João Pedro Barros, editor on-line | Expresso (curto)
Bom dia,
Já devem ser poucos os portugueses que não sentem um calafrio (e levam a mão à
carteira) cada vez que leem a palavra “TAP” numa notícia. Na perspetiva dos
média, as más notícias é que costumam ser as notícias boas, mas o rácio da TAP
entre estes dois polos será pouco menos do que desastroso: ainda há poucos dias
apresentou lucros (um ano antes do previsto no plano de reestruturação), a Moody’s até subiu o rating da empresa, mas só as
declarações de ontem da ainda administradora-executiva, Christine
Ourmiéres-Widener, no Parlamento, são suficientes para alimentar meses de
dúvidas, críticas e debates sobre a companhia aérea, com claras implicações
políticas.
Não era de esperar algo de muito diferente nesta comissão parlamentar de
inquérito (CPI), mas o grau de revelações da gestora demitida a 6 de março –
após a divulgação do relatório da Inspeção-Geral de Finanças (IGF) sobre a
saída de Alexandra Reis –, assim como algumas cartas na manga dos deputados
presentes, superaram as expectativas. Resumimos em pontos as quase sete
horas de audição, que terminou já depois da meia-noite, e durante a qual
Christine Ourmiéres-Widener mostrou evidente cansaço. Não é para menos, respire
fundo para conseguir ler tudo até ao fim:
a administradora ainda em funções na TAP pôs em causa o que dissera na mesma comissão o administrador financeiro Gonçalo Pires: que só tinha sabido da saída de Alexandra Reis de forma informal, poucos dias antes do anúncio;
o antigo secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Mendes, estava a par de todo o processo da saída de Alexandra Reis e ficou de informar o ministro Pedro Nuno Santos. O ministério terá mesmo considerado os valores iniciais “muito altos” e aprovado posteriormente os 500 mil euros acordados;
o Chega garantiu ter informações de que Ourmières-Widener defendeu a saída de Alexandra Reis devido à oposição que esta última fez à contratação da empresa em que trabalha o marido da francesa, com o fim de prestar serviços à companhia aérea. Algo negado categoricamente;
na véspera da apresentação do relatório da IGF e da sua demissão, a “CEO” foi convidada por Medina a fazê-lo de moto próprio. Soube pela televisão que tinha sido despedida por justa causa: “Foi o pior dia da minha vida (...) Estes dois ministros arruinaram a minha reputação. Tenho de limpar a minha honra. E fá-lo-ei”;
no próprio dia da demissão teve uma reunião com o ministro João Galamba. Ficou a saber que seria demitida, mas não por justa causa;
considera-se “um bode expiatório”, numa “batalha política” e nega as razões para a saída por justa causa: por isso, vai lutar pelos montantes a que teria direito pelos salários do seu mandato e considerou ter direito a um bónus pelo seu desempenho em 2022;
esteve reunida com membros do grupo parlamentar do PS e elementos do Governo um dia antes de ter ido ao Parlamento pela primeira vez, a 18 de janeiro (para falar sobre a indemnização paga a Alexandra Reis). O deputado socialista Carlos Pereira nega que tal corresponda a falta de ética;
Christine Ourmières-Widener foi confrontada com um pedido de alteração de um voo de Marcelo Rebelo de Sousa de Moçambique para Portugal e pediu opinião a Hugo Mendes, que lhe disse que deveria aceitar: [O Presidente da República] "É o nosso maior aliado, mas pode tornar-se no nosso maior pesadelo". Porém, o voo não seria alterado;
disse desconhecer os serviços de consultoria prestados por Fernando Pinto, antigo presidente da TAP, entre 2018 e 2020, e que lhe renderam 1,6 milhões de euros;
criticou os atuais titulares da tutela sobre a TAP, João Galamba e Fernando Medina, por a deixarem "sem orientações" acerca da gestão da empresa;
há uma consultora, a Evercore, a trabalhar há nove meses na recolha de informação para o Governo privatizar a TAP, mas está a fazê-lo sem qualquer contrato assinado.
