quinta-feira, 20 de março de 2025

Portugal - Impunidade: Mortes durante as greves no INEM. A culpa é do doente?

Carlos Ferro* | Diário de Notícias | opinião

Cento e trinta dias; quatro meses e meio. É este o tempo que passou desde o primeiro dia de greve dos técnicos de Emergência Pré-hospitalar, o segundo foi a 4 de novembro e coincidiu com uma paralisação da Administração Pública. Foram dias em que o serviço do Instituto de Nacional de Emergência Médica (INEM) sofreu bastantes constrangimentos, ao ponto de cerca de uma dezena de mortes estarem a ser investigadas por suspeita de falta de socorro.

Só o facto de existir a possibilidade de algumas pessoas terem morrido devido à ausência de ajuda ou encaminhamento para uma unidade hospitalar – apesar de estas também serem notícia pela falta de médicos e as horas que os doentes passam nas Urgências à espera de assistência – já merece uma reflexão por parte, pelo menos, das autoridades de saúde. Mas, grave, mesmo grave, é assistir-se, ao fim deste tempo todo, a um “assobiar para o ar” das entidades envolvidas sem que não exista uma explicação honesta para o facto de o INEM não ter previsto escalas de serviços mínimos que pudessem prevenir um socorro adequado para o período de greve.

Pelo que se conhece os sindicatos dizem que avisaram quem de direito – as entidades patronais e os organismos afetados –, os responsáveis do Ministério da Saúde parece que não sabiam da marcação das greves e a Secretaria Geral do ministério respondeu à Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (que a responsabilizou por o INEM não ter tido conhecimento “atempado” dos pré-avisos de greve, como DN noticiou esta terça-feira) que essa não é uma competência do serviço. Perante todos os argumentos conhecidos ficámos a saber: 1– que os responsáveis políticos e administrativos, neste caso do Ministério da Saúde, não ouvem nem leem notícias, pois dias antes já estas paralisações eram motivo de alertas em toda a comunicação social; 2 – os responsáveis do INEM também andaram alheados do que se passava no “seu” mundo.

Como passados todos estes dias ainda ninguém foi responsabilizado, ficam estas questões (com esperança de que um dia surja uma resposta: O que dizer às famílias das pessoas que morreram? Será que não haverá ninguém responsabilizado pela alegada falta de informação e tomada de decisões? Ou, à falta de um mordomo para culpar (ao nível da ficção policial), será que vão querer convencer-nos de que o erro de a informação não chegar oficialmente a quem de direito é de um estafeta ou de um funcionário com cargo menor?

* Editor executivo do Diário de Notícias

- Foto António Pedro Santos / LUSA

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