Rosa Pedroso Lima e João Silvestre (texto) e Nuno Botelho (fotos) em Expresso
Em entrevista ao Expresso, o secretário de Estado de Administração Pública admite que a redução de pessoal é um imperativo e que os cortes podem ir ainda mais longe: despedimentos ou o pagamento de 12 salários anuais não estão afastados.
A edição do Expresso deste sábado, 29 de outubro, inclui um dossiê especial sobre as mudanças a efetuar na Administração Pública. Para além da redução salarial -que pode atingir, em dois anos, 40% dos atuais rendimentos dos trabalhadores do Estado - o Governo vai reduzir em 2% ao ano o número de funcionários públicos.
A edição do Expresso deste sábado, 29 de outubro, inclui um dossiê especial sobre as mudanças a efetuar na Administração Pública. Para além da redução salarial -que pode atingir, em dois anos, 40% dos atuais rendimentos dos trabalhadores do Estado - o Governo vai reduzir em 2% ao ano o número de funcionários públicos.
A redução de pessoal pode ser atingida com a simples passagem à aposentação dos trabalhadores, mas, admite o Governo, "não poderão à partida ser excluídas quaisquer possibilidades ou medidas que possam vir a concretizar esse ajustamento".
Entrevistado pelo Expresso, Hélder Rosalino, secretário de Estado da Administração Pública, fala assim na possibilidade de o Estado poder despedir trabalhadores, assim como na hipótese - para depois de 2013 - de se integrarem nos 12 salários anuais os montantes equivalentes aos subsídios de férias e de Natal pagos à Função Pública. A redução salarial prevista no próximo Orçamento do Estado é "um imperativo" e uma necessidade de "ganhar tempo", até o Governo concluir uma profunda reforma da Administração do Estado.
A meta de redução de funcionários do Estado poder ser atingida através dos mecanismos da mobilidade geral e especial, ou pode o Governo ter de recorrer a despedimentos? Já admitiu essa possibilidade em entrevista recente...
No que respeita à redução do número de funcionários, a Lei do Orçamento reforçará muito significativamente o mecanismo de controlo das entradas de novos efetivos, admitindo-se que com as naturais passagens à situação de aposentação dos trabalhadores em funções públicas a meta de redução de 2%, prevista para 2012, seja atingida ou mesmo ultrapassada. Estamos num contexto de emergência nacional em que se impõem ajustamentos muito significativos para conter o défice orçamental no limite quantitativo que consta no Programa de Assistência Económica de que Portugal está a beneficiar. É nesse contexto que terá que ser encarada a série de medidas, muito restritivas é certo, que estão previstas no Orçamento para 2012 em matéria de Administração Pública, em que a redução das despesas com pessoal é uma das condições da necessidade imperativa de ajustar o peso do Estado às capacidades financeiras do país. A redução da despesa com pessoal em 2012 será conseguida fundamentalmente pela via da redução salarial já anunciada, mas esse não poderá ser o nosso objetivo final permanente. Temos que criar condições para reverter a médio prazo essas medidas, o que exigirá um esforço de ajustamento muito grande das Administrações Públicas, a concretizar em poucos anos. O Governo dará prioridade ao desenvolvimento de uma estratégia de médio prazo que venha a permitir que o ajustamento dos efetivos da Administração Pública se possa fazer de forma programada e sustentada nos próximos dois ou três anos, quer pela via da gestão criteriosa das entradas e saídas de efetivos, quer pela utilização de outros instrumentos de gestão de recursos humanos que terão que ser desenhados e implementados num futuro próximo. Neste capítulo não poderão, à partida, ser excluídas quaisquer possibilidades ou medidas que possam vir a concretizar esse ajustamento.
Qual o número "ideal" de funcionários da Administração Pública necessários para que o Estado continue a poder cumprir as suas funções?
Mais do que pensar sobre o número ideal de funcionários da Administração Pública, importa sublinhar que a principal intenção e ação do Governo passa por reorganizar o Estado, quer ao nível das suas estruturas orgânicas, quer ao nível dos seus modelos de governação. Nestas áreas, penso que o Governo tem vindo a fazer um trabalho cujos resultados são já muito visíveis e impressivos, e que vão desde o PREMAC, que permitiu uma redução muito significativa de estruturas e de cargos dirigentes, passando pela revisão do Estatuto do Pessoal Dirigente e pela revisão que irá ocorrer nos próximos dias do Estatuto do Gestor Público e da Lei-Quadro dos Institutos Públicos, diplomas que se encontram já em fase de aprovação pelo Conselho de Ministros. Nesta matéria haverá importantes alterações. Estamos a promover uma transformação muito importante no modelo de funcionamento e de governação do Estado, num contexto muito difícil, mas em que a mudança é a única solução. Porém e não fugindo à questão, é minha convicção de que terá que ocorrer uma redução com significativa no número de efetivos da Administração Pública nos próximos anos, de modo a que seja possível acomodar uma redução sustentada dos custos com pessoal do Estado, que não seja exclusivamente baseada na variável preço (salários).Temos, por outro lado, que olhar para a estrutura de efetivos da Administração Pública e para as políticas salariais vigentes, no sentido de as compatibilizar devidamente. Temos, porventura, que melhorar a competitividade do Estado relativamente a alguns grupos profissionais e ajustar para os níveis de mercado a remuneração de outros grupos profissionais, relativamente aos quais a Administração pagará acima do que é a prática no privado. Essa análise tem que ser feita e, como disse, estamos a preparar uma estratégia de médio prazo que promova a requalificação da Administração e, simultaneamente, a redução do seu peso nos encargos gerais do Estado.
