segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Moçambique: Brasileira Vale passou de "bestial a besta" em menos de um ano



LAS – Lusa, com foto

Maputo, 30 jan (Lusa) - A brasileira Vale, que opera em Moçambique uma das maiores minas de carvão do mundo, tem sido alvo nos últimos dias de grandes críticas, menos de um ano após ter iniciado, com pompa e circunstância, a extração do minério.

Na última semana, duas prestigiadas organizações não governamentais moçambicanas, Liga dos Direitos Humanos e Justiça Ambiental, regozijaram-se com a atribuição do duvidoso prémio de pior multinacional do mundo ao gigante brasileiro.

"Este 'prémio' (...) corrobora as diversas violações perpetradas pela empresa em Moçambique, contra as comunidades e contra os trabalhadores", acusou Jeremias Vunjhane, ativista da Justiça Ambiental.

Este fim de semana, no semanário pró-governamental Domingo, Sérgio Vieira, um histórico dirigente da FRELIMO, no poder desde a independência, em 1975, prosseguia o tom das acusações à Vale.

"Há iniquidade quando uma transnacional que vai ganhar biliões de dólares no negócio apenas se contenta em dar uma casa a quem já a possuía, uma machamba nova e um terreno pouco fértil para quem cultivava boa terra, um curral, uma escola e um posto de saúde a quem isso não faltava", denunciou Vieira, membro do comité central da FRELIMO.

Em maio de 2011, quando foi inaugurada a mina de Moatize, de onde esperava extrair nesse ano um milhão e meio de toneladas de carvão, o então presidente da Vale, Roger Agnelli, falando perante o chefe de Estado moçambicano e dezenas de convidados oficiais, incluindo de países vizinhos, chamou ao palco um dos seus funcionários para lhe agradecer o trabalho feito com as famílias realojadas.

Agnelli, que, segundo anunciou, continua consultor do Governo moçambicano, projetou "slides" com imagens de pessoas felizes nas suas novas casas, depois de terem sido deslocadas de Moatize por causa da mina.

Na altura ninguém contestou essa visão, mas seis meses depois, 750 famílias transferidas para Cateme, a mais 50 quilómetros das suas terras, revoltaram-se, cortaram a estrada e a linha férrea e foram espancadas pela polícia, segundo relatos de jornalistas locais.

No inquérito que se seguiu, o governador de Tete reconheceu que 400 das 750 casas foram mal construídas e a própria Vale prometeu corrigir esses defeitos.

Num comunicado enviado à Lusa, a mineira garante que no deslocamento de 1.108 famílias nas comunidades de Chipanga, Malabwe e Begamoio, "orientado por diretrizes do Banco Mundial", houve "expressiva participação das partes interessadas e consulta às comunidades e pessoas afetadas, incluindo-as nos processos de tomada de decisão".

Estas críticas surgem quando a empresa se debate com dificuldades em escoar a imensa extração de carvão em Moatize - a prometida, pelo Governo, reabilitação da linha do Sena, a natural ligação ao Índico pelo porto da Beira, é uma miragem e não permite o movimento de comboios exigido.

Em alternativa, a Vale negociou com o Malauí a construção de uma linha férrea para levar o mineral até ao mais distante porto de Nacala a norte.

Avaliada em 1,5 mil milhões de euros, a ferrovia terá um comprimento de 900 quilómetros e, depois de passar pelo Maláui, utilizará a já existente infraestrutura ferroviária moçambicana para Nacala, mas só estará pronta daqui a uns anos.

Na mesma situação estão as restantes 35 empresas mineiras que operam em Moatize mas a Vale é de longe a maior, a que já iniciou a produção e a que mais tem investido em Moçambique - cerca de 3,8 mil milhões de euros.


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