Face a tudo isto, o PSD já pediu a Costa que avalie a continuidade de Medina e
Galamba no Governo e a IL pede mesmo a demissão do ministro das Infraestruturas,
por alegadamente ter promovido a referida reunião de Ourmières-Widener com
deputados do PS e elementos do Governo.
Como vai a TAP – ainda com mais o “casinho” da compra dos Airbus em cima – garantir a
paz social necessária para manter os lucros e avançar com uma privatização que
é agora desejada pelo Governo, pela maioria da oposição e mesmo pela maior parte do país? Hoje não será certamente um bom
dia para começar esse processo: Alexandra Reis, ela mesmo, será ouvida na
mesma comissão, a partir das 17h.
OUTRAS NOTÍCIAS
A tempestade perfeita de Trump
– O encobrimento de um relacionamento com a atriz de filmes pornográficos
Stormy Daniels permitiu a Trump mais munições para polarizar a política
norte-americana. Ontem, pela primeira vez na história, um ex-Presidente dos EUA
foi acusado de um crime – em rigor foram 34, todos negados pelo
putativo candidato presidencial em 2024. Em Nova Iorque, a mobilização de apoiantes terá ficado abaixo do desejado por
Trump e os detratores presentes também foram poucos. Já na Flórida, esta madrugada, o discurso teve pouco de novo: a
acusação foi feita com o objetivo de "interferir" nas eleições, a
família Biden é composta por “criminosos” e a sua administração está a destruir
o país, o procurador responsável pela acusação, Alvin Bragg, deve demitir-se. É
disto que o povo de Trump gosta.
IVA zero – A isenção no cabaz de bens essenciais vai vigorar a partir de 18 de abril e vai incluir
bebidas vegetais, mas não tofu, lentilhas e alimentação animal.
Crédito à habitação – Centeno está atento mas não alarmado: só “12,3% das famílias têm taxas de esforço superiores a 36%”.
Saúde – Há mais de 1,6 milhões de pessoas sem médico de família, dos quais
quase 1,1 milhões residem na região de Lisboa e Vale do Tejo, segundo os últimos dados do Portal da Transparência do Serviço Nacional de
Saúde, consultados pelo “Público”.
Ataque em Lisboa – PSP vai condecorar os dois primeiros polícias que responderam ao ataque
no Centro Ismaili.
Polémica em França – O que há de comum entre a entrevista da ministra Schiappa à ‘Playboy’, a de
Macron à ‘Pif’ e o vídeo de Sanna Marin a dançar?
Teoria da fronteira – A Finlândia já faz, oficialmente, parte da Aliança Atlântica e,
com isso, a fronteira da NATO com a Rússia aumenta para 2500 quilómetros. A propósito deste tema
pode ouvir os mais recentes episódios dos podcasts Expresso da Manhã e Bloco de Leste.
Estoril Open – João Sousa está apurado para a segunda ronda.
Depeche Mode – A crítica (positiva) ao novo álbum do agora duo, “Memento Mori”.
FRASES
Todos os clubes querem que as
coisas sejam esclarecidas. Em todos os aspetos: o contrato do ex-selecionador
em que a Federação não disse nada.
Rúben Amorim, treinador do Sporting, em conferência de imprensa de antevisão do GIl Vicente-Sporting de
hoje (20h15), para a Liga
Os homens podem ter uma diversidade de corpos, de cabelos, de narizes; um homem
gordinho é fofo, uma mulher gorda é desleixada; um homem com cabelo branco é
charmoso, uma mulher com cabelo branco é desleixada. Se os homens podem ser
belos de várias maneiras, porque é que as mulheres têm de ser belas de uma
única forma?
