quarta-feira, 5 de outubro de 2022

PEDOFILIA: PREVENIR MAIS QUE REMEDIAR

Adalberto Dias De Carvalho* | Jornal de Notícias | opinião

A identidade de cada um de nós decorre em larga medida das experiências e representações da criança que fomos, sendo que, por isso, olhamo-nos e olhamos a nossa infância, também em larga medida, com os olhos da criança que fomos, a qual constitui o solo do nosso ser como pessoas.

A pedofilia, ao constituir uma usurpação dos sentimentos e das expectativas infantis, é um atentado contra a intimidade da criança. Atentado que perturba a harmonia psicológica, física e social da criança e, a partir daí, todo o processo de construção da estabilidade afetiva do adulto em formação. A criança surpreendida pela pedofilia é um ser indefeso, inclusive nos seus ímpetos afetivos que por vezes os pedófilos tentam usar como atenuante para os seus atos. Outras vezes, procuram a desculpa nos costumes de épocas passadas, mas sejamos claros: sabemos bem que os atos pedófilos são sempre protagonizados e encobertos por estratégias de dominação e corrupção.

O pedófilo é um indivíduo portador de graves desequilíbrios inatos e/ou adquiridos. Em qualquer das circunstâncias, a pedofilia, porque atinge a vida de inocentes, normalmente em situação de subalternidade, é um crime. No mínimo, perante as vítimas, não há justificação que a possa desculpar Trata-se de um crime sem perdão ou cujo perdão, mesmo que discricionariamente concedido, não iliba o crime.

Podemos, isso sim, fazer tudo o que for possível para prevenir o futuro.

O caso da Igreja Católica é aqui particularmente importante, atendendo não só ao extraordinário número de casos de que agora temos conhecimento, mas igualmente por se tratar da instituição que, pregando a moral que de uma forma ou de outra impregna a nossa cultura, tem como princípio o de que os outros, enquanto criaturas de Deus, sendo os nossos próximos, nos obrigam ao maior respeito para com eles.

Se é incontornável a necessidade de julgar os sacerdotes prevaricadores através das mesmas leis a que estão sujeitos todos os outros cidadãos, sem prejuízo da aplicação interna do direito canónico, é também fundamental que se ponderem, sem tabus, as condicionantes que possam favorecer a pedofilia. Referimo-nos desde os processos de seleção dos sacerdotes até à organização das práticas de ensino e doutrinação, passando pela imposição do celibato.

*Professor do ISCET - Instituto Superior de Ciências Empresariais do Turismo e investigador do Observatório da Solidão

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