Diversas teorias têm procurado explicar, há trinta anos, a emergência dos “outsiders” orientais. Suas conclusões costumam ser surpreendentes
“The issue is not one of state intervention in the economy.
All states intervene in their economies for various reasons…
State’s first priority will define its essence.”
All states intervene in their economies for various reasons…
State’s first priority will define its essence.”
Chalmers Johnson, MITI and the Japanese miracle, 1925-1975
Stanford University Press, 1982
Stanford University Press, 1982
José Luís Fiori – Outras Palavras
Salvo engano, foi Chalmers Johnson quem falou pela primeira vez do “desenvolvimentismo” asiático, no seu célebre livro sobre o “milagre econômico japonês”, publicado em 1982. Depois dele, transformou-se num lugar comum dizer que o “estado desenvolvimentista” foi ator central do crescimento econômico acelerado da Coréia, Taiwan e Singapura, entre os anos 1960 e 80; da China, a partir dos anos 1990 (na foto, Shangai); e do Vietnã, no início do século XXI. O próprio Johnson – que era economista, serviu na Guerra da Coreia, foi consultor da CIA para a Ásia, e lecionou nos Centros de Estudos do Japão e da China, da Universidade da Califórnia – voltou muitas vezes ao tema e acabou transformando-se num dos grandes especialistas norte-americanos em economia política asiática. Foi um dos principais responsáveis pela difusão e aprofundamento acadêmico da pesquisa e do debate que ganhou ressonância internacional, com a publicação, pelo Banco Mundial, do The East Asian Miracle: Economic Growth and Public Policy [“O milagre da Ásia de Leste: Crescimento Econômico e Política Pública”], em 1993.
No seu tempo, o livro de Johnson surpreendeu o mundo acadêmico: segundo o autor, o “modelo econômico” japonês do pós-guerra não era original e vinha dos anos 1920; e sua característica fundamental não era econômica, tinha a ver com a “intensidade” com que a sociedade e o governo japonês se dedicavam ao estabelecimento e cumprimento dos seus objetivos estratégicos. Para Johnson esta “intensidade” se devia ao fato de que o “modelo” tinha sido concebido como um instrumento de guerra e de reconstrução, depois da guerra, e como instrumento de defesa da soberania japonesa, frente aos desafios do mundo e do contexto geopolítico asiático, na segunda metade do século XX.
Este contexto explicaria o nascimento e a força da ideologia nacionalista e das instituições japonesas responsáveis pela mobilização da sociedade e pela submissão do desenvolvimento econômico aos seus objetivos de longo prazo. Em 1989, a economista americana Alice Amsden publicou outra obra clássica – Asia’s Next Giant [“O próximo gigante asiático”] sobre o “milagre econômico coreano”. Ela identificava características parecidas com o desenvolvimento japonês: o “modelo coreano” também vinha de antes da II Guerra e havia sido forjado na luta anti-colonialista, contra o próprio Japão. E depois de Johnson e Amsden, muitos outros pesquisadores e especialistas encontraram as mesmas características no desenvolvimento acelerado de Taiwan e Singapura e, de forma ainda mais gritante, no desenvolvimento da China e do Vietnã. O próprio Johnson identificou no nacionalismo camponês e revolucionário chinês, do início do século XX, a grande fonte originária da “energia desenvolvimentista” da China contemporânea.
Apressando o argumento, é possível extrair pelos menos quatro conclusões desta vasta literatura sobre o crescimento asiático:
i) a maioria dos estados nacionais asiáticos se constituiu na segunda metade do século XX, depois do fim do colonialismo europeu. Mas quase todos os novos estados mantiveram suas fronteiras tradicionais e civilizatórias, e sua relação milenar, dando origem, desde o início, a um sistema inter-estatal regional altamente competitivo.
ii) em clave europeia, a estratégia econômica destes países asiáticos esteve sempre mais próxima do mercantilismo de William Petty do que da economia política de Smith ou Marx; e muito mais próxima do nacionalismo econômico do alemão Friederich List, do que do liberalismo heterodoxo do inglês John Keynes. Sua primeira prioridade foi sempre a construção do estado e a defesa da unidade territorial da sua sociedade e da sua civilização.
iii) não há nenhuma instituição ou política que explique isoladamente o sucesso do crescimento asiático, e que possa ser transplantada para países que tenham se constituído ou estejam fora de sistemas de poder altamente competitivos. A simples condição de latecomer ou de “capitalismo tardio” não explica nada, nem é capaz de gerar um projeto e uma estratégia de alto crescimento.
vi) por fim, os asiáticos nunca se referiram a si mesmos como “desenvolvimentistas”, e sua estratégia econômica não tem nada a ver com o chamado “desenvolvimentismo latino-americano”. Sua política industrial, comercial e macro-econômica sempre esteve a serviço de sua “grande estratégia” social e nacional, e da sua luta pela conquista ou reconquista de uma posição internacional autônoma e preeminente. Os asiáticos têm plena consciência de que a política econômica entregue a si mesma é cega e incapaz de gerar seus próprios objetivos. E muito menos ainda, de definir os objetivos de uma sociedade e de uma nação.
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