Henrique Raposo, na sua crónica de ontem no Expresso
O programa de fim de tarde com melhores audiências das últimas décadas, “O
Preço Certo”, é apresentado por um homem com excesso de peso. Não consta que
Alexandre Pais tenha escrito um texto a criticar Fernando Mendes por não
exortar os participantes do seu programa a trazerem-lhe saladas de pepino em
vez de alheiras.
Manuel Cardoso, humorista, na sua crónica de ontem no Expresso
PODCASTS A NÃO PERDER
Três novos livros para
compreender uma guerra que não parece ter fim. Cândida Pinto, Ana França e
Germano Almeida são jornalistas e lançaram, por estes dias, livros sobre a
guerra na Ucrânia. As duas primeiras basearam-se na experiência enquanto
enviadas da RTP e do Expresso para cobrir o conflito, o segundo destaca-se pelas
análises na SIC. Neste O Mundo a Seus Pés partilham com Pedro Cordeiro
pontos de vista e hipóteses de futuro.
A semana é santa mas o pecado mora aqui. Na semana da Páscoa há mudanças n'A Noite da Má Língua. Os
quatro intervenientes do podcast menos casto da internet decidiram mudar de
nome, em solidariedade com Stormy Daniels. Rita Blanco passa a ser Rita
Botafogo, Rui Zink será Stor Canhão, Júlia Pinheiro adotará o nome Julie
Seagull e Manuel Serrão vai ser conhecido por Mané Dragão. Uma santa páscoa sem
crueldade para coelhinhos e com a certeza da ressurreição.
“Sou uma mulher ‘queer’. Não me importa o genital da pessoa, nem o género com
que se identifica para me relacionar". Através dos seus desenhos e
escritos, a ilustradora e ativista Clara Não alerta as mulheres a
lutarem pelo descanso, relações amorosas e sexuais saudáveis, igualdade de
direitos e amor-próprio. E usa a arma do humor e ironia para desmontar
preconceitos, discriminações, machismos, racismos e outros ‘ismos’, muitas
vezes através de experiências pessoais que relata nas crónicas no Expresso ou
no Instagram. É a convidada de Bernardo Mendonça em A Beleza das
Pequenas Coisas.
O QUE EU ANDO A OUVIR
Lá para o final de 2001 (ou seria
já 2002?), lembro-me de ler no “NME” (então semanário, hoje apenas com edição online e com um perfil bem
diferente) que só havia duas bandas que valia a pena ouvir: White Stripes
e Strokes. E o então universitário atirou-se ao Audiogalaxy (hoje uma relíquia dos tempos
pós-Napster) e ficou rendido a “Is this it” e a “White Blood Cells” (e aos dois
muito bons e menos conhecidos álbuns anteriores do duo Jack e Meg White).
Após uma década de declínio do rock, o mundo parecia voltar a girar em torno do
eixo guitarra-bateria-baixo-voz e, uns meses depois, já “Last Nite” era
passagem obrigatória no Batô, a discoteca de Leça da Palmeira que é
alegadamente a mais velha do país e que nunca abandonou o género. Mas o álbum
que mais me marcou desse período só me chegou aos ouvidos, apropriadamente, no
outono de 2002: “Turn On the Bright Lights”, dos Interpol. Sim, não faltou
então quem me redirecionasse para a “fonte” (há algum texto sobre os Interpol
com mais de dois parágrafos em que não estejam também referidos os Joy
Division?), mas acho que é hoje possível afirmar que o disco resiste ao
teste do tempo e funciona ainda como uma polaróide de Nova Iorque no
pós-11 de Setembro.
Escrevo isto tudo a propósito do mais recente álbum dos Interpol, “The Other
Side of Make-Believe”, que já tem nove meses mas ao qual só recentemente dei
mais atenção. Em boa verdade, desde “Interpol” (2010) que não prestava grande
atenção aos discos do agora trio e não creio que este também vá ficar na
história. Mas tem uma música extraordinária: “Something Changed”. O melhor elogio é dizer que encaixaria
muito bem em “Turn On the Bright Lights”. Não há nada de mau numa bela
dose de música de conforto.
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