quarta-feira, 23 de abril de 2025

Angola | Rádio e Marítimo Levam a Taça -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda >

A velhice é uma chatice. Até doem os dentes que não temos. Pesam as pernas. Enjoam os petiscos. Um dedal de kapuka dá logo bebedeira. As mulheres passam fugazmente pelos olhos e segundo a minha mana Lu, elas já só olham para as orelhas e a careca dos homens. As mais exigentes balbuciam: Porcaria! A potência sexual espalha-se pelo corpo todo mas como os corpos velhos são campos de dor, só dá mesmo gemidos dolorosos. Uma novidade: Temos passado e memória. As memórias.

As instalações do Rádio Clube de Angola eram um luxo. Uma referência na Luanda do ano 40 e 50. As e os radialistas excelentes. Santos e Sousa era o mestre entre a suprema qualidade da Rádio Angolana, que até 1975 foi a melhor de Língua Portuguesa. Maria Cleofé, Maria Fernanda Moutinho, Cremilde de Figueiredo ou Ruth Soares eram as estrelas. Aos domingos, o poeta Álvaro Novais fazia um programa infantil que esmagou audiências. Ele era o “Caixa de Fósforos”, um negro de falas populares. 

A estação pública (Emissora Oficial) era uma secção dos Correios Telégrafos e Telefones (CTT). Habitava um barracão ao lado da estação dos Correios do bairro da Cuca. Tinha as grandes estrelas da Rádio, algumas cantoras, como Sara Chaves, Minah Jardim ou Concha de Mascarenhas. Nós éramos “assistentes literários” porque jornalistas eram os dos jornais. Artistas da Rádio eram radialistas. Quem escrevia u “cabeças” para os registos magnéticos e umas frases para as locutoras e locutores era “assistente”. 

Radialistas das Línguas Nacionais, antes da Independência. Tomem nota: Maria da Glória (kikongo), Lurdes Van-Dúnem e Jacinto Timóteo (kimbundu), Berta Maria e José da Silva (umbundu), Alexandrina Maria e Januário Vicente (ibinda),Emília Andriaça (nyaneka e kuanhama), Reis Esteves e Maria Cardoso (cokwe, luvale, luchaze e lunda-dembo).

Um dia do ano de 1967, a estação pública ganhou novas instalações, na Avenida Norton de Matos hoje Comandante Gika. Nessa altura eu andava pelos jornais cronicando e reportando. Entrei naquele templo pela mão do mestre Norberto de Castro, realizador, produtor e apresentador do programa Paralelo Nove. Um marco indelével na Rádio Angolana.

O edifício da Rádio Nacional de Angola (RNA) foi classificado como Património Cultural Nacional pelo seu “interesse histórico e arquitectónico”. Tenho imensa pena que o Ministério da Cultura e os Media tenham ignorado o arquitecto autor do projecto: Fernão Simões de Carvalho (Carvalhinho), um luandense ilustríssimo, antigo aluno do Liceu Salvador Correia. Licenciou-se na Escola Superior de Belas Artes em Lisboa. Trabalhou em Paris com Le Corbusier, como tinham feito antes o também angolano Vasco Vieira da Costa e o meu saudoso amigo Nadir Afonso. Entrevistei os três. 

A entrevista a Nadir Afonso foi por mérito próprio. Ao arquitecto Carvalhinho, autor do projecto das instalações da Rádio Nacional de Angola, e Vasco Vieira da Costa foi por estímulo de José Troufa Real, outro arquitecto luandense de categoria mundial. 

Vaco Vieira da Costa é autor do projecto do demolido Mercado do Kinaxixi. Mas também do Laboratório de Engenharia de Angola, a sede da Associação dos Naturais de Angola (ANANGOLA), ou o edifício da Mutamba, que alberga o Ministério das Obras Públicas, um exemplo de construção em meio tropical.  

Classificar como Património Cultural Nacional o edifício da RNA e ignorar o autor do projecto, arquitecto luandense Fernão Simões de Carvalho (Carvalhinho), é como renegar pai e mãe. Muito comum na era João Lourenço e seus ajudantes.

O Clube Marítimo da Ilha do Cabo é a partir de agora Património Cultural. Apoiado. Incluam também o Braguês, o Salão dos Anjos, o Ginásio de São Paulo, o Quintalão do Elias dia Kimuezo e o Bar do Russo. Também podem incluir a Esplanada do Majestic que eu aplaudo.

Neves Guenge é linguista e escreveu um texto no Jornal de Angola onde mostra a sua sabedoria na Língua Portuguesa. Chamou ao Campeonato Africano das Nações (CAN), Copa Africana das Nações. E a partir daí deu uma lição magistral sobre o masculino e feminino. Vai dar tese de doutoramento. A ociosidade é mãe de todos os vícios. Quem não tem nada a dizer, fica calado. Se não sabe o que escrever, coça a cabeça. 

Os brasileiros chamam ao Campeonato do Mundo de Futebol, a “Copa do Mundo” porque como todos os colonizados adoram imitar os colonialistas. Os franceses chamam “Coupe” ao Mundial de Futebol. E por arrasto chamaram “Coupe” ao primeiro Campeonato Africano das Nações que decorreu no Sudão, em 1957: La Coupe d'Afrique des Nations (CAN). Outros chamam-lhe Taça Africana das Nações e em Língua Portuguesa é Campeonato Africano das Nações. Os franceses continuam a chamar-lhe “Coupe” com este argumento: Na competição, cada jogo é uma final! 

Ao linguista Neves Guenge quero informar que os francesismos (galicismos, de Gália) atentam contra a pureza da Língua Portuguesa. O melhor é chamar ao campeonato, Nganza Africana das Nações (NAN) ou Mbungu Africano das Nações (MAN). Tanto faz É sempre para beber.

A sétima comissão da Assembleia Nacional, que trata de Assuntos Religiosos, Comunicação Social, Juventude e Desportos, é presidida pelo deputado da UNITA Conceição Paulo. Ao estilo habitual do Galo Negro, pôs a circular nas redes sociais que os trabalhos da comissão estão a ser boicotados. A Presidente da Assembleia Nacional, Carolina Cerqueira, foi forçada a desmentir o senhor deputado. Não há boicote nenhum. Apenas um programa do Parlamento que obriga a adiar algumas iniciativas das comissões. A atitude de Conceição Paulo é “Desnecessário e lamentável”. Uma redundância! As redundâncias atentam contra a pureza da Língua Portuguesa. Lamentável e desnecessária é a UNITA. 

Hoje morreu o escritor Mário Vargas Llosa que um dia em Paris me ofereceu o seu livro “Conversa na Catedral”. Era então um apoiante da Revolução Cubana e de todas as revoluções. Depois foi deslizando e para lhe darem o prémio Nobel da Literatura acampou na extrema-direita, onde se fixou até morrer. João Lourenço não escreve, não lê e habita confortavelmente na extrema-direita. Que lhe faça bom proveito e tenha uma reforma feliz. Se puder abdicar já, o MPLA agradece.

* Jornalista

Sem comentários:

Mais lidas da semana