Pedro Candeias, editor de sociedade | Expresso (curto)
Bom dia,
Levante-se, dê dez passos em frente e a seguir oito à direita, faça o caminho
inverso, primeiro para trás e depois para a esquerda, até voltar ao ponto de
partida completando um retângulo imaginário.
Parabéns. Acabou de calcular aproximadamente
Eram, dizem as notícias, todos eles imigrantes asiáticos que viviam e dormiam
encostados e acotovelados uns nos outros e que trabalham não se sabe bem no
quê. Os vizinhos já tinham dado por ela; na verdade, naquela zona não faltam
casos destes e casas assim, cheias de gente em condições indignas, permeável aos subarrendamentos selvagens e à
agiotagem.
Há por ali um esquema de rendas e de moradas falsas.
Ora, o fogo foi um acontecimento extraordinário, sim, mas nada do que se
passava dentro daquelas quatro paredes surpreendeu alguém. Bastava espreitar
pelas janelas: os pequenos apartamentos e os reduzidíssimos quartos lisboetas
reconverteram-se em camaratas insalubres para imigrantes indostânicos,
explorados por compatriotas que vieram à frente.
São os mesmos que abrem as mercearias aonde vamos, que transportam a comida que
queremos e que nos transportam para onde queremos ir nas plataformas que
usamos, e os mesmos que noutros sítios apanham os mirtilos e os morangos dos nossos
pequenos-almoços. Mal-pagos, inseguros, alguns até escravizados, entorpecem-se
com drogas.
O perverso, aqui, é que isto sucede na mesma capital frequentada agora pelos
nómadas digitais de modos sofisticados, que aproveitam os seus salários para
trabalhar em coworking e viver numa cidade que (ainda) lhes é barata.
E mais perverso ainda é olhar para os números: os estrangeiros investiram 403
milhões de euros na habitação em Lisboa no ano passado; na Freguesia de Santa
Maria Maior, onde fica a Mouraria e onde fica o res do chão que ardeu, 83% do capital usado para comprar casas em 2022 proveio do
estrangeiro.
Há algo de errado aqui, uma cidade dentro de outra cidade com
diferenças cada vez mais acentuadas entre as duas, quase um lugar dickensiano,
em que a Revolução Industrial foi substituída pela Revolução Digital que também
vai deixando gente para trás. As Apps, os Bookings, os Uber, as fábricas de unicórnios, as Web Summit, os Airbnb e
os altares-palco não são para todos.
OUTRAS NOTÍCIAS
Agressão. Um imigrante nepalês foi socado e pontapeado na rua por um grupo
de jovens,
Agressão II. Alguns membros da claque No Name Boys emboscaram, encurralaram, sovaram, pontapearam e sodomizaram um jovem perto do
Estádio da Luz. Segundo as autoridades, terá sido um ajuste de contas. Um dos
suspeitos tinha uma metralhadora, uma pistola, uma faca do mato, droga e uma
marreta
Greves I
Abanão. Um violento sismo atingiu esta madrugada o sul da Turquia.
Morreram pelo menos 560 pessoas em solo turco mas também na Síria. Um castelo
construído há mais de dois mil anos pelos romanos colapsou.
Balão. O balão-espião chinês abatido pelos EUA em território
americano poderá levar a uma escalada de retórica entre as partes? Pequim
considerou o assunto “exagerado” e despropositado, e prometeu retaliar no
futuro. No passado, a China fez a mesma promessa quando Nancy Pelosi aterrou
em Taiwan, mas da retórica aos atos vão dois continentes de distância – e uma
ponte que convém não quebrar. A China recupera após a desastrosa abordagem à
Covid-19 e saiu há pouco tempo de uma inusitada maré de protestos públicos.
Terá mais em que pensar do que em balões.
Bola. O FC Porto ganhou ao Vizela (2-0) com uma exibição convincente de Taremi, o Sporting joga
esta noite em Vila do Conde e no sábado o Benfica derrotou o Casa Pia (3-0), com dois golos de João
Mário e outro de Bah.
Rodinhas. O português Gustavo Ribeiro é vice-campeão do Mundo de
Skate street. A competição decorreu em Sharjah, nos Emirados Árabes
Unidos.
Estatuetas. A norte-americana Beyoncé tornou-se a artista com mais Grammys
na história destes prémios. A noite também correu bem para Harry Styles, Ozzy
Osbourne, Rosalía, Bad Bunny, Adele, Kendrick Lamar e Wet Leg. Confira a lista dos vencedores.
FRASES
“A CGTP condenou este atentado ao direito à greve e nós apelámos também à UGT
para marcarem uma greve geral” André Pestana, líder do STOP, a pedir uma greve geral às centrais sindicais ainda este mês
“As pessoas com tendências homossexuais são filhas de Deus,
Deus ama-as e criminalizá-las é um pecado” Papa Francisco, corrigindo uma
afirmação anterior.
“Quero pedir desculpa pela reação, o Pedro Gonçalves foi o único adulto na
sala”, Rúben mea culpa Amorim, treinador do Sporting
PODCASTS
O Expresso da Manhã faz a pergunta: Guerra por um
balão? O aparelho, da meteorologia para Pequim e de espionagem para Washington,
foi só mais um episódio a lembrar que as relações entre as duas superpotências
são muito tensas. Raquel Vaz Pinto, doutorada
Luís Marques Mendes foi ao Jornal da Noite, como é hábito,
explicou como ficamos em relação ao altar-palco e avança a informação de que
vai haver uma redução significativa nos custos. A segunda estrutura, aquela que
irá ficar situada no Parque Eduardo VII, vai mesmo ter uma redução no valor
“para metade, em cerca de um milhão de euros”, explica o comentador. Oiça
Nuno Rogeiro fala sobre o estado da defesa nacional e da
ofensiva russa que está para vir. Nas novas remessas de armas
ocidentais que estão a chegar à Ucrânia, estão incluídas armas que vão
permitir atingir forças russas de 2º e 3º escalões, na retaguarda, dentro de
território ucraniano ocupado. “Isso é muito importante”, explica o comentador.
O QUE ANDO A LER
“Caravaggio: A Life Sacred and Profane”, de Andrew Graham-Dixon (Penguin)
O título diz praticamente tudo sobre a complexidade da personalidade de
Caravaggio, que foi pintor, amante de homens e de mulheres, espadachim,
Cavaleiro de Malta (por breves instantes), criminoso, assassino e fugitivo à
lei; que retratou as cenas bíblicas recorrendo a prostitutas e gente comum como
modelos para a sua arte realista; que trouxe a pobreza e a indigência para os
quadros, chocando e ao mesmo tempo surpreendendo a Igreja e os seus mecenas;
que revolucionou esta arte com o uso dos contrastes de luz - o chiaroscuro -,
transmitindo-nos a sensação de estarmos perante uma fotografia quando olhamos
para algumas das suas maiores obras.
Este livro, de Andrew Graham-Dixon, tenta colar os pontos dispersos da
vida de Caravaggio, do berço até à trágica e estúpida morte, ainda jovem,
analisando biógrafos antigos, detendo-se demoradamente na crítica aos seus
extraordinários quadros, quase todos eles com uma história de alguém na sua
conceção. “Carvaggio: A Life Sacred and Profane” é uma biografia, mas
também poderia ser um thriller ou um policial ou um manual de
História de Arte. E é francamente bom.
Por hoje é tudo,
Continue connosco.
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