O Governo - e o seu Ministério em especial - continua preocupado com os eventuais "tumultos" e o acréscimo da tensão social, agora que estão anunciadas as primeiras manifestações e greves?
Tem havido uma preocupação grande de elucidar a população para o facto de a proposta de orçamento para 2012 ter subjacente a necessidade de evitar o colapso financeiro do país. Nesta matéria, o comprometimento de todos em matéria de coesão social é fundamental. Entendo que a redução do peso do Estado na Economia tem que ser efetuada de forma cautelosa e faseada. Foi a situação de emergência nacional que obrigou a cortes transversais duros, mas absolutamente necessários. Porém, a tónica deve ser dada ao facto de estes cortes permitirem ganhar algum tempo para que se possa definir e cumprir os ajustamentos necessários, no sentido de diminuir eficientemente o peso do Estado e a relançar a economia portuguesa. Penso que os portugueses têm a real perceção da situação de emergência nacional em que o país se encontra e que percebem que este Governo está a trabalhar no sentido de garantir o futuro das gerações futuras. Há a perceção de que é preciso passar por um processo de ajustamento muito difícil para garantir a sustentabilidade futura do país. O diálogo com os sindicatos tem sido muito franco nesta matéria. Este governo e eu próprio damos muita importância ao diálogo social, o qual é absolutamente indispensável no momento em que vivemos.
Admite a necessidade de adoção de mais cortes na Administração Pública para além de 2013? Ou mesmo a entrada em vigor de novas medidas, como, por exemplo, a integração dos subsídios de férias e de Natal nos vencimentos dos trabalhadores do Estado?
Retomo o raciocínio da resposta anterior. Os cortes salariais na função pública previstos no Orçamento de 2012 devem ser compreendidos pelos próprios funcionários (e pela sociedade em geral) como uma forma de ganhar tempo enquanto se põe o Estado a gastar menos. Tenho consciência que há muito por fazer, mas é importante ter presente que reformas demoram algum tempo. A redução do peso do Estado na economia tem que ser feita de forma cautelosa e faseada. A suspensão progressiva dos subsídios de natal e de férias, no contexto de emergência nacional, teve três grandes ordens de razão para incidir sobre os funcionários públicos: A primeira - incontornável - é que a redução de salários da função pública concorre para a consolidação do défice do Estado, na medida em que representa redução da despesa do Estado. A segunda, teve que ver com os incentivos relacionados com a proteção do emprego que existem para a maioria dos funcionários públicos e que não existe para o sector privado, o que tem como corolário, o facto de os trabalhadores do privado poderem perder a totalidade da remuneração em casos de redução dos postos de trabalho ou de encerramento de empresas. A terceira razão baseia-se na disfunção salarial conhecida entre a média dos salários na função pública e a média dos salários no sector privado. De facto, existem estudos que demonstram que o prémio é mais elevado no sector público do que no privado, embora isso não se verifique para todos os grupos profissionais do Estado, sobretudo para os mais qualificados. O estado actual da Administração Pública, e o seu peso incomportável que tem na despesa pública, teve o seu epílogo num corte salarial transversal que não distingue qualitativamente os trabalhadores. Foi uma decisão tomada num contexto de emergência nacional, em que o fator tempo não permitiu que outras variantes desta solução pudessem ser equacionadas. A integração dos subsídios de férias e de Natal nos vencimentos dos trabalhadores do Estado não é uma questão que se coloque no contexto atual, até porque esses subsídios estarão suspensos em 2012 e 2013, mas naturalmente não poderá ser afastada no futuro a discussão em torno desse tópico no quadro de reforma global da Administração Pública, no sentido em teremos que promover, de forma sustentada, o ajustamento do peso financeiro do Estado às reais condições financeiras do país. Neste contexto, todas as soluções terão que ser colocadas em cima da mesa. Mas, como disse, essa questão não está em discussão no momento atual.
O modelo de austeridade agora seguido para os funcionários públicos é extensível aos trabalhadores da Administração local, Governos Regionais e organismos e empresas do Estado? Prevê aqui que volume de redução no número de trabalhadores (incluindo rescisões, passagem a quadro de excedentários ou despedimentos?
O modelo de redução da despesa pública por via da redução remuneratória e da suspensão do pagamento de subsídios de férias e de Natal, para exemplificar duas das mais relevantes medidas, aplicam-se a todos os trabalhadores da administração direta e indireta do Estado, Regiões Autónomas e Autarquias Locais. Relativamente ao assunto da redução do número de trabalhadores importa sublinhar que o meio preferencial para atingir os objetivos de decréscimo de pessoal na Administração Central, Regional e Local, fixado para 2012 no valor mínimo de 2%, resulta da conjugação do reforço das restrições colocadas sobre a admissão de pessoal e das saídas de trabalhadores em funções públicas por motivos de aposentação ou reforma. A adoção de outro tipo de medidas em 2012 para alcançar os objetivos de decréscimo acima assinalados, como sejam as rescisões por mútuo acordo, despedimentos e outros mecanismos, não se encontram contempladas no Orçamento.
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