segunda-feira, 21 de novembro de 2022

Angola | SONHOS DE MANTEIGA E CORAÇÃO DE FERRO – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Não me levem a mal. Quando soube que o senhor Álvaro Sobrinho era grande accionista do Sporting fiquei muito feliz. Sou sportinguista desde Fernando Peyroteo, benfiquista desde Eusébio, adepto fervoroso do Belenenses desde Matateu, doente pelo FC Porto desde Miguel Arcanjo, indefectível do Vitória de Setúbal do Conceição, Zé Maria e Jacinto João, varzinista do coração desde o meu amigo Benje o melhor guarda-redes do mundo e arredores. Espero que todos os problemas que o senhor Sobrinho tem com a Justiça se esclareçam e lhe devolvam o passaporte angolano. Não quero ver ninguém na prisão, nem o Adalberto da Costa Júnior e aquele sinédrio de bandidos que o manipulam.

A natureza humana é forçosamente anti-capitalista. Abomina o anarquismo, para mal dos meus pecados que são incomensuráveis. O Homem, enquanto dignidade infinita, ser único e irrepetível, está mais para o comunitarismo, comunismo, socialismo e seus derivados.  Tanto se me dá. Continuo a sonhar com o fim do sistema que, segundo o Papa Francisco, mata! Sabem como imagino o fim do capitalismo? Convido-o para um copo num bar de hotel. Nunca se esqueçam, os melhores bares do mundo estão nos hotéis. Mas não entrem num restaurante de hotel. São Horríveis! Até a comida sabe aplástico.

O Senhor Capitalismo, meu convidado, de cartola, cifrões nos olhos e anéis nos dedos vai bebendo um bloody Mary enquanto me fala do seu sucesso. Eu, num passe de mágica, meto no copo um pemba fortíssimo. Ao quinto coquetel o monstro levanta-se e vai ao urinol. Olha desinteressado para o jacto de urina e vê que está mijando azul! Fica preocupado. O pânico dá lugar à preocupação porque sente uma vontade indómita de continuar a verter aquele rio azul.

À medida que o senhor Capitalismo urina, mais vontade tem de urinar. O urino já é um rio azul que liberta do caudal um cheiro acre. A criatura vai definhando, desaparecendo ate ficar a pontinha do pénis e tudo desaparece quando cai a última gota azul. É este fim épico que sonho para o Capitalismo.

Provavelmente só no tempo dos meus tetranetos vai acontecer. Mas faz-me bem sonhar. Quando estou com algum amigo rico, fico inquieto porque tenho medo que ele vá ao urinol e desapareça quando cair a última gota de urina. Nesses momentos desejo ardentemente que o meu sonho dourado não se realize. Os amigos são-no em todas as ocasiões e circunstâncias.

Amigo de ricos? Sim, sou. Mas são todos angolanos. Também sou amigo de padres, bispos e cardeais. Considero o Papa Francisco o único líder mundial com cabeça tronco e membros. Pensa. Fala. Ama a Humanidade. É cá dos meus. Tive uma grande admiração pelo padre Franklin, que foi meu professor no Liceu Salvador Correia. Pelo padre Muaka, meu professor no Colégio das Beiras. 

O cónego Apolónio, com quem falei esta semana por gentileza de um amigo comum, é um amigo. Grande Homem. Grande Angolano. Mas fiquei triste. Disse-me que o seu projecto educacional na Centralidade de Cacuaco está podre, como o Estádio Nacional 11 de Novembro. Fiz ao cónego Apolinário uma entrevista notável. Um dia vou procurar o texto e mando-vos. Entrevistei para a Emissora Oficial de Angola (RNA) o padre Alexandre do Nascimento quando o Instituto Pio XII entrou em grandes convulsões, no ano de 1974. Desde então nutro por ele imensa consideração e respeito. O nosso Cardeal. Entrevistei o arcebispo D. Filomeno Vieira Dias, jornalista. Um angolano de eleição ao qual muito devemos.

Entrevistei o arcebispo D. Hélder Câmara, brasileiro, que enfrentou corajosamente a ditadura militar brasileira. Fui colega de Redacção do cónego Rui Osório e do padre Mário de Oliveira, dois grandes jornalistas portugueses. Ambos se esforçaram para eu fazer as pazes com deus mas falharam. O conflito é insanável tal como o Angualusa tem um conflito insanável com a gramática. Grande escritório. A Luzia Moniz é uma tremenda escritória. Agora lembrei-me de Karl Kraus que, pesaroso, concluiu que o mercado estava sem jornalistas porque tinham ido todos para escriturários. Um dia estava bem-disposto e escreveu na Die Fackel que o jornalismo é o serviço militar dos poetas. Menos mal.

Margareth Nanga é investigadora de Direitos Humanos. Entrevistada pela CNN Portugal, parceira da TPA, afirmou que “Isabel dos Santos cometeu muitos crimes que têm uma dimensão transnacional”. Por isso, “tem de ser detida e vir a Angola esclarecer tudo”.  

Espero que a investigadora do Miala não leve a mal se lhe disser que no elenco dos Direitos Humanos está um que é marca do Estado Democrático e de Direito: A presunção de inocência, até uma sentença transitar em julgado. 

A PGR não condena. O Ministério Público é uma parte igual e com a mesma dignidade da Defesa. Em democracia, que eu saiba, os julgamentos ainda não são feitos nas televisões e pelas investigadoras do Miala.

A Organização Internacional da Francofonia (OIF) vai ter um novo membro observador, Angola. A entronização aconteceu hoje durante a 18ª Cimeira de Chefes de Estado e de Governo do organismo que decorre em Djerba, na Tunísia. Mais um passo importante da diplomacia à moda de Kinkuzu ou Morro da Cal.

África está a escorraçar os colonialistas franceses com grande determinação. Finalmente. Angola aproveita o momento em que outros Estados africanos se libertam dos colonialistas e vai observar os restos. Angola pediu ao presidente Macron para aderir e ele condescendeu. 

O Presidente da Costa do Marfim, Félix Houphouët-Boigny, chorava copiosamente à chegada a Paris, quando morreu De Gaulle. “Morreu o meu pai”, dizia o estadista africano. Bokassa teve a mesma reacção. Quando Macron for plantar batatas, estou a imaginar o nosso ministro Tete António chorar convulsivamente pelo seu pai, afastado do Eliseu pelo voto popular. 

Vocês pensam mesmo que o meu coração é de ferro? Tenham maneiras e se querem chorar, chorem pelos magistrados judiciais que não receberam mansões nem dez por cento dos confiscos, quando já estavam a gastar por conta.

*Jornalista

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