quarta-feira, 7 de dezembro de 2022

São Tomé e Príncipe: "Golpe de Estado é uma invenção" – entrevista a Jorge Bom Jesus

Em exclusivo à DW, o líder do maior partido da oposição, Jorge Bom Jesus, diz que o que aconteceu a 25 de novembro foi um assalto de "meliantes" a um quartel, que estará agora a ser usado para "aniquilar opositores".

Cerca de duas semanas depois da tentativa de assalto a um quartel militar em São Tomé e Príncipe, o líder do maior partido da oposição e antigo primeiro-ministro do país, Jorge Bom Jesus, nega que tenha havido uma tentativa de golpe de Estado, como anunciado pelo Governo.

Em entrevista exclusiva à DW África, o presidente do Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe/Partido Social Democrata (MLSTP/PSD) afirma que o que aconteceu foi um assalto ao quartel protagonizado por "meliantes", que está agora a ser aproveitado pelo Governo para perseguir opositores políticos.

Acrescenta que o atual governo está a transformar São Tomé e Príncipe num Estado "autocrático, autoritário e ditatorial".

DW África: Como é que o seu partido reage à tentativa de golpe de Estado que se viveu no seu país?

Jorge Bom Jesus (JBJ): Mais do que uma intentona, é uma invenção. Não foi nada mais, nada menos do que o assalto ao quartel por um grupo de meliantes, que foi aproveitado como pretexto para poder atingir e quiçá aniquilar alguns opositores políticos. Com base nisto, o MLSTP exige a demissão das altas chefias militares, sobretudo depois da demissão do chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, o brigadeiro Olinto Paquete.

DW África: No seu entender, o que é que motivaria meliantes a tentar assaltar um quartel militar?

JBJ: Esses indivíduos entraram por uma porta do quartel, certamente com a cumplicidade de outro militar. Mas muitos já acham que tudo isso foi orquestrado. Por isso, exigimos que os outros também ponham os seus cargos à disposição, porque o que aconteceu no quartel foi um verdadeiro banho de sangue, em termos de tortura, com requintes de sadismo muito agravados.

DW África: Mas acredita que este "banho de sangue" a que se refere tenha sido uma tentativa de apagar provas?

JBJ: Naturalmente, as pessoas foram eliminadas em menos de 24 horas. A isso chama-se queimar arquivos, silenciar para sempre e mesmo eliminar fisicamente os opositores.

DW África: Neste caso, os opositores correm risco de vida?

JBJ: Corremos risco de vida, corre-se risco de vida se nada for feito.

DW África: Acredita que o Governo atual tenta atingir opositores, principalmente do seu partido?

JBJ: Naturalmente do meu partido, mas também há o caso do ex-presidente da Assembleia Nacional, Delfim Neves, que foram buscar a casa. Graças à mobilização da opinião pública e dos advogados, ele escapou com vida. Estão a passar por cima dos direitos mais elementares da pessoa humana. Portanto, estamos a chamar a atenção da opinião pública e da comunidade internacional no sentido de que as investigações sejam independentes e imparciais, que sejam profundas, porque nós queremos saber a verdade.

DW África: Porque acha que o atual Governo está a perseguir o seu partido?

JBJ: Também não entendo. Nós queremos entender isso, porque, em São Tomé e Príncipe, a alternância democrática tem sido uma tradição. O próprio Governo atual ainda não completou um mês de governação. Nós estamos num país democrático em que não precisamos de violência. As instituições sempre funcionaram. Há muitos atropelos aos direitos fundamentais.

DW África: Neste momento, pela sua colocação, está a dizer que ,em menos de um mês de governação, o atual regime está a caminhar para um Estado autocrático?

JBJ: Autocrático, autoritário, ditatorial, e em São Tomé e Príncipe nós não temos essa tradição, e vamos combater por todos os meios. Naturalmente pela via pacífica. Por isso é que estamos a pedir à comunidade internacional que tenha os olhos muito focados em São Tomé e Príncipe, e que nos acompanhem.

Amós Fernando | Deutsche Welle

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