A VER

Há quem não suporte grandes multidões, mas os fenómenos de massas providenciam abundante matéria de estudo sociológico. A reedição, em 1999, do festival Woodstock, 30 anos depois do mítico evento musical norte-americano, não correu bem, transformando o espírito fundador de paz e amor num rasto de raiva e destruição. Algumas das estrelas do firmamento musical da década de 1990 recordam o que aconteceu, juntamente com organizadores e festivaleiros, no documentário “Fiasco total” (“Trainwreck: Woodstock 99”), repartido em três episódios, na Netflix.

Este Curto termina aqui, mas pode seguir viagem com o Expresso na atualidade noticiosa, que lhe trazemos à distância de um clique. Votos de uma boa terça-feira, repleta de boa energia.

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