A Finlândia já tem luz verde para entrar na Aliança Atlântica, mas a Suécia ficou para trás à espera da decisão da Turquia e da Hungria. Em Estocolmo, a pacifista Gabriella Irsten critica não ter havido um verdadeiro debate na sociedade sobre a adesão, enquanto o curdo-sueco Kurdo Baksi lamenta as cedências feitas pelo governo para agradar a Erdogan.
Susana Salvador | Diário de Notícias
Numa montra há um simples cartaz branco com letras a preto onde se lê em inglês "A Paz é Possível". Noutra, há o símbolo da paz feito com ramos de árvores. Estamos no bairro de Kungsholmen, em Estocolmo, e atrás da porta de vidro encontra-se a sede da Sociedade Sueca de Paz e Arbitragem (Svenska Freds - och Skiljedomsföreningen ), que festejou na sexta-feira os seus 140 anos de vida. Diz ser a mais antiga organização pacifista do mundo e, após a Rússia invadir a Ucrânia, foi surpreendida pela decisão da Suécia de aderir à NATO e pôr fim a dois séculos de não-alinhamento. Mas o desejo sueco esbarrou nos interesses da Turquia, um dos dois países da Aliança Atlântica que ainda não deram luz verde à adesão (o outro é a Hungria). Um cenário que foi antecipado pelo curdo nascido na Turquia mas que vive desde a década de 1980 na Suécia, Kurdo Baksi, que só foi surpreendido pelas cedências que o governo sueco fez para agradar ao presidente Recep Erdogan.
A Sociedade Sueca de Paz e
Arbitragem nasceu em 1883, quando o reino da Noruega queria abandonar a união
com o reino da Suécia e havia quem defendesse pegar em armas para o travar -
tinha sido a guerra de 1814 entre os dois países, a última em que os suecos
participaram, a ditar essa união, que acabaria dissolvida pacificamente em
"A Suécia tem uma grande indústria de armas contra a qual a minha organização tem trabalhado. Em 2021, 46% das armas suecas foram vendidas a países não-democráticos. Queremos que pare de vender armas a estes países. Obviamente que isso não é neutralidade, é estratégia militar, com a Suécia a apoiar tanto o lado mau como o bom ao longo da história", contou.
O não-alinhamento sueco viu-se questionado quando a Rússia invadiu a Ucrânia, a 24 de fevereiro de 2022. "Eu própria fiquei assustada", admitiu Gabriella, criticando contudo que de repente, sem debate, o governo tenha mudado de ideias sobre aderir à NATO. "Muitos partidos defendiam há muito tempo a adesão. Mas os sociais-democratas, que estavam então no governo, sempre foram contra. Em novembro de 2021, Peter Hultqvist disse que enquanto ele fosse ministro da Defesa, o país nunca iria aderir à NATO. A 8 de março, a então primeira-ministra Magdalena Andersson, dizia que a NATO não era opção, que iria criar mais tensão e não era a resposta. E depois, a 16 de maio, o governo estava a entregar o pedido de adesão à NATO. Foram pouco mais de dois meses", resumiu.
O chefe da diplomacia sueca, Tobias Billstrom, defendeu que "a adesão à NATO é a melhor forma de salvaguardar a segurança da Suécia e contribuir em solidariedade para a segurança de toda a área euro-atlântica". Declarações durante o debate no Parlamento, no dia 22 de março último, quando a adesão foi aprovada pelos deputados - 269 votos a favor e 37 contra, com 43 deputados ausentes. Mas Gabriella não concorda: "A adesão à NATO não vai tornar a Suécia mais segura. A NATO está construída com base na dissuasão militar. A dissuasão é ameaçar o teu opositor com armas e poder, o que faz com que o teu opositor enverede pelo mesmo caminho. E então a situação transforma-se numa corrida às armas."