CRIME, ESCLAVAGISMO E MISÉRIA - Nos últimos dias tem sido notícia a situação de crise e abandono que estão milhares de timorenses em Portugal, trazidos por redes criminosas para trabalhar no setor agrícola
O secretário-geral da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) pediu hoje o fim da atribuição de vistos a timorenses para impedir situações de miséria e abandono dos imigrantes em Portugal.
Em entrevista à Lusa em Lisboa,
Mari Alkatiri, que coordena a plataforma que sustenta o governo timorense,
considerou que, “em Timor-Leste, se deve travar esta onda de procura de
vida fora do país, enquanto não houver um acordo de alto nível entre governos
para acomodar isso”.
Nos últimos dias tem sido notícia a situação de crise e abandono que estão
milhares de timorenses em Portugal, trazidos por redes criminosas para
trabalhar no setor agrícola, uma situação social que já motivou pedidos de
apoios de várias autarquias.
Trata-se de uma situação “chocante” que tem sido tema nos contactos feitos em
Portugal com os governantes portugueses, admitiu Mari Alkatiri.
“Eu acho que primeiro tem que haver um acordo-quadro entre Portugal e
Timor-Leste” que complemente o “acordo de mobilidade dentro da Comunidade dos
Países de Língua Portuguesa (CPLP)” com a atribuição de vistos de trabalho.
“A mobilidade, apenas, não resolve porque quando os timorenses chegam a
Portugal como é que podem ficar? Como se acomodam? Como ficam em condições
legais para procurar emprego?”, questionou o líder da Fretilin, que elogiou a
nova legislação portuguesa que dá um prazo de seis meses aos cidadãos da CPLP
para tentarem obter trabalho.
“Isso não é suficiente, mas já é um passo positivo que o Governo português
tomou”, mas “o fundamental é suspender a vinda deles [dos timorenses] agora”.
Depois, é necessário que Timor-Leste dê “formação adequada a quem quer
emigrar”, com “treinos vocacionais e profissionais” que correspondam a
necessidades dos países de destino.
Para Mari Alkatiri, esta vontade de emigrar dos timorenses mostra que “há uma
juventude que perdeu a esperança” no futuro do país, que “já não vive da
nostalgia do período da restauração da independência” e “quer um futuro
concreto”.
Para tal, é necessário também que os políticos timorenses façam pactos de
regime que promovam o bem-estar a médio prazo e correspondam aos anseios da
população.
E isso implica que os principais partidos, Fretilin e Conselho Nacional de
Resistência Timorense (CNRT, de Xanana Gusmão) concordem nas linhas de
desenvolvimento.
“Defendo, há muito, consensos políticos que são essenciais para países
pequenos” mas, em Timor-Leste, “há muitos mitos e o mais forte deles é o do
dinheiro” que prejudica os acordos.
Em Timor-Leste, “há uma certa nostalgia que é a figura do Xanana” que marca uma
“forma de fazer política” no país, afirmou Alkatiri, acrescentando: “O Xanana
conhece muito bem o povo e sabe como explorar parte dessa falta de informação”
em “benefício de alguns.
Atualmente, o CNRT e a Fretilin não conseguem, isolados, ganhar o poder e
depois existem “aqueles partidos pequenos” que “ainda continuam a proliferar” e
que garantem o equilíbrio do poder.
“O mito em Timor-Leste já não é Xanana, o mito em Timor-Leste é o dinheiro” e
“assim se faz também política”, comentou Mari Alkatiri, que elogiou o trabalho
do Presidente, José Ramos-Horta, que derrotou o candidato da Fretilin.
“Não haverá em Timor-Leste tão cedo um Presidente para todos os timorenses, mas
ele está a fazer esforço nesse sentido” e tem sido um chefe de Estado “aberto
ao diálogo, um diplomata, que privilegia as relações internacionais e nesse
momento está a procurar intervir um pouco mais em cooperação com o Governo, na
questão das questões internas de desenvolvimento”, afirmou Mari Alkatiri, que
minimizou o risco de uma dissolução do governo, liderado por Matan Ruak, que
chegou a ser uma promessa de campanha eleitoral.
“Eu nunca acreditei nesse slogan da campanha”, disse Mari Alkatiri.
RTP | Lusa | Imagem: Manuel de Almeida - Lusa
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